Timor-Leste | Revolução de Abril deixou “memórias difíceis”

Marisa Ramos Gonçalves, investigadora da Universidade de Coimbra, aborda, em estudo, as vivências e experiências dos timorenses no período do 25 de Abril

A investigadora do Centro de Ciências Sociais da Universidade de Coimbra Marisa Ramos Gonçalves considerou que a revolução de Abril em Timor-Leste deixou “memórias difíceis “e que a reconciliação é fundamental para a “coesão nacional”.

“Quando falamos do 25 de Abril em Timor sabemos que estamos a falar sobre memórias difíceis que deixaram marcas até hoje devido ao conflito interno e da violação dos direitos humanos durante a ocupação”, afirmou à Lusa Marisa Ramos Gonçalves, que se encontra actualmente a fazer um estudo sobre aquele período no país.

Marisa Ramos Gonçalves é também membro do Conselho Consultivo Internacional do Centro Nacional Chega (em Timor-Leste), que, entre outras actividades, documenta a história do conflito de Timor-Leste entre 1974 e 1999.

A investigadora explicou à Lusa que o objectivo é perceber o outro lado da história a “partir das experiências e vivências dos timorenses do 25 de Abril e deste período de transição, que dá origem a uma proclamação da independência, mas que é muito curta relativamente à ocupação”.

“Esta memória colectiva dos timorenses é indissociável, quer do conflito interno, quer da tragédia humana que é a invasão e ocupação indonésia”, salientou Marisa Ramos Gonçalves.

A proclamação unilateral da independência de Timor-Leste, em 28 de novembro de 1975, aconteceu após um período marcado por confrontos entre os timorenses e já sob a sombra da possibilidade da ocupação do território pela Indonésia, o que se concretizou em 7 de Dezembro de 1975. Questionada sobre a reconciliação entre timorenses, a investigadora disse que o “assunto tem estado em cima da mesa”.

“É preciso fazer a reconciliação entre timorenses que estiveram em lados opostos durante o conflito civil com opções diferentes para o futuro de Timor. Na altura, a UDT queria uma associação a Portugal durante mais alguns anos antes da independência, a Fretilin queria uma independência imediata, e a Apodeti, que queria uma integração na indonésia e todos são timorenses”, afirmou.

Segundo Marisa Gonçalves, o Centro Nacional Chega quer que “isso comece a estar em cima da mesa, porque não foi fácil até agora para os timorenses que sofreram torturas ou que foram perseguidos durante o período do conflito interno falar abertamente”.

“Mas já se começa a ver essa possibilidade a falar da violência e da tortura, que existiu num período muito curto em 1975, mas que deixou marcas fortes. Existe também uma reconciliação ao nível da liderança política que está por fazer e penso que essa também é complicada. É uma reconciliação de toda a sociedade”, afirmou Marisa Ramos Gonçalves.

Maior abertura

Considerando a reconciliação entre timorenses como fundamental para a coesão social, a investigadora destaca, por outro lado, que as novas gerações formadas no período indonésio e as mais jovens “estão completamente preparadas para essa reconciliação”.

“Não estão tão presas a conflitos anteriores e eles querem mesmo reconciliar-se e, portanto, acho que já estão a olhar para esse futuro, já pensam que todas as pessoas fazem parte da Nação timorense, inclusivamente os timorenses que estão em Timor Ocidental”, onde há uma comunidade de cerca de 80.000 pessoas, salientou.

“É importante também que a geração mais velha se reconcilie, até porque continua a ser uma geração, a chamada geração de 75, que continua no poder. Seria também interessante que eles tomassem a iniciativa de se aproximar”, acrescentou.

Sobre o estudo que está a realizar, Marisa Ramos Gonçalves disse que há falta de investigação histórica em Timor-Leste e que é bom perceber as expectativas que as pessoas tinham não só em relação ao 25 de Abril, mas como também em relação à transição política.

“É conhecer as narrativas, as experiências, as memórias dos timorenses de várias origens geográficas, ocupações profissionais e filiações partidárias sobre o mesmo momento histórico”, explicou, salientando que a reconciliação também se faz via escrita da história.

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