Desporto MancheteGrande Prémio | Design de material publicitário criticado pelo sector e alvo de paródia nas redes sociais João Santos Filipe - 17 Jul 2018 É a imagem de Macau que está a causa. É desta forma que os profissionais da área comentam os materiais publicitários da 65.ª edição do Grande Prémio, que tem sido alvo de fortes críticas. Ao HM, a organização evitou referir que empresa, ou pessoa, foi responsável pelo trabalho e quanto foi pago pelo serviço [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Grande Prémio de Macau só vai para a estrada em Novembro, mas a promoção à 65.ª edição do evento já está instalada no Edifício do Grande Prémio e os materiais de promoção começaram a ser distribuídos pela cidade. No entanto, o design destes materiais está a gerar controvérsia, mas também o divertimento dos cibernautas mais humorados nas redes sociais. Além disso, entre os profissionais da área em Macau existe um sentimento de incredulidade face ao resultado apresentado. Em causa está não só o facto das fotografias dos carros que competem nas provas terem sido substituídas por imagens que se assemelham a desenhos pré-feitos, mas também pela proporção dos carros e pelas cores do arco-íris utilizadas. Por outro lado, a falta de elementos que possam ser associados ao Grande Prémio de Macau é outra das falhas apontadas pelos profissionais do sector ouvidos pelo HM. “Não posso dar uma opinião profissional do trabalho porque não há ali qualquer referência que me permita dar uma opinião profissional. Este trabalho não tem base de comunicação, de conceito, não transmite uma mensagem. É simplesmente uma tentativa de decoração, sem haver qualquer ideia que promova Macau ou o Grande Prémio de Macau”, defendeu Henrique Silva, director criativo da empresa de design Goldfish. “O cartaz tanto poderia ser utilizado para este Grande Prémio de Macau como para as corridas de karting no Zimbabué. Não transmite uma identidade, nem nenhum elemento, nem nada que promova ou valorize a tradição da prova, da tradição das corridas, nem do Macau moderno e criativo que queremos ter”, acrescentou. Incredulidade no sector Já o designer Vincent Cheang confessou ao HM que a primeira reacção que teve quando viu a publicidade foi pensar que estavam a pregar uma partida. Segundo o próprio, a reacção foi comum a vários profissionais do sector com que convive. “Todos os designers que comentaram comigo este material publicitário acharam que era uma brincadeira. Não foi só um, foram todos!”, confessou o designer, ao HM. “Estamos a falar de um material publicitário que não cumpre os níveis de profissionalismo exigidos e que vai estar exposto mundialmente”, considerou. Para Vincent Cheang o primeiro problema deve-se ao facto do cartaz não conseguir apresentar as características do Grande Prémio de Macau, nem tão pouco de uma prova de automobilismo. “Quando estamos a falar de provas de automobilismo e do Grande Prémio de Macau, em particular, são eventos com uma atmosfera muito particular, há ali todo um som, um cheiro, um ambiente característico”, começou por justificar. “Mas este é um tipo de design que nem toda a gente tem capacidade para fazer. Há pessoas no sector que têm capacidade para fazer um bom trabalho com materiais sobre outros assuntos, mas que não conseguem transmitir estas ideias das corridas. E quando olho para o material publicitário deste ano, não reflecte em nada o ambiente especial do Grande Prémio de Macau”, opinou. Salada de elementos Outra das críticas apontadas é a falha de ligação entre os diferentes elementos apresentados, nomeadamente nos carros que pretendem ser réplicas das viaturas que correm na Fórmula 3 e a Taça Mundial de Carros de Turismo (WTCR). No cartaz falta ainda qualquer elemento que remeta para a Taça do Mundo FIA GT, uma das três provas com chancela da entidade que regula o desporto motorizado que decorre durante o fim-de-semana do Grande Prémio. “Olhando para o cartaz, nem posso dizer que vejo ali a intenção de se fazer uma coisa com um espírito retro. Não vejo essa intenção. Para mim só vejo mesmo mau gosto e utilização de elementos que me parecem clip arts [imagens de animação previamente feitas]”, aponta Henrique Silva. “Eu posso não gostar de um trabalho a nível estético e compreender a intenção ou a linguagem utilizada, mas neste caso nem isso é possível. É uma salada de elementos” justificou sobre a opinião expressa. Vincent Cheang aponta ainda o dedo ao arco-íris e ao facto dos carros seguirem uma direcção contrária à sensação de movimento do cartaz. “Quando vi as luzes a minha questão foi: mas o que é isto? É uma arco-íris? Qual a razão da escolha