Orquestra de Macau | Nova temporada homenageia Rachmaninoff

A Orquestra de Macau arranca com uma nova temporada de concertos que destaca os 150 anos do nascimento do compositor russo Sergei Rachmaninoff. Destaque ainda para a escolha de Lio Kuokman como director musical e maestro principal. Os bilhetes para os espectáculos já estão à venda

 

Sergei Rachmaninoff, um dos nomes mais sonantes da música clássica russa, é a figura em destaque na nova temporada de concertos da Orquestra de Macau (OM), que arranca no próximo dia 2 de Setembro, preenchendo o cartaz cultural da cidade até 27 de Julho do próximo ano.

Nascido em 1873, Rachmaninoff foi maestro, pianista, compositor e um grande representante do estilo romântico no mundo da música clássica. Faleceu nos Estados Unidos em 1943, depois de ter vivido grande parte da sua vida fora da Rússia.

A série de concertos da OM obedece, assim, à temática “150º aniversário do Nascimento de Rachmaninoff”, incluindo a apresentação das obras mais emblemáticas deste compositor.

O público poderá assistir a interpretações dos dois vencedores do Van Cliburn International Piano Competition nos EUA, nomeadamente o pianista coreano Yekwon Sunwoo e o pianista japonês Nobuyuki Tsujii, que vão interpretar as obras mais icónicas de Rachmaninoff, tal como os “Concertos para Piano Nº 2 e 3”.

A série de concertos inclui ainda vários vencedores de concursos internacionais na área da música clássica, como Akiko Suwanai, violinista japonesa que foi a mais jovem a obter uma medalha de ouro no Concurso Internacional de Violino Tchaikovsky. Destaque ainda para Haochen Zhang, pianista chinês que ganhou medalha de ouro no 13º Concurso Internacional de Piano Van Cliburn; e Christian Li, distinguido como o violinista-revelação da Austrália e vencedor do Concurso Internacional Yehudi

Sobem ainda ao palco do Centro Cultural de Macau (CCM) os irmãos Otensammer, da famosa família clarinetista austríaca, nomeadamente Andreas Ottensamer, clarinete principal da Berliner Philharmoniker, e Daniel Otensammer, clarinete principal da Filarmónica de Viena, sem esquecer o pianista francês Jonathan Fournel, vencedor do Grande Prémio do Concurso Internacional de Música Rainha Isabel 2021.

Convites a maestros

O cartaz da nova temporada de concertos da OM é ainda marcado pelo convite a maestros estrangeiros que vão enriquecer as propostas dos espectáculos da nova temporada. Um dos nomes escolhidos é o do maestro britânico Christopher Warren-Green, director musical da Orquestra de Câmara de Londres, que irá actuar com a OM numa interpretação de obras do apogeu de três compositores famosos, Beethoven, Brahms e Edward Elgar.

Além disso, o maestro austríaco Christian Arming conduzirá a OM na apresentação de duas obras-primas do século XX, “Études-Tableaux” (“Quadros de estudo”) de Rachmaninoff e “Quadros numa Exposição” de Mussorgsky. Por fim, Gábor Káli, director musical assistente e maestro principal da Ópera Estatal de Nürnberg, cooperará com a OM para interpretar duas das primeiras sinfonias de Rachmaninoff que tiveram um profundo impacto no próprio compositor.

Celebrar grandes festivais

O cartaz da OM para o próximo ano traz ainda a grande estrela de jazz japonesa, Makoto Ozone, que regressa a Macau para apresentar o Concerto de Natal com a OM.

No concerto da Páscoa, um dos momentos altos do cartaz, Makoto Ozone junta-se aos Coro The Learners de Hong Kong, para interpretar a monumental obra-prima de Bach, “Oratório de Páscoa” na Igreja de São Domingos.

Além disso, haverá um concerto do Dia da Criança com animação, combinando animações em écrã gigante com actuações da orquestra, vocalistas famosos e corais baseados em enredos lendários e mágicos – que sempre agradam aos pequenos fãs.

A orquestra também lançará uma nova série, “Miscelânea de Obras Chinesas”, para criar uma experiência visual multimédia como uma sequência da lenda da “Princesa Floral”, de autoria do renomado dramaturgo da ópera cantonense Tong Tik-sang (1917-59), agora reformulando o romance comovente da princesa Coeng-ping e do consorte Zau Sai-hin, oferecendo ao público uma viagem sinfónica audiovisual.

Um novo maestro

A nova temporada de concertos pauta-se ainda pelo início do trabalho de Lio Kuokman, músico local, como director musical e maestro principal da orquestra. Segundo um comunicado do Instituto Cultural, Lio “está determinado a reinventar a OM para o público de Macau e virar a página do desenvolvimento da orquestra”.

