Lei de Terras | Governo afastou “excepções” sobre prazo das concessões de terrenos

Um parecer da Mesa da Assembleia Legislativa sobre a Lei de Terras concluiu que o Governo afastou “excepções” sobre o prazo das concessões de terrenos, e “insistiu sempre” que os recuperaria na falta de aproveitamento volvidos 25 anos. Mas mostra também que o Executivo não fechou a porta à ponderação de casos concretos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] relatório surge após ouvidas as gravações das reuniões em sede da 1.ª Comissão Permanente – que analisou o diploma na especialidade – para apurar a intenção legislativa subjacente depois das dúvidas levantadas com a aplicação da Lei de Terras e na sequência de um projecto de lei, apresentado, no Verão, pelo deputado nomeado e jurista Gabriel Tong, projecto esse que foi rejeitado.

Apesar de ter entrado em vigor há três anos, a Lei de Terras tem estado envolta em controvérsia desde que o Executivo avançou em força com a reversão de terrenos por estes não terem sido aproveitados dentro do prazo máximo de 25 anos.

Muitas declarações de caducidade das concessões têm vindo a ser contestadas nos tribunais, com concessionários a alegarem haver casos em que a responsabilidade pelo não-aproveitamento deve ser parcial ou totalmente imputada ao Governo.

No parecer, refere-se que um deputado levantou “especificamente a questão de como resolver o problema em caso de não-conclusão do aproveitamento do terreno quando o prazo de concessão se encontrar prestes a terminar” e propôs soluções, como conferir “ao Chefe do Executivo competência para, neste caso, autorizar a renovação”, mas que essas sugestões foram “expressamente” rejeitadas pelo Governo.

Neste ponto, uma nota de rodapé remete para “as conclusões do relatório sobre a auscultação das gravações das reuniões da Comissão”, cuja transcrição não consta, contudo, do documento tornado público, com 562 páginas na versão portuguesa.

Porta ainda fechada

Aos jornalistas, o presidente da Assembleia Legislativa (AL), Ho Iat Seng, disse que, ao abrigo do Regimento, os “pontos mais detalhados” não podem ser disponibilizados, estando então em causa o teor das reuniões da comissão que decorrem à porta fechada.

Recorda ainda a Mesa da AL que foi nesse pressuposto – de que as concessões provisórias não podem ser renovadas – que a proposta de lei foi aprovada, não tendo as normas em causa “sofrido alterações substanciais desde a sua versão inicial até à final”.

A política legislativa “não só foi comprovada pelos elementos constantes do processo legislativo” como foi sempre defendida, sem excepção, pelo Governo e pelos órgãos judiciais”, refere.

Tirando “a situação em que um terreno de concessão provisória seja anexado a um terreno concedido a título definitivo e ambos estejam a ser aproveitados em conjunto”, defendeu-se que não seriam considerados outros casos excepcionais, lê-se no relatório que sublinha que essa opinião foi “acolhida” pela 1.ª Comissão Permanente.

“Portanto, estava clara a atitude do legislador perante a questão da renovação da concessão provisória, ou seja, só há uma excepção” e “mesmo quando as cláusulas de aproveitamento do contrato de concessão não puderem, por razões inimputáveis ao concessionário, ser cabalmente cumpridas, não há lugar a qualquer excepção para a renovação”, diz o documento.

Talvez talvez

Contudo, como argumentou Tong na nota justificativa do seu projecto de lei, citando o parecer da 1.ª Comissão Permanente da AL sobre a Lei de Terras, de 2013, “nunca se suscitou a ideia de expropriação dos terrenos cujo não-aproveitamento não seja imputável aos concessionários. Pelo contrário”.

Segundo o parecer da lei apresentado pela referida comissão, um deputado questionou como seriam tratados os casos em que não se conseguisse cumprir o prazo concedido por razões não imputáveis ao concessionário e o Governo terá aberto a porta à possibilidade de excepções. Isto porque declarou não ser “adequado estabelecer que haja lugar a renovação no caso de atrasos no aproveitamento”, mas não excluiu que “casos concretos que correspondam a outras disposições previstas (…) possam ser tratados de forma excepcional”.

A “norma interpretativa” de Tong pretendia clarificar que o prazo de concessão podia ser “suspenso ou prorrogado” por autorização do Chefe do Executivo, “sempre que haja motivo não imputável ao concessionário e que tal motivo seja, no entender, do Chefe do Executivo, justificativo”.

Esta situação encontra-se prevista para o prazo de aproveitamento, mas não para o de concessão, pelo que questionou por que razão “em caso do termo do prazo de concessão por arrendamento, ainda que o prazo de aproveitamento esteja suspenso, o concessionário deve ainda assumir a consequência da devolução do terreno”.

A Mesa da AL rejeitou a iniciativa, entre outros motivos, por discordar tratar-se de uma norma interpretativa, mas de uma alteração, pois “não vem explorar nem o espírito, nem o pensamento legislativo subjacente ao normativo da lei, mas sim criar, na prática, novas disposições normativas”, além de que “toca e vai alterar a política de gestão de solos definida”.

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