Manchete SociedadeCCAC | IC e Obras Públicas acusados de falhas de supervisão João Santos Filipe - 28 Dez 2022 O Comissariado contra a Corrupção considera que o Instituto Cultural e as Obras Públicas falharam na protecção do Restaurante Lok Kok, um dos edifícios mais emblemáticos da Rua Cinco de Outubro. Apesar de o imóvel ter sido demolido, concluiu-se que os actuais mecanismos de supervisão respondem às necessidades O Comissariado contra a Corrupção (CCAC) considera que o Instituto Cultural (IC) e a anterior Direcção de Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) falharam nas suas obrigações ao permitirem que a fachada do Restaurante Lok Kok fosse demolida de forma ilegal. A conclusão faz parte de um relatório do CCAC, apresentado na semana passada, que apesar de apontar várias “falhas”, nega a existência de crimes e considera que os mecanismos de supervisão actuais respondem às necessidades. Segundo o comunicado do CCAC, desde 1991 que “todos” os proprietários do imóvel falharam no cumprimento dos “deveres atribuídos pela legislação de salvaguarda do património cultural”. Terá sido por este motivo que o emblemático edifício da Rua Cinco de Outubro ficou numa “situação grave” e num “mau estado de conservação”, ficando praticamente abandonado. Umas das consequências foi a destruição da fachada, em 2014, que as autoridades entendem ter acontecido de uma forma que não foi natural e ilegal. O “desaparecimento” da fachada foi especialmente importante, porque serviu para justificar a perda do valor arquitectónico do edifício e a demolição completa. Ao mesmo tempo que os proprietários negligenciavam o imóvel, o mesmo acontecia com o IC, que segundo o CCAC, em vez de instaurar um processo para proteger o edifício, manteve uma postura passiva. “Não se viu que o mesmo serviço (IC) tenha cumprido, de forma independente e autónoma, o disposto no regime jurídico de salvaguarda do património cultural vigente da altura, não tendo o mesmo instaurado, de forma independente, um processo relativo à protecção e preservação do Restaurante Lok Kok”, acusou o CCAC. “Este comportamento passivo da altura coloca indubitavelmente em causa o nível de empenho e a rigorosidade do cumprimento do regime jurídico de salvaguarda do património cultural por parte daquele serviço”, acrescentou no relatório. A investigação concluiu também que com a actual lei de Salvaguarda do Património Cultural, o IC devia ter imposto imediatamente uma sanção administrativa ao proprietário, devido à não conservação do edifício. Entretanto, o processo prescreveu. Tudo mal, tudo legal Apesar de criticar o IC, o CCAC nega que tenha existido qualquer crime no processo de demolição do que restava do edifício, após a queda da fachada. Segundo a lei de salvaguarda do património, qualquer “demolição de edifícios de interesse arquitectónico deve ser precedida de um trâmite conhecido como ‘trilogia’ de procedimento”. Esta trilogia inclui o parecer do IC, a auscultação do Conselho do Património Cultural e despacho do Chefe do Executivo. No entanto, este procedimento não foi seguido no âmbito das obras de demolição. E bem, para o CCAC, uma vez que do edifício já tinha sido arrancada a fachada, o elemento com maior valor digno de protecção: “Uma vez que foi reconhecido que as obras de demolição e remoção solicitadas pelo proprietário envolviam apenas os restantes componentes residuais após o desabamento total da fachada, considerou-se não ser necessário iniciar o referido procedimento de ‘trilogia’”, foi explicado. “O CCAC considera que é compreensível a referida decisão do IC e que não se verificou qualquer ilegalidade ou irregularidade administrativa no processo acima referido”, foi apontado. Também a DSSOPT é alvo de críticas: “Após a entrada em vigor da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural, não se verificou que os serviços de obras públicas tivessem cumprido efectivamente os seus poderes específicos e o poder sancionatório administrativo inerentes à demolição ilegal do bem imóvel classificado do Restaurante Lok Kok, nem que tivessem cumprido o dever de denúncia”, foi apontado pelo CCAC. O organismo liderado por Chan Tsz King entende assim que “no trabalho de salvaguarda do património cultural do Restaurante Lok Kok, a então DSSOPT actuou de forma relativamente passiva e negativa quanto à implementação da nova Lei de Salvaguarda do Património Cultural”. Recorde-se que dois dos últimos dirigentes da DSSOPT, Jaime Carion e Li Canfeng, estão actualmente a ser julgados num mega processo de corrupção que envolve vários empresários ligados à construção civil.