Novo álbum de Carlos Bica com José Mário Branco em pano de fundo

O novo álbum de Carlos Bica, “11:11”, reúne o contrabaixista veterano e três novos músicos portugueses, com quem recria “A Noite” de José Mário Branco, entre temas originais, num contexto de preocupação pela democracia.

“É vital para o ser humano viver numa democracia e devemos estar preocupados se no-la querem roubar, mas em vez de morrermos como heróis loucos, devemos sobretudo contribuir para um mundo melhor com aquilo que de melhor temos para dar”, disse Carlos Bica em entrevista à agência Lusa.

“11:11” foi gravado com novos companheiros de viagem, com quem o compositor e contrabaixista forma este seu novo quarteto: José Soares, em saxofone alto, Eduardo Cardinho, vibrafone, e Gonçalo Neto, em guitarra e banjo, que também compõe dois dos temas gravados, além de se juntar a Bica na escrita de um terceiro.

Apesar de já viver há 40 anos em Berlim, nunca perdeu o contacto com a cena musical portuguesa, garante à Lusa o criador de “Azul”. Daí que tenha acabado por reunir “alguns dos mais talentosos e criativos músicos de uma nova geração”.

Lá e cá

O título “11:11” provém de um acaso que se tornou constante na sua vida, de que depois procurou o significado e que lhe deu “um portal para o universo”. A voz de José Mário Branco (1944-2019), por outro lado, era já um projecto para o qual obtivera autorização do compositor: uma releitura de “A Noite”, construída a partir de três “Odes Modernas” de Antero de Quental, o poeta português que apelara aos humilhados: “Não disputeis as migalhas do banquete […], tomai o vosso lugar à mesa!”

“José Mário Branco viveu num período muito difícil da história de Portugal”, recorda Carlos Bica. “Com apenas 21 anos, viu-se forçado a exilar-se em Paris para fugir à guerra colonial, e só regressou em 1974, após a Revolução dos Cravos. A música do José Mário é um sinónimo de todas essas suas vivências. A palavra serviu a música, mas a música também serviu a palavra, para lá das maravilhosas canções” que compôs.

A preparação de “11:11” recordou a Carlos Bica “os tempos de adolescência e das bandas de garagem” onde passava “horas a tocar uma canção sem nunca olhar para o relógio”.

“O prazer pela descoberta e surpresa, é um sentimento muito forte que nos une ao fazer música e onde a diferença de idades é completamente irrelevante”, disse à Lusa. “As inúmeras horas partilhadas numa sala de ensaio são necessárias para se conseguir um som de grupo, uma qualidade que faz toda a diferença”.

Com quatro décadas de vida na Alemanha e nome firmado no topo da cena jazzística, Carlos Bica sempre colaborou com diversos músicos. Para este novo quarteto “vários passos foram dados até chegar a esta constelação”, disse à Lusa.

“Apesar da distância geográfica de Berlim-Lisboa, os músicos deste meu novo quarteto surgiram como que por acaso. A diferença de gerações é uma mais-valia para este projecto”, em que tudo parece ter surgido naturalmente, “sem grande esforço”, como acontece com “as boas coisas da vida”, “apesar de estarmos conscientes de que houve um trabalho anterior necessário para que elas pudessem acontecer”. O álbum “11:11” está disponível nas plataformas digitais, mas também tem uma edição em disco. “Felizmente que ainda existem muitos amantes da música que gostam de ter na mão o objecto físico”, disse Carlos Bica.

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