O mais eminente concerto para piano jamais escrito

[dropcap]O[/dropcap] compositor, pianista e maestro russo Sergei Rachmaninoff (1873-1943) foi um dos últimos grandes expoentes do período Romântico na música clássica europeia e é tido como um dos pianistas mais influentes do Século XX.

O total fracasso da sua Primeira Sinfonia, composta entre Janeiro e Outubro de 1895, e estreada apenas no dia 27 de Março de 1897, em S. Petersburgo, esmagou o compositor psicologicamente, causando um hiato de três anos na sua carreira de composição. A obra foi muito mal recebida pelo público e mesmo ridicularizada pela crítica, liderada pelo famoso compositor e crítico musical russo César Cui, membro do célebre Grupo dos Cinco. Pensa-se que este desastre deveu-se, em grande parte, à fraca preparação da orquestra e do seu maestro, o compositor Alexander Glazunov, conforme atestam vários testemunhos, entre os quais o de um outro compositor e maestro famoso na época, Alexander Khessin. A recepção desastrosa da sinfonia, combinada com a preocupação da objecção da Igreja Ortodoxa ao casamento com a sua prima, Natalia Satina, contribuiu para o colapso mental de Rachmaninoff, seguido de um período de profunda depressão.

Rachmaninoff escreveu pouca ou quase nenhuma música nos três anos seguintes, até iniciar, em Janeiro de 1900, um tratamento de hipnotismo com o psicólogo Nikolai Dahl, um especialista de Moscovo, por coincidência músico amador, que o fez recuperar rapidamente a auto-confiança.

Um importante resultado dessas sessões foi a composição do Concerto para Piano e Orquestra Nº 2 em Dó menor, Op. 18, encomendado por um empresário de Londres, que seria dedicado ao Dr. Dahl, em reconhecimento da recuperação do compositor. O Concerto foi composto entre 1900 e 1901. Durante uma viagem a Itália, Rachmaninoff completou o segundo e terceiro andamentos, que apresentou num concerto em Moscovo, com grande aclamação. Este sucesso deu-lhe confiança para concluir o primeiro andamento do concerto, que é frequentemente considerado o mais eminente concerto para piano jamais escrito. A obra foi muito bem recebida na sua estreia no dia 27 de Outubro de 1901, em Moscovo, na qual foi solista o próprio Rachmaninoff, sob a direcção do seu primo Aleksandr Ziloti.

O Concerto para Piano e Orquestra n.º 2 em Dó menor, Op. 18 conferiu um sólido reconhecimento e fama a Rachmaninoff como compositor. A obra veio confirmar que o compositor estava completamente recuperado da depressão clínica e do bloqueio da escrita que o tinham impedido de compor. O longo período que Rachmaninoff demorou a recuperar não foi em vão: cada frase memorável, linha bombástica de violoncelo, e acorde de piano de peso é magnificamente colocado para criar uma verdadeira obra-prima musical. Melodia gloriosa após melodia gloriosa flui do teclado; o diálogo entre a orquestra e solista é divino. A música é ao mesmo tempo virtuosística e lírica, com o piano e a orquestra revezando-se para acariciar a pesada melodia russa. Com os acordes que soam como sinos no andamento de abertura, a serenidade dos arpejos no segundo e o impulso confiante do terceiro, é fácil presumir que esta peça foi obra de um compositor seguro e confiante, enquanto a verdade era muito diferente.

Após uma introdução invulgar que consiste numa série de acordes cada vez mais intensos e ricos do piano, a obra desvenda-se de maneira gratificante, cheia de maravilhosos diálogos entre piano e orquestra (sem duelos), melodias crescentes e refinadas reviravoltas de harmonias. Os compassos introdutórios do segundo andamento orientam habilmente o ouvinte da tonalidade de Dó menor do primeiro andamento para a de Mi Maior do segundo. Um nocturno nostálgico, e a introdução de duas cadências não quebra o clima reflexivo do andamento. Outra modulação hábil de Mi Maior para Dó Maior apresenta-nos o finale, um andamento que alterna entre dois temas; o primeiro, que apresenta uma dança vigorosa, e o segundo, um dos mais famosos de Rachmaninoff. A enunciação final deste tema conduz a obra ao seu glorioso final.

 

Sugestão de audição da obra:

Sequeira Costa, piano
Royal Philharmonic Orchestra, Christopher Seaman – RPO Records, 1993</strong

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