Estudo | Profissionais de saúde queixam-se de stress devido demasiado trabalho

Um estudo conclui que cerca de 30 por cento dos profissionais de saúde de Macau sentem stress por desempenharem um leque alargado de tarefas, incluindo “trabalhos desnecessários”. Cerca de 30 a 40 por cento destes profissionais diz ainda sentir stress por fazerem trabalhos que vão além das suas competências

 

Os profissionais de saúde de Macau sentem stress por terem de desempenhar tarefas além das que lhe são habitualmente atribuídas ou por terem de fazer trabalho desnecessário. Esta é uma das conclusões mais relevantes do estudo “Análise sobre os Tipos e as Causas do Stress do Papel dos Profissionais de Saúde de Macau: Numa Perspectiva das Relações nos Locais de Trabalho”, da autoria de Ao Io Weng, coordenador-adjunto da Comissão de Juventude da Federação das Associações dos Trabalhadores da Função Pública de Macau. O estudo em causa foi publicado na edição de Setembro da revista Administração, publicação da responsabilidade da Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP).

Lê-se no estudo que “cerca de 30 por cento dos profissionais reconhecem que sentem stress derivado do conflito de papéis, em virtude de, por exemplo, fazerem trabalhos desnecessários ou de satisfazerem exigências de outros que não são uniformes”.

Enquanto isso, “há também 30 a 40 por cento dos profissionais que reconhecem que sentem stress decorrente da sobrecarga de papéis, ou seja, a natureza ou a carga de trabalho excede as suas competências”. No entanto, acrescenta o autor, “a grande maioria dos profissionais de saúde conhece muito bem o posicionamento do seu papel”, sendo que menos de dez por cento diz sentir stress por não perceber muito bem quais as funções fundamentais que tem de desempenhar.

Uma vez que as origens do stress no local de trabalho podem advir do mau relacionamento entre colegas, por exemplo, o estudo revela que “uma pequena parte, 10 a 20 por cento, dos profissionais de saúde entrevistados reconhece a existência do problema da hostilidade no local de trabalho”.

Este trabalho foi feito com base em 308 questionários válidos, sendo que 78 por cento dos inquiridos são mulheres e 22 por cento homens. Em termos de profissão, predominam os enfermeiros, representando 51,6 por cento dos entrevistados, seguindo-se os médicos, com 26 por cento. Relativamente à idade, os profissionais dos 31 aos 40 anos constituem 33,1 por cento de todos os inquiridos, seguindo-se os trabalhadores de saúde dos 41 aos 50 anos com uma fatia de 29,9 por cento.

A maioria dos participantes no inquérito está habilitada com licenciatura, representando 49,4 por cento, enquanto os com mestrado ou superior representam 29,5 por cento.

Conflitos “não são vulgares”

O autor dá conta que, até à data, não tinham sido publicados muitos estudos sobre as condições de trabalho dos profissionais de saúde no território, apontando para o facto de que “com o desenvolvimento socioeconómico de Macau nos recentes anos, a procura de serviços de saúde por parte dos cidadãos aumentou”. Além do aumento do volume de trabalho devido ao maior acesso à saúde, “se acrescentarmos o impacto da pandemia, os profissionais de saúde têm enfrentado maiores desafios decorrentes do trabalho”.

Tendo em conta os dados apontados, o autor sugere que seja “intensificada a comunicação com o superior hierárquico e entre os colegas por ocasião da planificação das actividades” a fim de “definir objectivos de trabalho que equilibrem as expectativas de todas as partes”, reduzindo situações de stress provenientes de conflitos laborais ou do desempenho de múltiplas tarefas.

Ao Io Weng destaca que “os comportamentos hostis no sector de saúde não são vulgares”, mas há que tomar medidas, nomeadamente a identificação, por parte das autoridades, “das razões pelas quais parte dos profissionais de saúde têm comportamentos hostis”.

Sugere-se a criação de normas contra situações de discriminação no local de trabalho, “por forma a serem defendidos os direitos e os interesses físicos e mentais dos trabalhadores”. Para tal, “talvez possa tomar-se como referência a prática noutros territórios, seguindo o exemplo da Região Administrativa Especial de Hong Kong, no sentido de desenvolver normas contra a discriminação consagradas na Lei Básica”.

Devem ainda, segundo o autor do estudo, “tomar-se uma pluralidade de medidas que aliviem o stress do papel dos profissionais de saúde”. Pede-se ainda que “seja intensificado o apoio logístico aos profissionais de saúde por parte das instituições de saúde, no intuito de reduzir o tempo e a energia gastos no desempenho de tarefas fora da sua especialidade”.

Devem também ser “definidos critérios racionais” para as tarefas, além de se proceder a uma avaliação do trabalho distribuído a cada profissional. Tudo para “evitar desigualdades na carga de trabalho e na distribuição desadequada resultante das relações no local de trabalho”.

Salários importam mais

Ao Io Weng dá ainda conta que, nos últimos anos, “a comunidade tem prestado bastante atenção às pressões de trabalho e às pressões sobre o moral dos trabalhadores”. Assim sendo, o responsável considera que o Governo tem procurado dar resposta a muitas das questões, “investindo recursos para aperfeiçoar as condições de trabalho destes profissionais e para responder ao aumento contínuo da procura de serviços de saúde”.

São apresentados exemplos como “a construção de um novo hospital (Complexo dos Cuidados de Saúde das Ilhas, no Cotai) e a contratação de mais pessoal de saúde”.

O autor dá conta que “algumas associações do sector da saúde e deputados expressam as suas opiniões junto do Governo no sentido de actualizar as regalias e as remunerações do pessoal de saúde da Administração, com vista à elevação do moral daqueles profissionais”.

Ao Io Weng entende que, no que diz respeito ao bem-estar físico e psicológico dos profissionais de saúde, a sociedade dá mais atenção às infra-estruturas e remunerações, sendo que “condições relativas às relações e à cultura [existente] no local de trabalho) são aquelas a que a mesma pouco atende”.

“No contexto em que os recursos financeiros públicos são limitados, torna-se claro que a pretensão de aliviar as pressões sobre o pessoal de saúde mediante o incremento das despesas públicas não é uma alternativa de preferência”, conclui ainda o autor deste trabalho.

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