SociedadeMais de duzentas pessoas em Macau lembraram vítimas de Tiananmen 30 anos depois Hoje Macau - 5 Jun 2019 [dropcap]T[/dropcap]rinta anos depois do massacre de Tiananmen, mais de duzentas pessoas em Macau lembraram ontem as vítimas e disseram à Lusa temer que no futuro não possam fazer esta homenagem, que é silenciada e proibida na China continental. Entre as 19:30 e as 22:00 em Macau manifestantes e turistas foram-se juntando em frente a um palco onde os organizadores passaram filmagem dos acontecimentos de há 30 anos em Pequim. Muitos dos manifestantes sentaram-se no chão e ergueram velas em memória às vítimas que o Governo Central nunca admitiu. A vigília decorreu de forma pacífica no Largo do Senado, uma das maiores praças de Macau e um dos principais pontos turísticos do território, apesar de alguns momentos de tensão entre a organização e as forças de segurança, quando a polícia fez dois corredores de segurança para, segundo as autoridades, facilitarem a passagem às pessoas. “Nós estamos muito preocupados, todos os anos receamos que possa ser o último ano” que há vigília em Macau, contou à Lusa o deputado pró-democracia Sulu Sou, frisando que o território deve “cuidar da sua liberdade” e lembrou de seguida uma frase do famoso escritor checo Milan Kundera: “a luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento”. Em 1989, em Pequim, o exército chinês avançou com tanques para dispersar protestos pacíficos liderados por estudantes, causando um número de mortos nunca oficialmente assumido. Algumas estimativas apontam para milhares de mortos. “O sentimento de que há direitos humanos é muito fraco no Governo” de Macau, disse o mais jovem deputado do território, que deu como exemplo que as autoridades “utilizam as razões de segurança pública para restringir, ou mesmo banir, as pessoas de praticarem os seus direitos de se manifestarem”. Manifestantes questionados pela Lusa, a maioria deles estudantes universitários, apontaram que o sentimento que têm é que para já se sentem seguros em exercerem os seus direitos, porque existe liberdade de expressão e liberdade de imprensa no território, mas temem o que pode acontecer daqui a 30 anos (quando terminar o período de transição) ou mesmo antes disso. Um dos organizadores da vigília, Luís Leong, disse à Lusa, enquanto distribuía jornais alusivos aos acontecimentos de Tiananmen, que as pessoas que foram à manifestação “desde os mais velhos aos mais novos, sabem que em Pequim se lutou pela democracia há 30 anos”. “Espero que mais jovens se comecem a preocupar com a justiça social e com a sociedade”, apontou, sublinhando que irá continuar a organizar “esta vigília e a honrar a memória das vítimas até que o Governo Central peça desculpa”. Também presente na vigília, o advogado português Jorge Menezes, que defendeu Sulu Sou de um crime de desobediência qualificada enquanto participava numa manifestação em 2016, afirmou à Lusa que “não era possível haver uma manifestação destas na República Popular da China”, mas que em Macau, apesar de tudo, “ainda é possível”. “No entanto o que nós sentimos é que há valores fundamentais”, no Estado de Direito, “que estão lentamente, não sei se a desmoronar, mas a enfraquecer”, afirmou, numa alusão às crescestes políticas de acelerar a integração do ex-território administrado por Portugal nas estratégias definidas por Pequim. Macau e Hong Kong são os dois únicos locais da China onde Tiananmen pode ser publicamente recordado e nas duas cidades realizam-se anualmente vigílias para lembrar as vítimas do massacre. A fórmula ‘um país, dois sistemas’ serviu para a integração de Hong Kong e Macau na República Popular da China, em 1997 e em 1999, respectivamente, com o estatuto de regiões administrativas especiais, e garante que as políticas socialistas em vigor no resto da China não se aplicam nos territórios, que gozam de “um alto grau de autonomia”, à excepção da Defesa e das Relações Externas, que são da competência exclusiva do Governo Central chinês.