Ai Portugal VozesAs férias podem desgraçar a vida André Namora - 31 Jul 2023 A maioria dos portugueses passa o ano a pensar nos dias de férias. As férias são uma medida merecida para quantos trabalham. O descanso físico e psicológico são factores imperiosos para todos os que laboram nas suas mais diversas profissões. As férias são normalmente planeadas e decididas, na maior parte dos casos para o mês de Agosto. Até a Assembleia da República encerra os seus trabalhos e os ministros vão até ao estrangeiro ou para as praias do Algarve. As férias têm os mais diversos utilizadores. As pessoas que têm muito dinheiro, as que recebem um salário mediano e os cidadão que não podem ter férias. Estes últimos, são trabalhadores pobres que recebem o salário mínimo nacional ou reformados que usufruem pecúlios de miséria. Estes nem podem pensar em ter um dia à bera do mar. Quem não pode ter férias sabe o que é o sofrimento de ter uma renda de casa em atraso, ter uma prestação ou mais por pagar ao banco, ter um a ordem de despejo porque não conseguiu fazer frente ao pagamento do arrendamento, ter de vender o seu automóvel para poder pagar as propinas dos filhos. Tenho uma vizinha que decidiu ir com o marido e três filhos para Punta Cana, em Junho passado. Para o efeito, contraiu um empréstimo ao banco de quantia avultada. No regresso deparou-se com o aumento das taxas de juros no empréstimo para a compra da casa e com o pagamento da prestação mensal ao banco do empréstimo para ir de férias. Entretanto, a senhora ficou desempregada e o salário do marido é absolutamente insuficiente para que a família possa continuar a viver no andar que adquiriram porque já recebeu um aviso do banco que a sua casa terá de ser penhorada. Estão desesperados e a ida de férias desgraçou-lhes a vida. São as opções que se tomam, por vezes, inconscientemente e somente pensando no tal direito a férias. Em Portugal, segundo um inquérito de uma organização de apoio social, mais de metade dos portugueses não podem gozar férias em lado nenhum. Ficam por casa, levam os filhos ao parque infantil e contam o dinheiro nas compras do supermercado. Quando os familiares lhes perguntam se vão de férias até à aldeia, respondem que não podem. O dinheiro necessário para o transporte, alimentação e a ajuda necessária aos familiares anfitriões não existe na conta bancária desses cidadãos. Por outro lado, temos casos caricatos. Há três meses que andei a ouvir uma senhora dizendo-me que em Julho estaria numa bela ilha da Grécia de férias. Sonhava com o resort contratado para o ripanço de 20 dias. Chegou a altura de embarcar e a dita senhora seguiu viagem com o filho divorciado e com três netos para a Grácia. Chegou à referida ilha e deparou-se com uma temperatura insuportável de cerca de 50 graus e de seguida com incêndios destruidores. A senhora e os familiares tiveram de ser evacuados do hotel e andar cerca de 15 quilómetros a pé com as malas de arrojo. As crianças cheias de sede e cansadas tiveram que receber assistência médica quando chegaram ao destino. Quando foram retirados de barco para Atenas, os hotéis estavam superlotados e seguiram para o aeroporto a fim de regressarem a Lisboa. No aeroporto reinava o caos. Passageiros que dormiam no chão, aviões que não levantavam voo devido aos graves incêndios que rodeavam a capital grega. Apenas conseguiram levantar voo para Lisboa passados dois dias, exaustos, nervosos e preocupados com as crianças. O sonho das férias tinha-se transformado num pesadelo profundo e estando à beira do risco de morte, no momento em que foram evacuados do hotel da ilha grega. O sonho das férias, mesmo para quem tem suficiente independência financeira, pode tornar-se numa desgraça nas suas vidas. As férias são merecidas para todos, mas, infelizmente só alguns as podem gozar e muitas vezes sofrendo o que nunca imaginaram. Tenho conhecimento de pessoas que nunca gozaram dias de férias, outras que há cerca de 20 anos que não têm férias, especialmente, porque o subsídio de férias que recebem do Estado ou da empresa onde trabalham serve para pagar algumas dívidas que foram acumulando junto de amigos. Há quem diga simplesmente; “É a vida”. Em todo o mundo há pobres e ricos. Certo. Mas, é muito triste chegarmos à altura do Verão, tempo propício para umas férias merecidas e reduzirem-se ao acolhimento do lar, ao arrefecimento da banheira na casa de banho e ao passeio nocturno pelo bairro quando a temperatura fica mais baixa. Todos os que podem ter as suas férias podem considerar-se uns felizardos num país onde a vida está a ficar desnorteada para metade dos portugueses, quando os jovens acabam o seu curso superior e emigram após terem vivido em casa do pais, muitas vezes além dos 30 anos de idade. Seja como for há que desejar a todos os nossos leitores que podem ter férias que as gozem o melhor possível e que tudo vos corra pelo melhor, já que têm praias lindas na Tailândia, Filipinas, Timor-Leste ou Indonésia. De todo o modo, o nosso desejo de boas férias!