Exposição põe obras de artistas portugueses e chineses a dialogar

[dropcap]U[/dropcap]ma exposição de arte contemporânea, que põe em diálogo 16 artistas portugueses e chineses, em torno do sentimento saudade e explorando materiais diversos, como tela, tintas, tapeçaria, madeira ou vídeo, é inaugurada esta sexta-feira, no Museu Berardo, em Lisboa.

Com curadoria de Yuko Hasegawa, directora artística do Museu de Arte Contemporânea de Tóquio, a exposição “Saudade, China & Portugal – Arte Contemporânea” gira em torno daquela palavra portuguesa “intraduzível”, que “transmite o desejo de um momento passado que pode ser permanentemente inatingível”, explicou.

“Em vários sentidos, esta palavra fala da nossa situação actual — na qual, devido ao desespero esmagador causado pela incerteza do presente e do futuro, o doce passado parece tão acolhedor”, afirmou a curadora.
Centrando-se nesta ideia, Yuko Hasegawa quis “criar um diálogo entre portugueses e chineses, entre dois povos completamente diferentes” e, para tal, pegou “na questão da globalização”, e de toda a instabilidade daí decorrente, para apresentar a saudade como “um calmante eficaz”, acrescenta a curadora.

Neste sentido, Yuko Hasegawa seleccionou 16 artistas de Portugal e da China, em cujas expressões se destacam “três conceitos: diversidade, festividade e ambiguidade, todos eles trabalhados em torno do sentimento saudade”.

Tintas e carvão

A visita à exposição inicia-se com três grandes quadros, de guache e caneta gel sobre papel, em vários tons de azul, da autoria do artista plástico Rui Moreira, que, para este trabalho, partiu da questão “de onde vem o sonho”.

Segundo a curadora, as pinturas de Rui Moreira levam o observador a um “estado de sonambulismo permanente”, que faz lembrar a vida vivida com saudade.

Um incêndio em Trás-os-Montes e a imagem de girassóis a arder, uma frase de um livro de Roberto Bolaño, o filme “Fitzcarraldo”, de Werner Herzog, e as paisagens desérticas foram alguns dos elementos inspiradores desta obra, contou o artista aos jornalistas.

Rui Moreira segue depois para um outro conjunto de três quadros – em guache, caneta de gel, tinta da china e lápis sobre papel – o primeiro dos quais, inspirado na sua paternidade, simboliza o nascimento, o segundo simboliza “a morte de um pai espiritual” e tem a ver com a morte de Herberto Helder, e o terceiro representa a fase de “matar o dragão”, ou seja, matar os sentimentos que atrasam a entrada na maturidade, tais como medo, raiva ou inveja.

Tecidos e xilogravuras

Outras peças em destaque são as grandes xilogravuras do artista plástico chinês Sun Xun, que pretendem mostrar que há mais do que arte contemporânea numa exposição de arte contemporânea – também há história.
A primeira peça é um tríptico intitulado “Flor”, composto de xilogravuras – representando um grande vaso de flores – cravejadas com fósseis, pedras e âmbar.

Inspirado na pintura holandesa do século XVIII, este trabalho de Sun Xun faz lembrar a parede de um museu de História, coberta de “objectos históricos”, genuínos e falsos, e de pinturas, explica Yuko Hasegawa.
André Sousa é outro dos artistas portugueses incluídos nesta mostra, com uma composição de cortinas – cada uma com a sua própria narrativa, inspirada por um acontecimento em determinado momento – dispostas em suspensão, para “criar espaços de tensão”, e formando uma semicircunferência, o que explica o título da obra: “1/2 Roulette”.

Estas cortinas são símbolos, ou um álbum, da jornada pessoal do artista na percepção que tem do mundo e na sua experiência.

André Sousa especificou que são várias as situações e imagens que as suas pinturas nos tecidos – uma de cada lado de cada pano – aludem: livros do século XX, viagens à China e ao Japão, a roleta russa e a cultura do jogo na China, os quadros pretos de ardósia da infância, ou o livro do escritor Venceslau de Morais, “Paisagens da China e do Japão”.

Esculturas, óleos e multimédia

A artista Luísa Jacinto apresenta quadros de acrílico e óleo sobre tela, bem como um vídeo, que se situam entre a figuração e a abstração, nos quais está “muito presente a ideia de vertigem”, explicou a própria.

Joana Vasconcelos está presente com quatro obras, uma das quais – “Valkyrie Marina Rinaldi” – ocupa o centro de uma sala, e consiste numa peça de grandes proporções, feita com croché em lã, tecidos, adereços, insuflável, e cabos em aço, numa espécie de grande dragão de “ricos ornatos, decorações preciosas, tecidos opulentos e uma multitude de técnicas manuais como o croché”, como descreveu a curadora.

As outras três peças, são esculturas cobertas de azulejos Viúva Lamego, mosaicos em pastilha, croché em lã, adereços, polyester, LED, sistema eclétrico, contraplacado e ferro.

A abrir a exposição há uma escultura monumental tridimensional, da autoria de José Pedro Croft, que convida o observador a ver-se no vidro espelhado e a tornar-se parte da obra.

A exposição, que vai estar patente no Museu Colecção Berardo, de 17 de Novembro até 6 de Janeiro de 2019, é uma co-produção com a Fundação Fosun e conta com trabalhos de Vasco Araújo, Pedro Valdez Cardoso, José Pedro Croft, Leng Guangmin, Tao Hui, Luísa Jacinto, Liu Jianhua, Rui Moreira, Cheng Ran, André Sousa, Joana Vasconcelos, Guan Xiao, Sun Xun, Shi Yong, Xia Yu e Liang Yuanwei.

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