Estafetas

No passado dia 8, ocorreu um acidente fatal em Macau. Um motociclo chocou com um autocarro de turistas, do que resultou a morte do motociclista. O motociclista trabalhava como estafeta numa empresa de entregas de comida.

Depois do acidente, várias pessoas defenderam que Macau deveria adoptar a regulamentação em vigor na China continental, consagrada no – “Guia sobre a implementação da responsabilidade das plataformas de catering online e da protecção eficaz dos direitos e interesses dos motoristas de entrega de alimentos”, a fim de realizar uma gestão abrangente e unificada do serviço de entrega de alimentos em Macau.

Após o aparecimento da epidemia, o número de turistas em Macau reduziu significativamente, o que teve como resultado uma diminuição das receitas do Governo, provenientes das taxas sobre a indústria do jogo. Além disso, as salas VIP dos casinos foram fechando umas atrás das outras. As pessoas que trabalhavam nos casinos foram obrigadas a procurar outras ocupações. Era o caso deste motociclista vítima do acidente, o que reflecte o impacto social da pandemia na primeira indústria de Macau.

Os estafetas recebem em função das entregas que fazem. Este sistema assenta no princípio “quanto mais trabalhares, mais recebes”. Portanto, vê-se com frequência estafetas a conduzirem a alta velocidade. Muitas vezes passam entre dois carros. Além disso, no dia do acidente tinha chovido, o que adicionou mais um factor de risco à condução.

Com o advento deste fenómeno social, não é surpreendente que haja quem defenda que se devem criar leis que regulem o sector das entregas de comida. Mas antes da lei está a política social. Quando o Governo elabora uma política social, tem de perceber primeiro de que é que a sociedade precisa. Assim sendo, temos de saber em primeiro lugar quantos estafetas trabalham em Macau presentemente, como é que eles e as empresas de entrega de comida operam e quais os problemas laborais. Que questões sociais que preocupam a sociedade de Macau, e porquê. Se precisarmos de delinear uma política social, qual será o seu foco? Depois de esta política estar elaborada, é preciso pensar na elaboração da lei que conduza à sua aplicação. Só depois de todas estas questões serem consideradas se pode tomar uma decisão sobre o que fazer.

Do ponto de vista da administração pública, o Governo leva tempo a elaborar uma política social. Actualmente, devido à pandemia, o número de pessoas que usam plataformas online para encomendar comida aumenta de dia para dia, e como tal o número de estafetas não vai diminuir nos tempos mais próximos, por isso a sociedade precisa em primeiro lugar de usar os recursos de que dispõe para lidar com os problemas que enfrenta. Neste caso, o mais importante de tudo é resolver os problemas de segurança dos estafetas, para que possam ser evitadas mais tragédias, e depois disso pensar na elaboração das políticas sociais e da legislação.

O primeiro nível de protecção decorre da segurança na estrada. Para os estafetas, trata-se também de segurança no trabalho. A consciencialização para a segurança é a melhor garantia. Só temos uma vida. Os estafetas não podem ver-se obrigados a conduzir rapidamente só porque o seu salário depende do número de entregas. Os estafetas também têm de ter cuidado com a condução, não podem mudar de faixa constantemente sem ter em atenção o trânsito. Devem igualmente ser proibidos de andar entre dois carros.

Os outros condutores também precisam de ter uma atitude civilizada e não devem acelerar. Todos se devem lembrar que a estrada é usada pela população e só quando todos estão protegidos é que existe verdadeira segurança.

O Governo deve considerar abordar este aspecto em primeiro lugar. De momento, deve apostar mais na segurança rodoviária, aumentar a consciencialização sobre segurança junto de todos utilizadores das estradas, (condutores e estafetas), para que sejam evitados acidentes de trânsito. Não serão apenas os estafetas a beneficiar destas medidas, mas sim toda a comunidade.

Em segundo lugar, é sabido que os estafetas se deslocam em motociclos. Estes veículos precisam de um seguro contra terceiros, que assegura que em caso de acidente a parte lesada pode pedir uma indemnização à companhia de seguros. O seguro contra terceiros é o requisito legal mínimo. As empresas de entrega de comida devem considerar comprar o pacote completo e não apenas o seguro contra terceiros. Em caso de acidente, a parte lesada pode ser indemnizada pela companhia de seguros e o estafeta também pode receber uma compensação. Claro que esta opção tem a desvantagem de implicar o aumento dos custos do seguro.

Em terceiro lugar, os estafetas são obrigados a passar o dia a conduzir motocicletas. Este trabalho acarreta sempre riscos. Por isso, deviam considerar fazer um seguro de vida. Em caso de acontecer um acidente fatal, a família receberia uma compensação da companhia de seguros que poderia ajudar a aliviar a pressão económica por algum tempo.

Só quando todos os utentes das estradas se sentirem em segurança poderemos construir uma sociedade despreocupada e evitar que as tragédias se repitam.

 

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado da Escola Superior de Ciências de Gestão/ Instituto Politécnico de Macau
Blog: http://blog.xuite.net/legalpublications/hkblog
Email: legalpublicationsreaders@yahoo.com.hk

Subscrever
Notifique-me de
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Ver todos os comentários