Prémio Sakharov | Distinção de Ilham Tohti ilustra pressão internacional

A questão dos abusos sobre a minoria ética uigur, em Xinjiang, volta a estar na ribalta após o professor de economia Ilham Tohti, condenado a prisão perpétua acusado de separatismo, ter sido distinguido pelo Parlamento Europeu com o Prémio Sakharov

 

[dropcap]I[/dropcap]lham Tohti, que foi ontem distinguido pelo Parlamento Europeu com o Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento, denunciou nas últimas décadas os abusos sofridos pela minoria étnica chinesa uigur no extremo noroeste da China.

Tohti, que era professor de Economia numa universidade de Pequim, até ter sido condenado à prisão perpétua por separatismo, em 2014, começou a escrever sobre as tensões e os abusos na região de Xinjiang nos anos 1990.

Com uma área quase 18 vezes superior à de Portugal e situada na fronteira com o Paquistão, Afeganistão e várias ex-repúblicas soviéticas da Ásia Central, Xinjiang é uma região rica em petróleo e gás natural, mas com reduzida densidade populacional.

Os uigures constituem mais de um terço dos seus 21 milhões de habitantes.
“Em textos e palestras, Ilham destacava as políticas do Governo que limitam o uso da língua uigur, restringem a capacidade dos uigures de praticar a sua própria religião, bloqueiam as suas possibilidades de conseguir um emprego e encorajam a migração dos Han para a região”, descreveu a Amnistia Internacional.

A República Popular da China – o país mais populoso do mundo, com cerca de 1.400 milhões de habitantes – define-se como “uma nação multiétnica”, formada por 56 etnias. Como os Han constituem cerca de 92% do conjunto, as outras são minorias étnicas.

Impedido pela censura chinesa de difundir o seu trabalho, o escritor criou o portal em chinês uighurbiz.net, que denunciava abusos dos direitos humanos sofridos pelos uigures.

O portal foi bloqueado pelas autoridades chinesas por várias vezes: primeiro antes dos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008, e depois entre Março e Abril do ano seguinte.

Depois de, em 2009, a capital de Xinjiang, Urumqi, ter sido o palco dos mais violentos conflitos étnicos registados nas últimas décadas na China, entre os uigures e os han, predominantes em cargos de poder político e empresarial regional, Tohti denunciou casos de uigures que foram presos, mortos ou desapareceram.

Na sequência daquele caso, o intelectual chinês ficou detido por várias semanas.
“O principal conflito em Xinjiang não se deve ao terrorismo ou ao contraterrorismo, mas antes à desigualdade e abuso de poder”, acusou Tohti, na altura. “Trata-se antes de como poderosos interesses instalados monopolizam os recursos do desenvolvimento”, descreveu.

Prisão perpétua

Em 15 de Janeiro de 2014, Ilham Tohti foi levado da sua casa em Pequim pela polícia.
Durante cinco meses, permaneceu incontactável e em local incerto, até que, em 23 de Setembro, foi condenado à prisão perpétua por “separatismo”.

Acusações de separatismo na China são frequentemente usadas pelas autoridades para suprimir críticas às políticas do Governo. Pequim considera que qualquer crítica às suas políticas étnicas visa promover disfarçadamente ideias separatistas.

“Embora Ilham se opusesse abertamente ao separatismo e quisesse apenas mostrar como as políticas de Pequim estavam a alimentar a polarização étnica, o governo concluiu que o seu trabalho estava a lançar muita luz sobre a terrível situação dos uigures”, descreveu a Amnistia Internacional.

Campos de reeducação

A distinção atribuída pelo Parlamento Europeu ilustra também a crescente pressão diplomática que Pequim enfrenta, devido às acusações de que mantém detidos cerca de um milhão de uigures em centros de doutrinação política em Xinjiang.

Antigos detidos revelaram que foram forçados a criticar o islão e a sua própria cultura e a jurar lealdade ao Partido Comunista Chinês (PCC), num reminiscente da Revolução Cultural (1966-1976), lançada pelo fundador da República Popular da China, Mao Zedong.

O Governo chinês, que primeiro negou a existência destes campos, afirmou, entretanto, tratar-se de centros de formação vocacional que visam integrar os uigures na sociedade.

Habitualmente, o presidente de cada governo regional pertence à mais importante minoria étnica da região, mas o líder da organização local do Partido Comunista – a verdadeira sede do poder político – costuma ser de etnia Han.

O actual secretário em Xinjiang, Chen Quanguo, é conhecido pelas políticas duras que promulgou anteriormente, enquanto ocupou o mesmo cargo no Tibete, outra região chinesa vulnerável ao separatismo.

Desde que, em 2016, foi transferido para o Xinjiang, a região converteu-se num Estado policial, com pontos de controlo policial e câmaras de circuito fechado, equipadas com reconhecimento facial, a tornarem-se omnipresentes.

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