Ai Portugal VozesFunção Pública nas ruas da amargura André Namora - 5 Ago 2024 Gostava imenso de escrever uma crónica a contar-vos os benefícios que a Função Pública tem proporcionado ao povo. A melhoria dos serviços. O atendimento telefónico eficiente. A rapidez no despacho dos requerimentos solicitados. O atendimento pessoal eficaz. A gentiliza e eficiência com que os cidadãos são atendidos no IMTT (especialmente para as cartas de condução). As casas de banho limpas nos departamentos públicos. A resposta aos e-mails enviados a entidades governantes. Gostava. Mas não posso. O contrário absoluto é que vos posso descrever para mal de todos os portugueses. Os funcionários públicos reivindicam anualmente aumento de salários e outros benefícios, nisso, são lestos e em toda a conversa queixam-se do seu baixo rendimento. Trabalham muito? Em alguns departamentos estatais e autárquicos, muitos funcionários depois de se sentarem um pouco na secretária e verificarem no telemóvel particular se têm mensagens de amigos e de verem no computador se não existe nenhuma indicação do chefe, vão tomar café, muitas vezes ao exterior, lêem o jornal desportivo e discutem as transferências nos seus clubes de futebol. Passado uma hora e meia voltam à secretária, fazem uns telefonemas que nada têm a ver com o serviço e chega a hora de almoço. À tarde, resolvem um ou dois problemas pendentes, mais um café e mais uma conversa, desta vez sobre política. Chega a hora de saída e ficou na sala um cheiro a suor… Praticamente em todos os serviços, se os cidadãos telefonam para serem informados de qualquer problema, ouvem uma gravação que lhes indicam os números respectivos dos assuntos, após o que se fica 10, 15 e por vezes 40 minutos a ouvir um tipo de música, normalmente horrível. No fim de todo esse tempo a chamada cai e o atendimento já era. Se o cidadão vai a um serviço estatal depara-se com uma fila enorme para obter uma senha e é quando o “segurança” não lhe diz que já não há senhas de atendimento. Se o cidadão se dirige à Autoridade Tributária e Aduaneira (Finanças), bem, é melhor nem ir porque duas horas de espera para ser atendido é o tempo mínimo de espera. Se o cidadão consegue ser atendido pela linha geral da Segurança Social Directa, uma funcionária com muita cordialidade agenda o dia e a hora para o assunto que o cidadão deseja resolver. No dia e hora marcados, o cidadão vai 20 minutos antes, para que não haja qualquer falha. Chegado à sede da Segurança Social, em Lisboa, apresenta-se ao balcão, diz que tem um agendamento e a funcionária pública entrega-lhe uma senha. O cidadão vai sentar-se a aguardar a sua vez de atendimento. Passam 15 minutos da hora agendada, passam 30, passam 45 minutos e o cidadão desloca-se ao referido balcão de atendimento e pergunta a razão do atraso do agendamento, se as pessoas que estiveram na fila e não agendaram já foram atendidas? A resposta foi simples: “isto está um pouco atrasado”, ao que o cidadão retorquiu: “Atrasado, deve ser só para alguns assuntos”. Ao fim de uma hora o cidadão foi atendido, apresentou a documentação devida, a funcionária atendeu com muita cordialidade e quando o cidadão lhe perguntou: “Tem uma ideia de quando obterei uma resposta?”, a funcionária respondeu: “Sabe, isto agora vai tudo de férias e, portanto, lá para Setembro começam a analisar os processos e em Outubro deve receber uma carta”. Leram bem? “DEVE”, não deu a certeza que seja em Outubro. Se um cidadão envia um e-mail para uma vogal de uma autarquia, a senhora deve pensar que é a primeira-dama da Nação. Responder ao nosso e-mail. Nem pensar. O maior desespero da população, especialmente a idosa que não usa computador, é a falta de atendimento telefónico por todo o lado. E já não são só os serviços públicos. Muitas empresas privadas já copiam o estilo desprezível da Administração Pública. Na Câmara Municipal de Lisboa mente-se com todos os dentes que tem na boca, mesmo que sejam implantes. Pergunta-se, quando um prédio inicia as obras dos alicerces (futuras garagens para os residentes) que género de habitação municipal se trata e respondem que se destina a habitações de renda acessível. O cidadão tenta inscrever-se para tentar obter uma habitação de renda acessível, porque o seu rendimento mensal cifra-se nos 700 euros. De imediato obtém uma resposta: “que as futuras habitações já foram destinadas a pessoas de fracos recursos”. Tudo bem? Não, tudo mal. O prédio ficou pronto e começou a ser habitado. Por quem? Por cidadãos que entram para a garagem com os seus carros de marca Tesla, BMW, Mercedes, Lexus e Nissan. Vocês acham que proprietários de veículos de topo de gama são pessoas de fracos rendimentos e que precisam de uma casa com renda acessível?… A mesma edilidade lisboeta abriu um concurso para conceder um subsídio de renda, os cidadãos em dificuldades inscreveram-se de imediato, mas qual não foi o seu espanto quando lhes era exigido um tal número de documentos que levaram logo os pretendentes a desistir do pedido de subsídio. Por outro lado, sejamos justos e temos de salientar que há um serviço público que está a funcionar com grande profissionalismo e gentileza. Trata-se das diferentes Lojas do Cidadão, onde se é atendido com satisfação pele rapidez. P. S. – Neste último fim de semana verificou-se o caos de norte a sul do país em muitas urgências hospitalares encerradas.