Eutanásia VS homicídio (I)

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Um réu foi condenado a 12 meses de liberdade condicional, depois de ter sido responsável pela morte de uma pessoa. Esta sentença parece-lhe demasiado leve?

Recentemente, no julgamento de um caso de homicídio em Hong Kong, o réu era o viúvo da suposta vítima. Estavam casados há 30 anos e eram muito ligados. Em 2018, a mulher foi diagnosticada com um cancro em fase terminal e o marido deixou o emprego para se dedicar exclusivamente a tratar da esposa. Em 2020, os médicos informaram-no que ela teria muito pouco tempo de vida. As dores provocadas pela doença impediam-na de comer e de dormir.

Mesmo com doses duplas de morfina a dor não acalmava. Já não conseguia falar e limitava-se a expressar-se por acenos de cabeça. Finalmente, o marido perguntou-lhe se ela queria partir.

Segundo as notícias, em resposta a esta pergunta a mulher acenou afirmativamente por diversas vezes. Depois de ter massajado a esposa e conseguido que ela adormecesse, o marido calafetou a porta e as janelas do quarto, pôs carvão a queimar e dispôs escrituras Budistas. Mais tarde, chamou a polícia e declarou que tinha morto a mulher para que ela pudesse descansar em paz.

Para alguns, este foi um caso de homicídio premeditado. Inicialmente, a acusação queria que fosse julgado por assassinato, mas, após avaliação feita por dois psiquiatras, apercebeu-se que sofria de depressão grave motivada pela doença da esposa. A acusação, então, achou que estava “fora de si” quando matou a esposa e aceitou que fosse acusado de homicídio.

A lei de Hong Kong define assassinato como um acto que pretende deliberadamente causar a morte de outrem. O crime de homicídio subdivide-se em “homicídio voluntário” e “homicídio involuntário”. Este caso é claramente um “homicídio voluntário”. No homicídio involuntário não existe intenção de matar enquanto que no voluntário existe.

Embora existam sinais de homicídio voluntário, sabe-se que o marido sofria de uma grave depressão quando matou a esposa. Estava privado do pleno uso das suas faculdades mentais e não distinguia o certo do errado. Na ausência de “intenção de matar”, foi condenado a 12 meses de liberdade condicional, que se crê ser a pena mais leve de todos os casos de homicídio.

“Ordem de liberdade condicional ” significa que o réu não cumprirá pena de prisão, mas terá de se encontrar regularmente, durante o período em que a sentença estiver em vigor, com os assistentes sociais que seguem o seu caso e aceitar as condições estabelecidas. Se durante este período cometer algum crime, a liberdade condicional é suspensa e pode enfrentar uma pena de prisão, que vai variar consoante as circunstâncias do crime cometido.

Quando o juiz se pronunciou sobre este caso deixou claro que se tratava de uma “tragédia humana”. O único objectivo do marido ao cometer o crime era que a esposa tivesse uma morte pacífica sem sofrimento. Por isso, o caso deve ser abordado com compaixão. Para o público em geral, o homicídio é, afinal de contas, um crime grave que deve ser tratado com seriedade. Depois de pesar factores pessoais e factores de ordem pública, o juiz decidiu-se pela pena de liberdade condicional.

O incidente que temos diante de nós é um caso criminal e uma tragédia familiar. A mensagem que é passada à sociedade é que o homicídio é um crime e um acto errado, mas por trás deste acto errado encontra-se o grande amor que uniu o casal. Para que a mulher morresse sem dor, o marido dispôs-se a cometer um crime e a enfrentar uma pena de prisão. Mesmo enfrentando uma pena de prisão perpétua, não hesitou em aliviar a mulher do sofrimento que a afligia. É uma prova de que era totalmente dedicado à esposa. A mulher acenou num consentimento, indicando que compreendia a intenção do marido. Os dois estavam em harmonia, o afecto que os unia era interminável, que é coisa que os casais que se divorciam por qualquer desavença não podem compreender.

Como observadores, esperamos que o marido recupere o mais rapidamente possível e se habitue à vida solitária que o espera. Esperamos também que ele compreenda que a sua mulher vive agora noutro mundo. Também esperamos que a mulher possa recomeçar uma vida melhor no outro mundo.

Numa entrevista, o marido sublinhou que faz falta em Hong Kong uma lei sobre a eutanásia. Quais são as normais legais do sistema? Iremos analisá-las na coluna da próxima semana e iremos também analisar a situação da eutanásia no mundo, incluindo em Macau. Portanto, até à próxima semana.

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

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