Manchete PolíticaAssembleia Legislativa | Governo anuncia descida do desemprego e é criticado João Santos Filipe e Salomé Fernandes - 29 Jan 202129 Jan 2021 Operários e democratas criticaram a política governativa que aproveitou a aprovação do salário mínimo universal, em Abril do ano passado, para extinguir um mecanismo de compensação por lay-off As licenças sem vencimento e a redução dos ordenados dos trabalhadores marcaram o debate de ontem na Assembleia Legislativa. O secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, foi ao hemiciclo anunciar que a taxa de desemprego tinha sido reduzida para 3,8 por cento, mas acabou acusado de ter deixado os trabalhadores desprotegidos. Em causa esteve a eliminação da lei que obrigava os empregadores a compensarem os empregados nas situações de licenças sem vencimento. Foi na segunda intervenção do dia, quando apontou que a recuperação vai demorar mas que há sinais positivos, que o secretário adiantou os números do desemprego, que mostram uma “melhoria”. “Amanhã [hoje] vai ser divulgada a taxa de desemprego. Antes era de 4 por cento, mas baixou para 3,8 por cento, segundo o valor mais actualizado. São menos 0,2 por cento. Claro que o número não é ideal, mas houve uma melhoria e podemos que se estende à situação económica e do emprego”, defendeu Lei Wai Nong. No entanto, houve deputados que se mostraram mais preocupados com os números do subemprego, ou seja dos trabalhadores que estão a gozar de licenças sem vencimento forçadas ou que trabalham com horário reduzido, medidas que resultam em reduções salariais indirectas. Operários mostram as garras Um dos grupos mais activos nestas críticas foi da Federação das Associações dos Operários de Macau, através de intervenções de Ella Lei e de Lei Cheng U.“A DSAL [Direcção de Serviços para os Assuntos Laborais] apresentou alguns dados que mostram que muitos trabalhadores não estão desempregados. Porém, estão numa situação de subemprego e os seus salários tiveram cortes. É do nosso conhecimento que há muitas situações em que os trabalhadores só podem trabalhar alguns dias por mês e há mesmo quem nem sequer esteja a trabalhar, devido a licenças sem vencimento forçadas”, começou por criticar Ella Lei. Momentos depois, Lei Chan U abriu a caixa de Pandora com críticas ao Executivo por ter revogado a lei de 1995 que exigia que as licenças sem vencimento fossem pagas. Esta protecção foi eliminada em Abril do ano passado, com aval da maioria da Assembleia Legislativa, na ocasião em que o Executivo criou o ordenado mínimo universal. “A licença sem vencimento não está prevista na lei. Os trabalhadores muitas vezes não tiram as licenças sem vencimento por sua vontade, tiram porque, se recusarem, podem ficar desempregados”, criticou Lei Chan U. Palavras leva-as o vento Quando foi questionado sobre os dados das licenças sem vencimento, o secretário remeteu a resposta para o director da DSAL, Wong Chi Hong. Presente no hemiciclo, o responsável admitiu que o Governo apenas recebeu notificações que envolvem 160 trabalhadores. Por outro lado, a DSAL apenas recebeu uma queixa por suspensão forçada do contrato, que acabou arquivada. Ao mesmo tempo, Wong reconheceu que as empresas não estão obrigadas a comunicar quando o regime é aplicado e que, caso os trabalhadores recusem licenças sem vencimento, podem ser despedidos, desde que sejam compensados por despedimento sem justa causa. Foram estes dados que despoletaram novas críticas devido à eliminação do mecanismo de protecção dos trabalhadores contra licenças sem vencimento forçados. O mote veio de Ella Lei: “Dissemos [em Abril do ano passado] que a situação das licenças sem vencimento ia acontecer e aconteceu. E sabe porque é que a DSAL recebe pouca queixas? Porque os trabalhadores querem ultrapassar o problema com os patrões”, destacou. “Só que passa um mês, dois e três e está quase a fazer um ano que as coisas se arrastam. Os trabalhadores não sabem o que fazer. Será que não está na hora de reverem a lei das relações laborais e tomar a iniciativa de colmatar o mecanismo que foi revogado?”, questionou. Democratas no mesmo barco Os democratas Au Kam San e Sulu Sou juntaram-se às críticas e também defenderam a revisão da lei. Au lembrou a discussão na AL da criação de um salário mínimo universal e acusou o Executivo de ter criado um mito, quando defendeu que a revogação do mecanismo de protecção não ia enfraquecer a protecção do sector laboral. “O Governo disse que, em caso de suspensão do contrato, os trabalhadores estariam protegidos. Agora vê-se que era apenas um mito. As licenças sem vencimento vieram mostrar que é evidente que os trabalhadores ficaram menos protegidos”, considerou. “Agora há trabalhadores que querem trabalhar, mas são forçados a tirar 20 dias de lay-off por mês. É uma situação muito triste”, atirou. Por sua vez Sulu Sou recordou que houve oito votos contra o fim do mecanismo de protecção e criticou os números da DSAL. “Em Abril houve oito votos contra a revogação. Só que o Governo insistiu em revogar o decreto-lei e agora vai ter de tomar medidas para remediar a situação”, afirmou. “A DSAL disse que só houve uma queixa por lay-off forçado… É ridículo. É uma brincadeira”, sublinhou. Em defesa do Governo interveio o deputado Mak Soi Kun, ligado à comunidade de Jiangmen. “Se ainda houvesse a lei que exigia o pagamento por suspensão do trabalho, muitas pequenas e médias empresas tinham fechado as portas […] A economia de Macau é constituída em 80 por cento por PMEs que não seriam capazes de sobreviver caso tivessem de pagar aos trabalhadores pela suspensão do contrato”. Apesar das críticas, o debate terminou sem um compromisso do Executivo com a revisão da lei e ainda com Wong Chi Hong a considerar que os trabalhadores estão protegidos, uma vez que há um ordenado mínimo em vigor. Jack Ma foi exemplo para alterar lei de contratação O deputado José Chui Sai Peng defendeu a necessidade de alterar o regime para a contratação de quadros qualificados e exemplificou que a necessidade de residir 180 dias por ano em Macau afasta potenciais interessados. “É complicado atrair quadros de grandes empresas quando se exige às pessoas que fiquem 180 dias em Macau para terem residência. Por exemplo, se formos a ver o empresário Jack Ma, eu tenho dúvidas que ele inclusive permaneça 180 dias por ano no Interior da China”, afirmou o deputado, quando abordou a questão. Na resposta a esse assunto, o secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, admitiu a possibilidade desse requisito ser alterada. “Espero que possamos criar novas medidas para ajustar a nossa política para quadros qualificados. Temos de pensar sobre essa exigência de 180 dias e se vamos ou não alterar esse aspecto. Creio que a Comissão de Desenvolvimento de Talentos vai estudar a questão”, indicou. Em termos da política fiscal para os quadros qualificados, Lei considerou que a actual é bastante competitiva. “O imposto profissional que os quadros qualificados pagam é relativamente baixo (…). Creio que, se calhar, a política fiscal de Macau é a melhor da Ásia, ou a mais favorável da Ásia”, sustentou.