Alterações climáticas 2022 – Mitigação das alterações climáticas

Foi dado a conhecer, em conferência de imprensa datada de 4 de abril de 2022, o conteúdo do relatório do Grupo de Trabalho III do IPCC, cujo resumo para os decisores políticos se intitula “Alterações Climáticas 2022: Mitigação das Alterações Climáticas” (Climate Change 2022: Mitigation of climate change). Ficou, assim, completa a missão dos três grupos de trabalho, no que se refere à elaboração do Sexto Relatório de Avaliação (AR6) das Alterações Climáticas, estando previsto para setembro de 2022 a publicação do Relatório Síntese (AR6 Synthesis Report – SYR), o qual constará de um resumo dos relatórios dos três Grupos de Trabalho e dos três relatórios especiais elaborados no sexto ciclo de avaliação das alterações climáticas.

Esta parte do Sexto Relatório de Avaliação reflete não só as novas conclusões constantes nos vários trabalhos dos cientistas que colaboram com o IPCC, mas também a contribuição do Grupo de Trabalho III para o Quinto Relatório de Avaliação (AR5), e as dos Grupos de trabalho I e II para o AR6, assim como dos três relatórios especiais.

Além dos 6 relatórios regulares, que foram publicados com um intervalo aproximado de seis anos, o IPCC elaborou três outros relatórios especiais, sobre assuntos específicos: “Aquecimento Global de 1,5 °C” (2018), que trata dos impactos do aquecimento global de 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais; “Alterações Climáticas e o Solo” (2019), sobre alterações climáticas, desertificação, degradação e gestão sustentável dos solos; “Oceano e Criosfera num Clima em Mudança” (2019), sobre os efeitos das alterações climáticas nos mares, gelo marítimo e calotas polares.

Na elaboração desta parte do AR6 estiveram envolvidos 869 especialistas de 65 países, entre os quais se contam autores, coordenadores e revisores. Foram consultados, ao todo, cerca de 18 000 trabalhos na área das alterações climáticas.

Nas edições do “Hoje Macau” de 15 e 16 de setembro de 2021 e 7 de abril de 2022, tivemos a oportunidade de abordar as contribuições, para o AR6, dos grupos de trabalho I (“Física como ciência base”) e II (“Impactos, adaptação e vulnerabilidade”). Falta agora debruçarmo-nos sobre o relatório do Grupo de Trabalho III – “Mitigação das Alterações Climáticas”.

Esta parte do AR6, além da “Introdução e Enquadramento”, consta essencialmente de quatro partes: “Desenvolvimentos recentes e tendências atuais”; “Transformações do sistema para limitar o aquecimento global”; “Ligações entre mitigação, adaptação e desenvolvimento sustentável” e “Fortalecimento da resposta às alterações climáticas”.

Entre as conclusões do GT III, no que se refere a desenvolvimentos recentes e tendências atuais, realça-se que a média anual das emissões antropogénicas de gases de efeito de estufa (GEE) continuaram a aumentar na década 2010-2019, tendo as áreas urbanas contribuído grandemente para esse efeito. Houve, no entanto, uma diminuição da taxa de crescimento dessas emissões em relação à década anterior. Por outro lado, têm vindo a diminuir significativamente os preços, cerca de 85%, dos custos das energias solar e eólica, assim como das baterias, o que constitui um incentivo para o investimento na área das energias renováveis. Também se verifica que cada vez mais governos têm legislado no sentido da diminuição da taxa de desflorestação, do aumento da eficiência energética e sobre o desenvolvimento das energias renováveis.

Porém, na prática, nem sempre esta legislação tem sido aplicada de maneira eficiente. Também se antevê que as emissões globais dos GEE, de acordo com o estipulado nas NDCs anunciadas antes da COP26 (2021), implicariam um provável aquecimento superior a 1,5 °C até ao fim do século XXI, e que a provável limitação do aquecimento abaixo de 2 °C dependeria de uma rápida aceleração dos esforços de mitigação. (Entende-se por NDCs – Nationally Dertermined Contributions – os planos que constam das ações previstas para a redução das emissões dos GEE e medidas de adaptação às alterações climáticas, como contributo nacional para se atingir as metas globais estabelecidas no Acordo de Paris).

