Justiça | Arguidos dão conta de mau ambiente na equipa de Ho Chio Meng

 

Havia funcionários a quererem progredir na carreira a todo o custo e, por isso, criou-se o grupo que, de acordo com a acusação, serviu para encobrir uma série de irregularidades praticadas por Ho Chio Meng. Lava-se roupa suja e lavam-se também as mãos no julgamento do processo conexo ao do ex-procurador

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]ntigos funcionários do Ministério Público (MP), arguidos no processo conexo ao do ex-procurador, afirmaram ontem que o grupo que deu cobertura a uma série de irregularidades foi criado para resolver tricas internas, relatou a Rádoio Macau, que está a acompanhar o julgamento. A sessão ficou marcada pelo “aparente ambiente de competição” entre o pessoal de Ho Chio Meng, indicou a emissora.

Acusado de burla, Chan Ka Fai começou o depoimento com um lavar de mãos: disse que alertou António Lai, ex-chefe de Gabinete de Ho Chio Meng, para várias “situações injustas” nas adjudicações do MP.

Na sequência das declarações que prestou no Tribunal de Última Instância (TUI), como testemunha no processo de Ho Chio Meng, Chan Ka Fai voltou a fazer referências a discussões com António Lai, mas alterou o discurso quando confrontado pelo juiz. Lam Peng Fai, presidente do colectivo no TJB, recordou que o ex-chefe de Gabinete estava presente na sala, a “ouvir tudo”, e aconselhou o arguido a reconsiderar o depoimento.

Após um intervalo para “pensar melhor”, Chan Ka Fai acabou por esclarecer que nunca confrontou directamente António Lai. O arguido descreveu apenas situações em que terá apresentado propostas de adjudicação com três fornecedores diferentes e perguntado se era para dar seguimento. António Lai não terá respondido, mas “fez uma cara de desgosto” – uma reacção que o juiz classificou como “normal”, uma vez que Chan Ka Fai seria o responsável por avaliar se propostas estavam ou não em condições de ser aceites.

O arguido alegou que estava subentendido que havia “injustiças” nas escolhas das empresas. Chan Ka Fai rejeitou os termos “irregularidades” ou “ilegalidades”, alegando que a lei de aquisição de bens e serviços é omissa em relação à forma de selecção das empresas a escolher para participar em concursos por convite.

Aquando das declarações no TUI, na qualidade de testemunha, Chan Ka Fai admitiu a existência de irregularidades no sistema de pagamento de despesas e liquidação de contratos do MP: falou em facturas falsas, manipulação de orçamentos, com alterações de preços e de datas, e confirmou a omissão de dados.

Pouco amigos

Estas irregularidades eram cometidas através de um grupo criado por Ho Chio Meng, em aparente sobreposição de funções com o departamento financeiro do Ministério Público. No entanto, quer Chan Ka Fai, quer António Lai negam que a equipa tenha sido criada para encobrir desvios de dinheiro a favor do ex-procurador.

Segundo a Rádio Macau, os dois arguidos alegaram que o grupo foi criado para resolver conflitos entre pessoal do MP, interessado em progredir na carreira. Ho Chio Meng terá decidido afastar a pessoa menos consensual, dando-lhe um cargo novo, sendo que a funcionária em causa era familiar do ex-procurador.

A equipa, identificada como Grupo de Administração Geral, chegou a ser chefiada por Chan Ka Fai. Na versão de António Lai – que alega desconhecimento sobre o sistema de adjudicações do MP, que resultou no favorecimento de empresas controladas por pessoas próximas de Ho Chio Meng –, era este grupo que fazia as propostas de contratação e estaria a actuar à revelia do antigo chefe de Gabinete.

António Lai disse que, a maioria das vezes, assinava as propostas de contratação sem ler toda a documentação. Questionado pela acusação sobre os motivos que levariam Chan Ka Fai, então subordinado, a ter a iniciativa de propor empresas, António Lai subscreveu a tese oferecida pelo juiz: Chan Ka Fai estaria a tentar ser promovido por Ho Chio Meng.

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