Turismo | Primeira metade do ano “satisfatória”, mas ainda há desafios

Seis meses depois da total reabertura de fronteiras, o panorama turístico parece risonho, com 11,64 milhões de turistas registados no primeiro semestre e 2,2 milhões apenas em Junho. Luís Herédia, da Associação de Hotéis de Macau, espera um segundo semestre ainda melhor, apesar da falta de mão-de-obra que ainda afecta o sector. O académico Glenn Mccartney alerta para a concorrência do outro lado da fronteira

 

De oito a oitenta. A conhecida expressão portuguesa parece assentar que nem uma luva no actual panorama turístico de Macau. Depois de muitos meses praticamente sem turistas e com as ruas vazias, o território parece ter voltado à azáfama habitual de turistas oriundos, sobretudo, da China, com autocarros cheios e receitas do jogo bastante animadoras.

Conhecidos os números seis meses depois da total abertura do território em contexto de covid, as perspectivas para o sector do turismo parecem animadoras: Nos primeiros seis meses do ano, Macau recebeu 11,64 milhões de turistas, sendo que, em Junho, a fasquia foi de 2,2 milhões. Por sua vez, a taxa de ocupação hoteleira da primeira metade do ano foi de 78 por cento.

Ao HM, Luís Herédia, presidente da Associação de Hotéis de Macau, entende que estes dados “são satisfatórios para um semestre imediato após a abertura às restrições”, tratando-se de “um novo período que estamos a entender”.

“Trabalhamos para atrair turistas, temos um produto que é procurado, mas é preciso responder às expectativas e, se possível, superá-las”, disse, adiantando que não basta ter as infra-estruturas suficientes, mas também recursos humanos e outro tipo de meios “capazes de fornecer serviços de alta qualidade”.

Nos meses imediatos à abertura do território, muitos hotéis não puderam operar a cem por cento devido à falta de empregados. Situação que melhorou, embora a situação esteja ainda “numa fase muito instável”. “Não só precisamos de recrutar mais trabalhadores ao exterior, como tem havido muita mobilidade nesta fase pós restrições. Tal obriga a uma gestão de recursos humanos muito exigente e a um esforço maior na formação e preparação de equipas”, disse ao HM Luís Herédia.

Ainda assim, o responsável prevê que o segundo semestre “deverá ser melhor e satisfaz-nos em termos de negócio”, embora se esperem meses “desafiantes e preocupantes na gestão”.

“Temos de ser competitivos como os melhores destinos turísticos, precisamos de maior estabilidade nos recursos humanos. Há ainda falta de trabalhadores, precisamos de equipas estáveis que garantam uma oferta de serviços de alta qualidade”, adiantou.

Concorrência do lado de lá

Glenn Mccartney, especialista em turismo e académico da Universidade de Macau, defende que há vários factores a ter em conta na hora de analisar os números registados nos primeiros seis meses do ano.

“É importante notar que a duração média da estadia [por visitante] se mantém em 1,3 dias, com uma divisão de cerca de 50/50 entre os visitantes que pernoitam e os que visitam Macau no mesmo dia”, sendo que em 2019, período pré-covid, “47 por cento dos visitantes pernoitaram e 53 por cento viajaram durante o dia”.

O académico recorda que “aumentar a duração da estadia dos visitantes de Macau tem sido um desafio histórico que remonta ao início da década de 2000”. Na fase actual, conseguir esse feito depende “do marketing e da promoção do destino”.

Contudo, Glenn Mccartney recorda que, do outro lado da fronteira, nomeadamente Zhuhai, há alojamento a preços mais acessíveis, além de que na cidade, e também em Hengqin, “a oferta hoteleira tem aumentado, disponibilizando mais opções aos visitantes de Macau, tendo em conta que 65 por cento das visitas [ao território], no primeiro semestre, são provenientes do Interior da China”.

Desta forma, “o desafio de Macau é ainda maior no que respeita ao incentivo a estadias mais longas na cidade”. Uma das possibilidades avançadas pelo académico passa por encontrar “uma forma de colaboração entre a Cotai Strip e Hengqin, bem como com agências de viagens, que poderá resultar em estadias mais longas e taxas de ocupação mais elevadas”.

Fronteiras mais acessíveis

Na análise ao desempenho do turismo do primeiro semestre, o académico da UM opta ainda por comparar os preços do alojamento e transportes, pois existe uma crescente acessibilidade dos postos fronteiriços.

Assim, “a questão de o visitante calcular o tempo gasto para ir e voltar de Macau para Zhuhai, ou Hong Kong, pode não ser uma questão-chave”, além de que existe a ponte HKZM e os ferries diários, o que significa que “os visitantes de Hong Kong, que representaram 30 por cento das visitas no primeiro trimestre, também podem ir a Macau durante o dia”.

O lugar do MICE

Apesar da oferta de alojamento de baixo custo nos últimos meses ter aumentado, Glenn Mccartney defende que Macau “precisa de mais alojamento do tipo económico”. Tal “não significa que o visitante gaste menos, mas sim que o turista tem mais para gastar e mais tempo para o fazer, no jogo e fora dele, seja em lojas, restaurantes, eventos e espectáculos, ou a oportunidade de passear pela cidade, gastando mais nos estabelecimentos comunitários locais”.

Ainda sobre a ocupação hoteleira, Glenn Mccartney entende que “as cidades [que acolhem] convenções e exposições podem ter estadias mais longas, uma vez que os viajantes em negócios podem ficar três ou quatro dias para uma conferência durante a semana, enquanto as viagens de lazer se concentram mais ao fim-de-semana”.

Desta forma, o sector MICE [Exposições, conferências e convenções” também tira partido da existência de mais alojamento económico, defendeu. Este sector pode ajudar “a superar o desafio turístico da sazonalidade, em que há uma ocupação mais baixa de segunda a quarta-feira e uma ocupação mais elevada ao fim-de-semana”. Assim, “Macau tem procurado aumentar o segmento dos visitantes [do sector] MICE, [tendo em conta o contexto] em que as taxas de ocupação hoteleira têm tendência a ser mais elevadas aos fins-de-semana e feriados, devido ao facto de os viajantes em lazer constituírem o principal segmento [no sector do turismo]”.

De destacar que, em Julho, Helena de Senna Fernandes, directora dos Serviços de Turismo (DST), disse esperar que o número de turistas chegue aos 24 milhões em termos anuais.

“Estamos a trabalhar para isso. E as férias do Verão, particularmente Agosto, é tradicionalmente a época alta do turismo de Macau, seguida por Dezembro. Portanto, na segunda metade do ano teremos muitos eventos, esperamos muito que possamos atingir esse número, e assim todos os sectores podem beneficiar”, indicou.

A responsável frisou ainda que “o número de visitantes do Interior da China a Macau recuperou 60 por cento do nível pré-epidémico e o de visitantes de Hong Kong voltou a 90 por cento, enquanto o mercado do exterior restaurou apenas por 20 por cento”, adiantou.

Helena de Senna Fernandes também classificou como “satisfatório” o desempenho do turismo nestes seis meses, que pode ter beneficiado de várias acções promocionais da DST no exterior, em países e regiões asiáticos, como Tailândia, Malásia, Indonésia, Singapura e Coreia do Sul. As autoridades têm também apostado no convite a operadores turísticos e influencers para chamar a atenção daquilo que melhor Macau tem para oferecer.

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