Ensinar Amor nas Universidades Chinesas?

Enquanto a China enfrenta uma queda acentuada nas taxas de natalidade e a redução da sua população pela primeira vez em décadas, uma proposta inusitada ganhou destaque pelo mundo inteiro estes dias: aulas de amor nas universidades. O objetivo destas aulas seria incentivar os jovens a desenvolverem relações românticas que, no futuro, pudessem resultar na formação de famílias.

As aulas incluiriam temas como expressar emoções, manter relações saudáveis e lidar com separações, numa tentativa de normalizar a ideia de namoro. Através de análise de casos, discussão em grupo sobre como manter relações íntimas e comunicação entre os sexos, o curso seria uma forma de reverter uma tendência que China Population News revelou: 57% dos universitários não querem apaixonar-se. E isso, em conjunto com uma população em declínio, é preocupante para o sistema.

Não está claro se as universidades chinesas irão realmente implementar esta proposta, concebida com o intuito de ajudar os jovens a equilibrarem a vida académica com a pessoal. A ideia que bate pontos pela sua criatividade, não deixou, contudo, de escapar à controvérsia. Nas redes sociais chinesas, os utilizadores questionaram se os cursos iriam incluir “créditos extra para casamentos bem-sucedidos” ou trabalhos de casa que implicassem saídas românticas. Num panorama sociocultural bem mais complexo, umas aulas sobre o amor não parece ser a resposta mais eficaz ou adequada para garantir que os jovens se casem e tenham filhos.

Eu seria a favor de se falar de amor e sexo nas universidades, mas não nestes moldes. Esta proposta nasceu da combinação de dados de inquérito com uma preocupação governamental sobre o envelhecimento da população, e não necessariamente de uma verdadeira compreensão sobre as dificuldades emocionais que os jovens enfrentam. Eles podem sentir-se desconfortáveis em relação às dinâmicas das relações íntimas, faltando-lhes, muitas vezes, o vocabulário emocional para dar conta e agir sobre estas coisas do amor e da intimidade. Estas “aulas”, ou espaços de diálogo, só farão sentido se o objetivo não for forçar ninguém a namorar, mas sim criar um ambiente mais favorável para que os jovens se sintam confortáveis em explorar relacionamentos de forma consciente.

Na China, os jovens são desencorajados a pensar no amor e nos namoricos logo em tenra idade. Só assim conseguem fazer face às exigências escolares e do temido Gaokao, o exame de entrada para a universidade. Assim que chegam à universidade são apressados a arranjarem companheiros e resolverem-se em matrimónio. Se não é por uma questão cultural, agora também se molda em pressão governamental, para que o sistema económico se mantenha próspero. Contudo, após a universidade, os jovens enfrentam insegurança económica, desemprego, aumento do custo de vida, e preocupações que colocam a carreira acima das tradições familiares. Para muitas mulheres chinesas estas tensões são ainda mais evidentes, pois são frequentemente confrontadas com escolhas entre a vida profissional e as expectativas tradicionais de casamento e maternidade.

Iniciativas que “ensinem o amor” correm o risco de serem vistas como superficiais, incapazes de resolver os problemas estruturais que levam os jovens a adiar ou evitar formar famílias. O sucesso ou fracasso destas iniciativas dependerá mais da capacidade de enfrentar barreiras estruturais do que da criatividade das soluções propostas. Afinal, por mais interessante que seja a ideia de “ensinar amor”, ela não resolverá uma crise que tem raízes profundas na economia, na sociedade e na cultura.

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