Gonçalo Waddington: “O cinema e o teatro estão com uma pujança incrível”

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap]s actor, encenador, realizador, trabalhas no teatro, no cinema e na TV, e és também escritor. Editaste recentemente uma peça de teatro, O Nosso Desporto Preferido Presente, que faz parte de uma tetralogia, e no ano passado editaste Albertine (livro pelo qual viajamos na terça-feira passada, na Máquina Lírica). Quando estudavas teatro já escrevias, pretendias fazê-lo, ou foi algo que aconteceu mais recentemente?
Foi algo que aconteceu mais recentemente. Na verdade, eu e a actriz Carla Maciel, com quem eu sou casado, pedimos a um escritor para adaptar um volume – ou uma “parte”, quanto muito -, da obra Em Busca do Tempo Perdido do Marcel Proust para teatro. O escritor disse-me que não lhe interessava a proposta e que, o melhor, seria eu, Gonçalo, escrever a peça. Foi assim que me apareceu a obra Albertine, O Continente Celeste.

Para além do teatro, quais as tuas leituras mais frequentes, para além obviamente do Proust?
Sebald, Holderlin, Hofmannsthal, Lucrécio, Pynchon, Rui Nunes, Trakl, Ingeborg Bachmann, Michaux, João Miguel Fernandes Jorge, António José Forte, Herberto… entre muitos outros e outras.

Como vês este nosso tempo em relação ao cinema e ao teatro em Portugal?
O cinema e o teatro estão com uma pujança incrível. Há filmes (curtas e longas) a estrear em todos os grandes festivais mundiais, veja-se o exemplo da curta-metragem PEDRO, da dupla André Santos e Marco Leão, que irá estrear no mítico festival Sundance Film Festival. É́ a primeira curta- metragem portuguesa neste festival. No teatro temos o caso do Tiago Rodrigues, a Praga, a Mala Voadora, o Miguelinho Loureiro, a Companhia Maior, os Possessos, os SillySeason, o Tonan Quito… tantos e tantas que têm projectos incríveis.

Quais os próximos projectos em que estás a trabalhar, de momento?
Agora estou a escrever uma nova versão do guião da minha primeira longa-metragem PATRICK, que será rodada no primeiro semestre de 2018. Depois irei para a segunda parte da tetralogia d’O Nosso Desporto Preferido – Futuro Distante.

Explica-nos melhor esse teu projecto da tetralogia, por favor.
O Nosso Desporto Preferido é uma tetralogia em que proponho uma reflexão sobre a nossa evolução como espécie universal. A primeira parte da obra, com o sub-título Presente, é composta por cinco personagens, encabeçada por um cientista misantropo que sonha com a criação de uma espécie humana livre das necessidades básicas como a alimentação, digestão e, talvez a característica mais importante para a peça, a reprodução — tornando-se assim uma espécie exclusivamente dedicada ao hedonismo e à abstracção, seguindo, de acordo com a sua visão, o caminho da evolução natural da nossa civilização tipo 0 para tipo 1, em que seremos finalmente uma sociedade global, multicultural, multiétnica e científica. A segunda parte: Futuro Longínquo, é uma pequena amostra do que serão, daqui a cem mil anos, os Homo Sapiens Sapiens Sapiens Sapiens Sapiens Sapiens – ou, recorrendo a um neologismo Houllebecquiano, os Neo-Humanos – de uma Civilização Tipo 3, de acordo com a escala Kardashev, o astrofísico russo que se propôs medir a evolução tecnológica de uma civilização, particularmente no que concerne à produção e consumo de energia. Este grupo será composto por quatro a cinco actores de diferentes nacionalidades. Estes supra-seres dedicam-se apenas a esperar pela morte: consumidos pelo tédio, uma vez que os seus corpos têm uma durabilidade cem vezes maior da que a dos seus antepassados – nós –, tentando compreender a razão de tal desvio evolutivo que levou à espécie humana a que agora pertencem. O seu único desejo é comunicar o seu desagrado pela sua presente condição, tentando, em vão, emitir uma qualquer mensagem que atravesse o Espaço-Tempo e alerte o grupo de cientistas da primeira parte – Agora –, seus criadores, para a tragédia que eles, sem o saberem, irão – no passado – 3 desencadear com as suas experiências. Enquanto não desaparecem, dedicam-se à compreensão da Filosofia, da Arte, da Religião e das Ciências humanas, sociais e políticas, uma vez que eles, seres racionais e científicos, são incapazes de tais abstracções. Conversam e jogam Badminton.

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