Livro Negro

Há cada vez mais cortejos de fétidas tendências desembocando nas agruras da edição, que provocam calafrios, e um mais que hediondo arbitramento autoral à mistura com editoras que não passam de pólos terroristas do conceito literário e, com toda esta superabudância de vacuidade degenerativa, não andamos longe de uma vingança gratuita feita paulatinamente por todos aqueles que em vórtice convocam as Nações para a morte do poeta.

Só que ele ficará. Aliás, mais nada restará que a visão do Poeta, esse Felino que olha do cimo da Árvore da Vida, frondosa e alta, toda a existência a passar de um ângulo quase intangível – um gato também não dirige o seu olhar a partir de baixo, mesmo em doméstica convivência irá sempre para o cimo das estantes contemplar a disposição humana na arquitetura da sala.

Sabemos muito bem que não somos guindastes, e por mais que transformemos em altura as nossas arquiteturas, fazemo-lo no estrito conceito de casulo, que a vertigem augura sempre na espécie razões de sobra para grandes projeções que se equiparam a Ícaros na ânsia terráquea por se lançarem no sol(o) onde estas agoras gentes não passam de seres paisagísticos, bilhetes-postais para tráfico de venda das suas próprias raízes, onde neste assistir do contrabando auspicioso se espelham ainda com sorrisos triunfalistas que selam o fim de uma civilização por alienação sem paralelo no tempo dos “autores” indutores… Induzimos os seres a sentirem-se estranhos em seus corpos, a procurarem a sua alma, as suas reminiscências, a mudarem, em vez de conservar, corrigir, adaptar. Impulsionamos a desordem biológica, o fim do contributo distributivo da espécie, e há agendas que pagam fortunas para estas manifestações e que esquecem a justiça social de uma outra humanidade explorada nos afãs de um jogo obscuramente propagandístico.

Lemos este embuste como nos tirassem a luz das coisas começadas, dos mais belos instantes em que o espírito ganhou aquelas asas prestes a cruzar o Bojador da nossa ignorância, ultrapassando os nossos medos

E

No Livro

Dizemos:

Nós somos os povos do Livro. Inadiáveis, traumatizados, confusos, hierárquicos, suspensos, em transe. Ele se fez Negro pela opaca interpretação dos séculos, e nós, transgressivos sem causa, muito embora lembrando as fontes remotas da linguagem – esse sopro – língua escrita, fascinante código: chegámos ao atoleiro das frágeis reservas individuais ao serviço de pontos de vista, sentimentos, especulações e engrenagens. Estamos quase a dizer adeus ao primeiro parágrafo do Livro, e numa incongruente, demagógica e infernal tendência do culto da personalidade, ele é agora, e mais que nunca, inundado por pragas bem à porta de um outro patamar onde deve começar a sua acção: a linguagem telepática!

O Livro vai mudar. Esta nossa etapa tão escapatória, escatológica, improvável, vulnerável, não será inscrita na sua proeza, a dos registrados. Para trás, lindos seres, belas fontes, e grandes, todas as experiências…

Mas o Livro é apenas um. Nós achamos que ele é Negro como todos os buracos que engolem galáxias inteiras por este universo fora, mas também há homens que têm medo da penetração tal como qualquer estrela que não deseja dissipar-se, que o ser que penetra entrará para sempre na combustão do desaparecimento. E há ainda no Livro esse insidioso pecado de Onã.

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