Seguro de titular

A semana passada foi publicada uma notícia na imprensa de Hong Kong sobre a compra de propriedades no Canadá. Na peça, salientava-se que, neste país, se aconselha as pessoas que compram propriedades a não as pagarem a pronto a totalidade do seu valor, mesmo que tenham dinheiro suficiente para o efeito. Considera-se preferível contrair um pequeno empréstimo bancário para impedir vendas fraudulentas. Além disso, o proprietário deve fazer um ‘seguro de titular’ para ter protecção adicional.

Ser titular significa que se detém direitos de propriedade e de posse. Quem compra uma propriedade torna-se seu titular, ou seja, adquire os direitos de propriedade e de posse sobre esse bem. Ter a propriedade de, significa ser dono de. Ter a posse significa ter o direito de usar a propriedade. Numa venda de imobiliário, o comprador tem de adquirir simultaneamente a propriedade e a posse, mas existem algumas excepções. Por exemplo, se o imóvel que está a ser vendido estiver arrendado, embora o comprador adquira a propriedade, o direito de posse do imóvel fica limitado pelo contrato de arrendamento. Esta é uma situação especial na venda de imóveis, e o vendedor deve prestar toda a informação ao comprador.

O seguro de titular é um tipo de seguro que protege o proprietário ou o locatário de imóveis residenciais ou comerciais e que indemniza o comprador caso exista algum problema não identificado com a propriedade adquirida. Uma situação fraudulenta que ocorre com alguma frequência é a “venda” de um imóvel por burlões. Nesta situação, o comprador pode pedir à companhia de seguros que o indemnize, através do seguro de titular. Actualmente, em Ontário, o preço do seguro de titular é de cerca de 900 dólares para uma propriedade no valor de 1 milhão.

Para além de proteger a titularidade, o âmbito do seguro do titular abrange ainda hipotecas imobiliárias, taxas de água e de eletricidade, prestações de condomínio não pagas pelo proprietário anterior, construções ilegais de imóveis que não foram demolidos, registos públicos incorrectos que podem levar à perda do direito de propriedade, etc.

Um advogado canadiano reportou em 2022, quatro casos em que os burlões pretendiam ser proprietários dos imóveis postos à “venda”. Os alvos destas fraudes eram todos cidadãos chineses. Um dos motivos que levou ao aumento deste tipo de esquemas fraudulentos está relacionado com a pandemia, pois, nesta altura, muitos contratos de compra e venda foram assinados através de videoconferências. No entanto, desde que os compradores tivessem seguro de titular, eram todos compensados.

Em comparação com o Canadá, a compra e venda de propriedades em Hong Kong é mais complexa, tem de ser registada junto do departamento governamental competente, embora o registo não atribua automaticamente a propriedade do imóvel; fixa apenas a forma como o proprietário o vai usar. Mais importante ainda, não estar registado não significa que não haja interesse fundiário. Por conseguinte, o sistema imobiliário de Hong Kong exige seguro de propriedade. Num precedente, um motorista de autocarros entregou o dinheiro para a compra de um imóvel à esposa, que contratou para o efeito um escritório de advogados. Como a mulher tratou do assunto sozinha, foi a única a assinar a documentação, pelo que se transformou na proprietária exclusiva do imóvel. Mais tarde, vendeu a propriedade sem o conhecimento do marido e fugiu de casa com o dinheiro. O comprador levantou um processo ao marido para desocupar o apartamento. O caso foi julgado num tribunal de Hong Kong, e o juiz apurou que o dinheiro para a compra do imóvel provinha do marido e que era ele o verdadeiro proprietário. Embora isto não possa ser mostrado no contrato de propriedade, o comprador descobriu, depois de fazer uma inspecção ao local, que além de roupas da mulher, havia também roupas do marido. O comprador devia ter percebido que o marido também vivia no apartamento e deveria ter procurado informar-se melhor. Como não o fez, teve um comportamento negligente. Desta forma, o comprador passou a deter apenas a propriedade do imóvel, e o marido enganado manteve o direito de posse e pôde continuar a habitá-lo.

A partir do caso deste infeliz comprador de imóveis, podemos compreender a importância do seguro de titular em Hong Kong. Pelo contrário, em Macau, desde que o contrato de compra e venda do imóvel seja assinado e os procedimentos de registo relevantes sejam concluídos, o comprador torna-se o proprietário do imóvel, pelo que a importância do seguro de titular em Macau não é elevada. Na China continental, os compradores não estão sensibilizados para a aquisição de seguro imobiliário. Acredita-se que seja mais difícil promover este seguro do que em Hong Kong e Macau.

Voltando à questão da compra de imóveis no Canadá, embora existam seguros de titular neste país, para impedir a venda de casas por burlões, o comprador deve contrair um empréstimo à habitação em qualquer banco. Do ponto de vista da gestão financeira, esta condição é anti-económica. Desta forma, fica “escravo da propriedade” para o resto da sua vida.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola de Ciências de Gestão do Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

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