h | Artes, Letras e IdeiasCônsules portugueses de Fuchau e Xangai José Simões Morais - 3 Ago 2018 As comemorações não realizadas em Hong Kong contrastam com as dos 25 residentes portugueses de Fuchau (Fuzhou), província de Fuquiam (Fujian), que prestaram “homenagem à Pátria, festejando condignamente o 4.º Centenário da Descoberta do Caminho Marítimo para a Índia pelo ínclito navegador Vasco da Gama”, segundo O Porvir que refere, “No dia 17 de Maio reuniram-se na residência de monsieur Frandon, ilustrado cônsul de França e vice-cônsul de Portugal naquela cidade, e de lá expediram o seguinte telegrama COMISSÃO EXECUTIVA VASCO DA GAMA, MACAU. Esta pequena colónia portuguesa não podendo festejar grandiosamente este glorioso aniversário une-se do coração felicitando seus compatriotas. FRANDON Cônsul. Após o telegrama enviado, seguiu-se uma esplêndida garden party e um lauto banquete em que todos foram muitíssimo obsequiados por monsieur e madame Frandon, e no qual o digno cônsul fez o seguinte eloquente e agradabilíssimo brinde, que nós daqui, em nosso nome e no da pátria agradecida, penhoradíssimos lhe agradecemos: O dia de que os portugueses, não somente residentes na sua Mãe Pátria, mas em todos os países do mundo celebram solenemente hoje o quarto centenário universal, não é uma data memorável, somente na História de Portugal, é uma data memorável, direi mesmo excepcionalmente importante na História de todos, humanidade. Se o príncipe Henrique, não o da Prússia que actualmente se acha na China, mas o de Portugal que vivia no XV século, não houvesse tido a ideia genial de alargar os conhecimentos marítimos dos seus contemporâneos e de ir, sobre os frágeis navios da época, reconhecer….” O Sr. Ernest Frandon está há quinze anos encarregado do consulado português em Fuchau (Fuzhou) com o cargo de vice-cônsul de Portugal que o desempenha gratuitamente e zelando sempre “com tanta dedicação pelos interesses dos portugueses residentes naquela cidade como se eles fossem seus compatriotas, e tem também mostrado sempre tanto amor por Portugal como se ela fosse a sua própria nação. É um benemérito em toda a extensão da palavra, e são tantos, tão valiosos e desinteressados os serviços que tem prestado aos portugueses de Fuchau, que todos o estimam e lhe são gratos, e todos gostariam, assim como nós também gostaríamos, que o nosso governo recompensasse de algum modo o digno cônsul concedendo-lhe uma mercê honorífica, que ele bem a merece, e podemos até dizer que lhe é devida”, segundo O Porvir de Maio de 1898. Cônsules de Shanghai O francês Ernest Frandon desde 1883 desempenhava as funções de Vice-Cônsul de Portugal em Fuchau, cargo para o qual já a 10 de Julho de 1855 fora nomeado o negociante inglês Guilherme Halis Luce. Em 1849, o Governador Ferreira do Amaral escolhera o negociante estabelecido em Cantão, John Dent, cônsul de Portugal nessa cidade e o negociante britânico, Thomas C. Beale, para o mesmo cargo, em Xangai, até que em 1862 ocorreu a falência da Firma Dent, Beale & Co., que então representava os interesses portugueses em Xangai. A 20 de Março de 1862 “foi criado o consulado português de Neng-pó (Ningbo) em Fuchau, com sede no primeiro porto e com jurisdição na costa da China, desde Amói até Xangai, sendo nomeado Francisco João Marques para o desempenho do cargo de cônsul nesses dois portos”, Luís Gonzaga Gomes. “Reconhecida pelas autoridades chinesas, a casa Dent manteve a representação consular portuguesa em Xangai até 1862. Depois, o nível de representação diplomática acompanhou as oscilações sociais de quem assumia aquelas funções. Quando se deu a falência da casa Dent, foi nomeado como cônsul António José Homem de Carvalho” Jr. (?-1878), que emigrou para Xangai, onde veio a falecer. “Deste modo, <rebaixou-se o Consulado português da alta esfera social em que vivia o nosso cônsul (…) Para ir albergar-se em a oficina de um typografo”, segundo Alfredo Gomes Dias, que em nota refere, “De acordo com Forjaz trata-se de um comerciante, mas na List of Foreign Residents in Shanghae, publicada no North China Herald, de 23 de Setembro de 1850, em Xangai, este macaense trabalhava no North China Herald Office, como revisor.” (…) “Homem de Carvalho e José da Silva, macaenses, foram cônsules de Portugal em Xangai até à chegada do primeiro diplomata de carreira”, Anselmo Ferreira Pinto Bastos. “Formado em Direito pela Universidade de Coimbra, Pinto Bastos foi nomeado cônsul de 1.ª classe em Xangai por decreto de 23 de Janeiro de 1879, sendo a 1 de Novembro de 1881 promovido a cônsul de 1.ª classe em Londres.” Já o nosso protagonista, o tenente de cavalaria Joaquim Maria Travassos Valdez, nomeado Cônsul de Portugal de 1.ª classe em Shanghai por decreto de 3 de Fevereiro de 1887, tomou posse do consulado a 8 de Junho e como cônsul geral em Xangai a 14 de Agosto de 1889. Mas a 18 de Outubro de 1890, O Macaense refere, para substituir o cônsul Valdez na sua ausência é nomeado para o lugar de vice-cônsul português em Shanghae o Sr. Bottu”, (empregado do arsenal do governo chinês). Uma desconsideração aos nossos compatriotas! “Assevera-se que o Sr. Valdez pediu ao cônsul francês para o substituir e, como era de esperar, o pedido não foi aceite, porque o cônsul francês tem muito que fazer na própria concessão com os seus inúmeros encargos. Não consta, porém, o que era de estranhar, que o Sr. Valdez se lembrasse ou tivesse a vontade de fazer o mesmo pedido aos outros seus colegas que tem menos a lidar nos seus respectivos consulados; e alguns dos quais já ficaram temporariamente encarregados do nosso consulado aqui, nomeadamente o Sr. Bonilla, cônsul de Espanha, o Sr. Carl Bock, cônsul de Suécia e Noruega, o Sr. Joseph Hass, cônsul de Áustria, em fim vários outros cavalheiros de alta posição social com prestígio, e com vasta ilustração e experiência em coisas de leis.” Mas no sábado dia 4 de Outubro de 1890 foi preso Filomeno Pereira, acusado de ter posto fogo à casa, onde morava, na rua margin 1 de Soochow Creek, num renque de casas há bem pouco incendiadas e subsequentemente reconstruídas por conta das companhias de seguro. O irmão Eusébio também ali tinha casa e participara no crime. Estavam elas asseguradas em 2500 taéis. “Este caso foi inquirido no consulado português em audiência secreta. O Sr. Valdez procedeu na terça-feira a uma visita domiciliária na casa de Filomeno Pereira”, onde se encontraram maiores vestígios do crime. Mandou os dois irmãos, um preso para a estação de polícia em Hongkew e outro para a estação central. É de interesse público “que o Sr. Valdez empregue todos os meios ao seu alcance para descobrir a culpabilidade dos incendiários”, visto que “tanto em Hong Kong como em Shanghai nestes últimos tempos têm havido muitos incêndios que provocaram suspeitas, mas não foram descobertos os criminosos, que ficaram impunes, sendo além disso beneficiados com as indemnizações das casas de seguro. O cônsul Valdez, com a pressa que tem de regressar ao reino, tem trabalhado até altas horas da noite” neste caso.