destas cores?”, confessou. “Se virmos bem, isto é um conjunto de elementos que foram colocados ali, mas que não se ligam. Não é suficiente meter os elementos juntos, sem que haja as proporções certas, sem que seja feita uma ligação entre eles. Honestamente, não sinto que tenha havido paixão neste trabalho”, frisou. Problema não é do sector Ao mesmo tempo que apontam as limitações do trabalho apresentado, os designers mostram-se preocupados com o impacto que o material de promoção do GP, que vai ser divulgado a nível mundial, terá para a imagem da RAEM. Uma situação que poderia ser evitada, até porque, dizem, o sector tem muito valor e talento. “Há talento em Macau nesta área e há pessoas capazes de fazer muito melhor. Mas isso também não é muito difícil, porque um estudante do primeiro ano do curso que se dedique consegue fazer um trabalho melhor”, opinou Vincent Cheang. “Não é só o Grande Prémio que é afectado pela falta de qualidade. É a imagem de Macau que fica em causa. Pior, estas imagens vão ser transmitidas em quase todo o mundo. Por isso, era importante que o trabalho tivesse grande qualidade e não fosse isto”, frisou. Henrique Silva diz mesmo que a bem do Grande Prémio, e se houver falta de verbas na organização, que está disponível para fazer o trabalho “gratuitamente”. Por uma questão de contexto, importa referir que o evento tem um orçamento que ronda os 220 milhões de patacas. “Não falo só por mim, de certeza que também há outras pessoas, mas estou na disposição, caso seja por falta de dinheiro, de numa próxima vez fazer este trabalho gratuitamente. Tenho a certeza que se o trabalho que se mostra, pelo menos internacionalmente, tiver boa qualidade, que esta seria a melhor forma de promover, desenvolver e internacionalizar esta indústria… melhor do que com subsídios”, afirmou. “E se há coisa que Macau sempre teve foram bons designers”, fez questão de realçar. Os dois profissionais ouvidos consideraram ainda que a grande responsabilidade do trabalho apresentado tem de ser apontada a quem tomou a decisão de aprovar este design como material de promoção das corridas. No segredo de Pun Weng Kun O HM entrou em contacto com a Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau, liderada pelo presidente do Instituto do Desporto, Pun Weng Kun, e perguntou duas vezes qual o preço da adjudicação deste serviços e qual a empresa ou pessoa responsável pelo design do cartaz. Nos dois emails recebidos pelo HM, a Comissão nunca respondeu às perguntas, escusando-se de apresentar o montante e a empresa responsável, apesar da insistência. Por esse motivo não nos foi possível entrar em contacto com o autor do trabalho. Organização pede compreensão para a “obra” “Cada obra recebida tem as suas próprias características, facto que se espera ser da máxima compreensão do público em geral”. Foi desta forma que a organização respondeu às críticas apontadas ao trabalho. Ainda de acordo com a Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau, o design do cartaz é made in Macau. “O Governo da RAEM tem providenciado, ao longo dos anos, diversas plataformas para o sector local da indústria criativa e cultural, com o objectivo de apoiar o desenvolvimento do seu próprio espaço criativo. E por isso, sempre que é necessário criar um design temático para o Grande Prémio de Macau ou para um outro evento organizado pelo Instituto do Desporto, o nosso Instituto convida sempre uma empresa de design ou designer do território”, foi explicado. Ao mesmo tempo, e apesar de não serem avançados valores, a organização diz que houve uma comissão que avaliou as diferentes propostas. “O Instituto de Desporto tem cumprido sempre a legislação de adjudicação de bens e serviços, no que diz respeito ao serviço da concepção gráfica do material publicitário do Grande Prémio de Macau, e mediante as propostas entregues, através da consulta a várias empresas locais de design, a Comissão de Apreciação de Propostas procedeu à avaliação conforme os respectivos critérios, tendo sido seleccionada a proposta que melhor correspondeu aos requisitos exigidos”, foi dito. Paródias na Internet Na semana passada, depois de terem sido afixados os cartazes publicitários no Edifício do Grande Prémio, a Internet respondeu com sentido de humor. “Vai ser uma prova com carrinhos de brincar”, escreveu um dos utilizadores, num grupo de conversação em língua chinesa. “Pensei que era uma publicidade sobre um posto para mudar óleo ao carro”, escreveu outro. Além disso, foram ainda partilhadas imagens associadas com a publicidade, nomeadamente uma em que são exibidos carros feitos de papel e outra com o popular jogo Mário Kart.