Na parte referente a “Transformações do sistema para limitar o aquecimento global”, prevê-se que é superior a 50% a probabilidade de que as emissões globais de GEE atinjam o pico antes de 2025, com base em projeções obtidas com modelos que limitam, até ao fim do século XXI, o aquecimento global a 1,5 °C. A probabilidade de se atingir o pico de emissões antes de 2025 passará a ser superior a 67%, de acordo com os resultados dos modelos que limitam o aquecimento global a 2 °C. Também se antevê que, sem um fortalecimento das políticas além das implementadas até o final de 2020, as emissões de GEE podem aumentar para além de 2025, levando a um aquecimento global médio de 3,2 °C até ao fim do século XXI. (Note-se que o aquecimento global tem como referência a temperatura média global entre 1850 e 1900).

Na parte referente a “Ligações entre mitigação, adaptação e desenvolvimento sustentável”, constata-se que as ações significativas tendo em vista a mitigação e adaptação aos impactos das alterações climáticas são fundamentais para o desenvolvimento sustentável. Os objetivos estipulados na Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável, deverão ser usados como base para avaliar a ação climática no contexto da sustentabilidade.

Note-se que o objetivo nº 13 desta Agenda consiste em “Tomar medidas urgentes no combate às alterações climáticas e seus impactos” (Goal 13 – Take urgent action to combat climate change and its impacts). Constata-se também que existe uma forte ligação entre desenvolvimento sustentável, vulnerabilidade e riscos climáticos, e que, recursos económicos, sociais e institucionais limitados implicam frequentemente grande vulnerabilidade e pouca capacidade adaptativa, especialmente em países em desenvolvimento.

Na parte do relatório do Grupo de Trabalho III dedicada ao “Fortalecimento da resposta às alterações climáticas” é realçado que a cooperação internacional é essencial para que se possa alcançar uma atenuação significativa das alterações climáticas, e que os governos têm vindo a tomar, embora com algumas lacunas, medidas preconizadas nos vários acordos e protocolos assinados sob os auspícios da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações climáticas (United Nations Framework Convention on Climate Change – UNFCCC), nomeadamente o Protocolo de Quioto (2005), Acordo de Paris (2015) e Pacto sobre o Clima de Glasgow (2021). Fora da UNFCCC têm surgido parcerias entre instituições e iniciativas à escala regional, por vezes com alguma eficácia, envolvendo múltiplos intervenientes.

Terminados os relatórios dos Grupos de Trabalho I, II e III do IPCC, e para que esteja completo o Sexto Relatório de Avaliação, resta esperar pelo Relatório Síntese, que deverá conter uma parte dedicada aos decisores políticos, escrita em linguagem não técnica, em que será abordada uma vasta gama de políticas relevantes, com o intuito final de se alcançar o objetivo principal do Acordo de Paris, reiterado no Pacto sobre o Clima de Glasgow, ou seja, manter, até 2100, o aumento da temperatura inferior a 2 ºC, tendo como referência os valores pré-industriais, e incentivar esforços para limitar o aumento a 1,5 ºC.

Partindo do princípio de que as alterações climáticas são consequência de mais de um século de emissões de GEE devido ao uso insustentável de energia, estilos de vida e padrões de produção e de consumo, o IPCC, através dos seus grupos de trabalho, continuará a utilizar a Física como ciência base para a compreensão do mecanismo das alterações climáticas e a preconizar a implementação de medidas de adaptação e de atenuação dos efeitos dos GEE.

Também nós, como cidadãos comuns, teremos de adaptar o nosso estilo de vida de modo a que possamos contribuir para atingir os objetivos de desenvolvimento sustentável, conforme o preconizado na Agenda 2030 das Nações Unidas.

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