Servindo também como director do Programa do Festival Internacional de Música de Macau e Maestro Residente da Orquestra Filarmónica de Hong Kong, Lio foi elogiado pelo Philadelphia Inquirer como “um surpreendente talento em regência”. Em 2014, ganhou o Segundo Prémio, Prémio do Público e Prémio da Orquestra no Concurso Internacional de Regência Svetlanov em Paris, além de ser o primeiro maestro assistente chinês da Orquestra da Filadélfia. Os bilhetes para a nova temporada de concertos da OM estão à venda desde ontem.

31 Jul 2023

O mais eminente concerto para piano jamais escrito

[dropcap]O[/dropcap] compositor, pianista e maestro russo Sergei Rachmaninoff (1873-1943) foi um dos últimos grandes expoentes do período Romântico na música clássica europeia e é tido como um dos pianistas mais influentes do Século XX.

O total fracasso da sua Primeira Sinfonia, composta entre Janeiro e Outubro de 1895, e estreada apenas no dia 27 de Março de 1897, em S. Petersburgo, esmagou o compositor psicologicamente, causando um hiato de três anos na sua carreira de composição. A obra foi muito mal recebida pelo público e mesmo ridicularizada pela crítica, liderada pelo famoso compositor e crítico musical russo César Cui, membro do célebre Grupo dos Cinco. Pensa-se que este desastre deveu-se, em grande parte, à fraca preparação da orquestra e do seu maestro, o compositor Alexander Glazunov, conforme atestam vários testemunhos, entre os quais o de um outro compositor e maestro famoso na época, Alexander Khessin. A recepção desastrosa da sinfonia, combinada com a preocupação da objecção da Igreja Ortodoxa ao casamento com a sua prima, Natalia Satina, contribuiu para o colapso mental de Rachmaninoff, seguido de um período de profunda depressão.

Rachmaninoff escreveu pouca ou quase nenhuma música nos três anos seguintes, até iniciar, em Janeiro de 1900, um tratamento de hipnotismo com o psicólogo Nikolai Dahl, um especialista de Moscovo, por coincidência músico amador, que o fez recuperar rapidamente a auto-confiança.

Um importante resultado dessas sessões foi a composição do Concerto para Piano e Orquestra Nº 2 em Dó menor, Op. 18, encomendado por um empresário de Londres, que seria dedicado ao Dr. Dahl, em reconhecimento da recuperação do compositor. O Concerto foi composto entre 1900 e 1901. Durante uma viagem a Itália, Rachmaninoff completou o segundo e terceiro andamentos, que apresentou num concerto em Moscovo, com grande aclamação. Este sucesso deu-lhe confiança para concluir o primeiro andamento do concerto, que é frequentemente considerado o mais eminente concerto para piano jamais escrito. A obra foi muito bem recebida na sua estreia no dia 27 de Outubro de 1901, em Moscovo, na qual foi solista o próprio Rachmaninoff, sob a direcção do seu primo Aleksandr Ziloti.

O Concerto para Piano e Orquestra n.º 2 em Dó menor, Op. 18 conferiu um sólido reconhecimento e fama a Rachmaninoff como compositor. A obra veio confirmar que o compositor estava completamente recuperado da depressão clínica e do bloqueio da escrita que o tinham impedido de compor. O longo período que Rachmaninoff demorou a recuperar não foi em vão: cada frase memorável, linha bombástica de violoncelo, e acorde de piano de peso é magnificamente colocado para criar uma verdadeira obra-prima musical. Melodia gloriosa após melodia gloriosa flui do teclado; o diálogo entre a orquestra e solista é divino. A música é ao mesmo tempo virtuosística e lírica, com o piano e a orquestra revezando-se para acariciar a pesada melodia russa. Com os acordes que soam como sinos no andamento de abertura, a serenidade dos arpejos no segundo e o impulso confiante do terceiro, é fácil presumir que esta peça foi obra de um compositor seguro e confiante, enquanto a verdade era muito diferente.

Após uma introdução invulgar que consiste numa série de acordes cada vez mais intensos e ricos do piano, a obra desvenda-se de maneira gratificante, cheia de maravilhosos diálogos entre piano e orquestra (sem duelos), melodias crescentes e refinadas reviravoltas de harmonias. Os compassos introdutórios do segundo andamento orientam habilmente o ouvinte da tonalidade de Dó menor do primeiro andamento para a de Mi Maior do segundo. Um nocturno nostálgico, e a introdução de duas cadências não quebra o clima reflexivo do andamento. Outra modulação hábil de Mi Maior para Dó Maior apresenta-nos o finale, um andamento que alterna entre dois temas; o primeiro, que apresenta uma dança vigorosa, e o segundo, um dos mais famosos de Rachmaninoff. A enunciação final deste tema conduz a obra ao seu glorioso final.

 

Sugestão de audição da obra:

Sequeira Costa, piano
Royal Philharmonic Orchestra, Christopher Seaman – RPO Records, 1993</strong

30 Abr 2019