COP30 – Um desafio para o Brasil

As duas últimas Conferências das Partes (COP) da ConvençãoQuadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas decorreram em 2023 e 2024, respetivamente nos Emirados Árabes Unidos (COP28) e Azerbaijão (COP29) que, como países produtores de petróleo, não devem estar muito interessados na transição energética.

Agora cabe ao Brasil organizar a CPO30, de 10 a 25 de novembro de 2025, em Belém, no Pará. Não é a primeira vez que este país esteve predisposto para organizar uma conferência deste tipo. Já tinha sido convidado, e aceitado o convite, para organizar a COP25. No entanto, o governo chefiado por Bolsonaro, negacionista convicto tal como o seu mentor norte-americano Donald Trump, “roeu a corda”, deu o dito por não dito, alegando que a problemática das alterações climáticas não passaria de um jogo comercial.

O Chile ficou então incumbido de ser o novo anfitrião, mas os grandes distúrbios que ocorreram neste país antes das datas previstas, fez com a realização da conferência passasse para Madrid, entre 2 e 13 de dezembro de 2019. Foi uma oportunidade que se perdeu para projetar o Brasil como um dos países líderes da luta contra as alterações climáticas.

Acontece que o Brasil está entre os dez maiores produtores de petróleo bruto e há quem duvide que o governo brasileiro esteja grandemente interessado na transição energética. Sem dúvida que os governos de Lula da Silva têm tido em consideração, dentro de certa medida, a preservação da Amazónia e o bem-estar das populações indígenas, e têm sido comedidos na exploração petrolífera em zonas que as possam afetar. Porém, o grande valor comercial do petróleo faz com que frequentemente se subalternize o facto de estar provado que os combustíveis fósseis sejam o principal fator do aumento da concentração de gases de efeito de estufa na atmosfera e, consequentemente, do aquecimento global. Houve mesmo alguém1 no Brasil que chegou a afirmar que a exploração do petróleo contribuiria para custear a transição energética.

Não há dúvida de que a realização da COP30 em Belém irá contribuir para que o Brasil tenha um papel cada vez mais importante no contexto da problemática inerente às alterações climáticas. Vai ser necessária, no entanto, muita habilidade por parte do governo brasileiro para convencer a comunidade internacional sobre as suas intenções perante o compromisso assumido aquando da assinatura do Acordo de Paris, em que ficou expressa a necessidade de limitar o aquecimento global, até ao fim do século XXI, no máximo a 2 °C, de preferência a valores inferiores a 1,5 °C. Neste contexto, a política oficial brasileira parece não ser muito coerente, tanto mais que já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado o famigerado Projeto-Lei N.º 2159, de 2021, apelidado “PL da devastação”, porque abre o caminho a empreendimentos potencialmente gravosos para o ambiente, como a muito discutida exploração petrolífera “offshore” próximo da foz do rio Amazonas. Este projeto, também designado por “Margem Equatorial”, poderá, perante o risco de derrame de petróleo, afetar as comunidades indígenas e a biodiversidade nas vizinhanças da zona de exploração. Em caso de tal acontecer, não seria a primeira vez no Brasil, atendendo a que, em 2001, uma plataforma operada pela Petrobras sofreu várias explosões, o que provocou o seu afundamento com cerca de 1.500 toneladas de petróleo bruto e a morte de 11 pessoas.

Incidentes deste tipo nas instalações oceânicas onde se procede à perfuração não são raros. Como exemplos pode-se mencionar os derrames recorrentes na década de noventa do século passado, no Mar do Norte, em plataformas operadas pela Shell, com graves consequências para o ambiente marítimo. Mais recentemente ocorreu um derrame no Golfo do México, em 2010, em que a avaria de uma válvula de segurança numa plataforma da BP provocou uma explosão que causou a morte de 8 trabalhadores e um derrame de cerca de 780 milhões de litros de petróleo, causando danos irreparáveis na fauna marítima. Incidentes deste tipo podem também afetar ecossistemas de que os mangais fazem parte, provocando danos nas zonas de transição entre a costa e o mar, o que tem como consequência a destruição de ecossistemas e o aumento da erosão provocada pelas ondas associadas, ou não, a marés de tempestade.

Ciente destes potenciais inconvenientes, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), tem negado por várias vezes licenças para a exploração petrolífera nas vizinhanças da foz do rio Amazonas. De acordo com o “PL da Devastação”, poderão ocorrer “Licenças Ambientais Especiais” para projetos considerados estratégicos, os quais, após submissão à entidade responsável pelo licenciamento e na ausência de resposta no prazo de um ano, passariam automaticamente a ser licenciados. Considerando que o Ibama é caracterizado por escassez de pessoal, haverá o risco de projetos submetidos serem aprovados, passado esse prazo.

Atendendo a que o Presidente pode vetar total ou parcialmente o projeto-lei, no prazo de 15 dias após a sua submissão pelo Congresso2, cabe agora a Lula da Silva tomar essa atitude. Tem apenas alguns dias para o fazer, pois o prazo, em princípio, terminará em 8 de agosto.

Durante todo este processo, o Presidente Lula da Silva, ao contrário da ministra do “Meio Ambiente e Mudança do Clima”, Marina Silva, tem mostrado uma certa passividade, o que provoca algum receio sobre a sua atitude no que se refere à promulgação do decreto. Segundo os meios mais progressistas do Brasil, Lula da Silva não se deveria ter mantido em silêncio após a aprovação pelo Congresso, mas manter-se firme vetando o projeto “PL da Devastação” e outros projetos potencialmente desastrosos e atentatórias das florestas e populações. No caso de haver veto, este necessita de ser explicado invocando razões jurídicas ou políticas, como, por exemplo, a sua inconstitucionalidade ou a não conveniência ou oportunidade.

Entretanto está a decorrer uma campanha internacional da Avaaz “Brazil: Stop the Devastation Bill”, já com cerca de um milhão de apoiantes.

Mas nem tudo está nas mãos de Lula, na medida em que, em caso de veto, o projeto-lei volta ao Congresso, que poderá impor a promulgação da respetiva lei, no caso do veto ser derrubado por maioria absoluta dos votos dos deputados e dos senadores. A última palavra é, portanto, do Congresso. Entretanto há uma grande expetativa de qual será a atitude de Lula da Silva.

Trata-se de um desafio tremendo sobre o equilíbrio entre a proteção ambiental e o desenvolvimento económico.

(Meteorologista)

Referências:

Jean Paul Prates – presidente da Petrobras de 26 de janeiro de 2023 a 14 de maio de 2024

Congresso Nacional – órgão máximo do poder legislativo, composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.

Avaaz – movimento à escala global que procura dar voz à sociedade civil nas áreas da democracia, direitos humanos e sustentabilidade da Terra.

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