Lamno -A vila de pescadores esquecida*

[dropcap]M[/dropcap]acaense é símbolo do intercâmbio cultural entre o oriente e o ocidente, e o mesmo acontece no noroeste de Sumatra, na Indonésia, a duzentos quilómetros de Banda Aceh, numa remota vila de pescadores no vasto Oceano Índico, Lamno. Além de ser um local de excelência mundial na produção de lagosta, Lamno destaca-se pela singular existência de um grupo étnico misto de portugueses e indonésios. Os rostos típicos do Sudeste Asiático convivem com um par de olhos azuis cristalinos e de cabelos loiros. Esta aparência especial, que parece expor tranquilamente o seu passado histórico, atraiu também a atenção da imprensa estrangeira.
Infelizmente, Lamno ainda hoje é uma vila desconhecida.

Devido à sua localização, Lamno sempre teve relações com a China desde os tempos antigos e durante o grande período de navegação dos europeus dos séculos XV a XVII. Antes dos portugueses chegarem na procura de especiarias e na ânsia de espalhar a religião católica, o imperador da dinastia Yuan já tinha enviado mensageiros ao local, em 1284. No entanto, existem duas formas para tentar explicar o aparecimento do grupo mestiço português-indonésio local. A primeira é a de que muitos dos marinheiros da frota portuguesa que chegaram à vila optaram por lá ficar tendo muitos deles casado com as mulheres locais. Mas, de acordo com um comunicado oficial, quando os navios portugueses atravessaram a área marítima de Banda Aceh, foram capturados pelo Sultanato de Aceh. Naquela época, os marinheiros portugueses estavam misturados com a tripulação da Andaluzia, Espanha. A Andaluzia é a última dinastia islâmica do território espanhol, “Nasrite”. Devido à semelhança da religião dos dois povos, a tripulação e os habitantes locais facilmente se integraram, e o Jaya Sultan também os ajudou a estabelecer o sultanato “Lamno”. Esta pode ser uma segunda explicação para o surgimento desta mistura peculiar.

A minha viagem para Lamno foi bastante complicada. O avião teve de fazer duas paragens desde Hong Kong até chegar Banda Aceh, e precisei também de contratar um motorista e de alugar um carro no dia seguinte. Devido à falta de alojamento em Lamno, a viagem de ida e volta até Banda Aceh tem que ser feita no próprio dia. Embora estivesse sozinho, a jornada foi tranquila. Felizmente, o motorista que contratei era da organização de socorro às vítimas do tsunami da ONU e nasceu em Lamno.

De Banda Aceh para Lamno, o carro percorreu uma estrada costeira, passando por campos verdejantes, praias lindas e selvagens. O pequeno carro subiu as sinuosas estradas da montanha onde a beira da estrada era coberta de floresta tropical. Durante esta viagem, o cenário ecológico original dos penhascos perto da beira da estrada, era assombroso e mostrava-me o infinito. O Oceano Índico estendia-se diante dos meus olhos.

À tarde, chegámos a um vasto campo, onde se localiza a vila de Lamno. Ao passear no pequeno mercado da aldeia, pude observar vários edifícios com o estilo arquitectónico do sul da Europa e islâmico, que revelavam assim as características culturais locais. O motorista e os aldeões levaram-me para uma casa de madeira onde se sentavam à porta duas mulheres tímidas de meia- idade. Após as apresentações, vim a saber que o marido de uma delas era um homem mestiço luso-indonésio da quarta geração e que a sua filha possui cabelos loiros. O balanço geral da minha jornada foi muito bom, mas fiquei um pouco desiludido por não conhecer pessoalmente estas duas pessoas, que estavam a trabalhar e a estudar noutra ilha.

No entanto, esta viagem encheu-me de satisfação e deu-me a conhecer a vila de “Lamno” registada nos dados históricos chineses, portugueses, ingleses e indonésios.

 

Ritchie Lek Chi, Chan
*Artigo publicado no Macao Daily Newspaper em 14 de Novembro de 2018

 

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