A recuperação económica de Macau depois da pandemia

A semana passada, o Chefe do Executivo de Macau afirmou na Assembleia Legislativa que os salários dos funcionários públicos não vão aumentar este ano. A razão do congelamento dos salários prende-se com o déficit orçamental. Ho Iat Seng disse ainda que as finanças do Governo de Macau só estarão equilibradas quando os impostos sobre a indústria do jogo atingirem os 230 mil milhões de patacas.

Esta mensagem, para além de explicar o congelamento dos salários em 2023, também é muito importante para os residentes de Macau porque indica que as receitas do Governo não chegam actualmente para cobrir as despesas, pelo que continua a haver déficit fiscal.

As razões para este déficit podem ser identificadas. Actualmente, as despesas do Governo não aumentaram substancialmente, em termos de receitas, devido ao abrandamento da epidemia o número de turistas aumenta de dia para dia. No entanto, os efeitos da pandemia continuam a fazer-se sentir. Os dados mostram que o número de turistas ainda não atingiu os níveis da situação pré-pandémica. Assim sendo, é preciso mais tempo para que os impostos sobre a indústria do jogo atinjam os níveis anteriores à pandemia.

As receitas do Governo provenientes dos impostos sobre o jogo não são tão boas como antes, calcula-se que o somatório dos impostos sobre o jogo e sobre a indústria do turismo serão apenas suficientes para cobrir as despesas operacionais, podendo talvez existir um pequeno saldo positivo. O aumento do número de turistas vai directamente beneficiar as indústrias do turismo e do jogo. Os outros sectores, como beneficiários indirectos, precisarão de mais algum tempo para ver os seus negócios voltar aos níveis anteriores.

Existem factores externos que justificam a contenção do aumento do turismo. Em termos de factores internos, a economia local e o consumo em Macau ainda estão a passar por um certo grau de declínio. Nos diferentes órgãos de comunicação, vemos com frequência notícias sobre “Os carros de Macau que vão em direcção ao Norte”. Estas notícias indicam que, diariamente, 2.000 carros de Macau partem em direcção à China continental e que a maior parte dos seus ocupantes vão gastar dinheiro nessas paragens. Façamos um cálculo simples. Assumindo que cada carro transporta cinco pessoas, em 2.000 carros viajam 10.000 indivíduos. Cada mês tem 30 dias, ou seja, 300.000 pessoas gastam dinheiro na China continental todos os meses. Macau perde cerca de 300.000 consumidores mensalmente, o que afecta naturalmente as receitas dos vários sectores da cidade.

O objectivo dos consumidores é comprar ‘barato, maravilhoso e agradável’. Porque é que as pessoas hão-de comprar por preços altos o que podem comprar mais barato e que lhes dá o mesmo prazer? A maior parte dos artigos de primeira necessidade em Macau, nomeadamente os alimentos, são importados do continente, onde os preços são muito mais baixos. É por isso que as pessoas se dirigem para Norte nos seus carros, para comprar bens de primeira necessidade na China continental.

A partir do momento em que se estabeleceu este padrão de consumo, não vai ser fácil mudá-lo. Mas o impacto desta tendência pode ir ainda mais além. A semana passada, a Hong Kong TVB anunciou que um restaurante de Shenzhen estava a oferecer descontos para residentes de Hong Kong para os encorajar a consumir. Em comparação, o nível de vida em Hong Kong é superior ao de Shenzhen, o que se pode ver claramente pela diferença dos preços das casas e dos salários entre as duas cidades. Assim sendo, os serviços e bens que são caros para as pessoas de Shenzhen tornam-se relativamente acessíveis para os residentes de Hong Kong e estes têm claramente interesse em gastar o seu dinheiro em Shenzhen. A promoção do restaurante é feita precisamente para atrair uma clientela com mais poder de compra. Acredita-se que a recuperação económica deste restaurante aumente de dia para dia. Até agora, não se ouviu falar de nenhuma loja em Zhuhai que ofereça descontos especiais para residentes de Macau. Se isso vier a acontecer, a economia de Macau pode vir a ser ainda mais afectada.

A solução para o problema é aumentar o consumo local. Desde que os sectores que não pertencem ao jogo ou ao turismo recuperem aos poucos, a economia de Macau pode desenvolver-se de uma forma equilibrada. Para atingir essa meta o passo mais importante é a introdução de mais actividades com características específicas de Macau, como produtos e serviços da marca Macau. De momento, o “Desfile por Macau, Cidade Latina” e o “Grand Prix” não só atraem turistas, como também promovem o consumo dos habitantes de Macau. Estes acontecimentos são obviamente benéficos para a economia da cidade, mas, pela sua natureza, só podem ser realizados uma vez por ano. Não é possível serem eventos bi ou trianuais.

O “Mercado Nocturno de Kanggong” e o “Passeio na Avenida de Almeida Ribeiro” são actividades típicas de Macau e os consumidores são sobretudo residentes da cidade. Futuramente, se o problema do ruído relacionado com a realização do “Mercado Nocturno de Kanggong” puder ser resolvido, e os problemas de tráfego gerados pelo ‘Passeio na Avenida de Almeida Ribeiro também forem solucionados, este tipo de actividades podem ser realizadas várias vezes por ano, o que pode atrair e fixar o consumo local. Estas actividades podem também aliviar a pressão da indústria da restauração e do retalho e ajudar a recuperação económicas das outras indústrias.

Contudo, em todas estas actividades existe uma característica em comum, a aglomeração de pessoas. Enquanto a epidemia não estiver completamente debelada, e tendo em conta o novo vírus EG.5 recentemente descoberto, temos de continuar a prestar atenção à transmissão viral.

A longo prazo, Macau deve criar actividades, produtos e serviços únicos, que só possam ser adquiridos na cidade, para aqui fixar o consumo dos habitantes locais, tarefa que, apesar de tudo, não será fácil de realizar. Contudo, vai levar algum tempo para revitalizar a economia de Macau apenas contando com o turismo e com a indústria do jogo.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão do Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

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