Empregadas | Mais de 100 impedidas de trabalhar estão “a morrer à fome”

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Desde o início do surto, a União Progressista dos Trabalhadores Domésticos de Macau recebeu mais de 100 pedidos de ajuda de empregadas domésticas, impedidas de trabalhar pelos empregadores, que estão a lutar pela sobrevivência. O confinamento parcial precipitou a discriminação e situações em que são obrigadas a dormir no chão ou a trabalhar em zonas vermelhas

 

A presidente União Progressista dos Trabalhadores Domésticos de Macau, Jassy Santos, revelou que, desde o início do actual surto de covid-19 em Macau, já recebeu mais de 100 pedidos de ajuda de empregadas domésticas impedidas de trabalhar pelos empregadores devido ao medo de contágio, e que estão neste momento a lutar para sobreviver, dado terem deixado de receber salário.

“Recebemos mais de 100 queixas de pessoas que estão a morrer à fome porque estão impedidas pelos empregadores de ir trabalhar e, por isso, não recebem salário”, começou por dizer ao HM. “Mais de 100 pessoas nesta situação ligaram-me a dizer que estão em casa e já não têm comida. O Governo devia prestar atenção a este aspecto. Estão a dizer para as empregadas ficarem em casa, mas, por favor, nós também somos seres humanos, também precisamos de dinheiro para comer e assegurar a nossa subsistência”, acrescentou.

Recorde-se que, adicionalmente, após o anúncio do confinamento parcial de Macau, que suspendeu as actividades essenciais do território, o secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong sublinhou que os empregadores ficaram legalmente dispensados de pagar salários, com os funcionários a ficarem de licença sem vencimento, ou a gozar férias.

Além disso, o facto de o Governo ter lançado apelos sucessivos para que os patrões permitam às empregadas domésticas pernoitar na sua casa, dado que representam um “risco” elevado em termos de transmissão da doença por coabitarem com “muitas pessoas”, tem levado, segundo a responsável, a casos de discriminação e a que muitas trabalhadoras sejam obrigadas a ficar em casa dos empregadores sem tenham as mínimas condições para tal.

“Desde o início do confinamento, a situação está a ser muito difícil porque o Governo está a dizer para pernoitarmos em casa dos empregadores. Mas, muitas vezes, não há espaço suficiente para isso acontecer. Isto faz com que muitas empregadas domésticas acabem por ter que dormir sem condições, no chão, no sofá ou até mesmo na cozinha dessas casas”, apontou.

Também Nedie Taberdo Palcon, líder da Green Philippines Migrant Workers Union, refere ter recebido cerca de duas dezenas de queixas de empregadas domésticas que se encontram a viver em casa dos patrões em más condições, forçadas a comer “os restos do jantar” ou a ter de esperar que estes desocupem a sala-de-estar para finalmente poderem dormir e gozar do tempo de descanso a que têm direito.

Em relação ao apelo do Governo para que as empregadas pernoitem em casa dos patrões, ambas as responsáveis, consideram tratar-se de “uma boa ideia”, na medida em que, a acontecer, é um garante da manutenção dos postos de trabalho e dos rendimentos das trabalhadoras.

Contudo, Jassy Santos considera que nos últimos dias, as empregadas domésticas têm “sentido especial discriminação”. “As empregadas domésticas são o único alvo. Porque é que fazem isto apenas connosco?”, lamentou.

Linhas vermelhas

Ao HM, Jassy Santos relata ainda casos em que empregadas domésticas foram obrigadas a ir trabalhar em residências localizadas em edifícios classificados como zonas vermelhas e critica o facto de os empregadores não se preocuparem “minimamente” com o estado de saúde ou os receios das trabalhadoras.

“Recebi um pedido de ajuda de uma empregada doméstica que foi obrigada pelo empregador a ir trabalhar, apesar de a residência dele ter sido classificada como zona vermelha. Apesar de ela ter ligado a dizer que a fracção estava num edifício classificado como zona vermelha, o empregador disse apenas, ‘vem e trabalha’”, partilhou. “O empregador não quis aceitar que o edifício onde vive tinha sido classificado como zona vermelha e era suposto dizer à empregada para não ir trabalhar. A verdade é que os empregadores não se preocupam minimamente com a situação ou estado de saúde das empregadas domésticas”, disse.

Entre as soluções apresentadas, ambas as responsáveis consideram que o Governo deve tomar a iniciativa de incentivar os empregadores a continuar a pagar salários, mesmo que não estejam a trabalhar.

Nedie Palcon, cuja associação está neste momento a albergar três trabalhadoras que ficaram sem tecto, defende ainda que o Governo deve criar um abrigo temporário para as empregadas domésticas, que não têm condições para ficar em casa dos patrões, pernoitarem.

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