A antiga China e a Dama de Hongshan

Dama de Hongshan é o nome que Michael Du, antiquário e coleccionador de renome a viver actualmente no Canadá, dá a si próprio. Há alguns dias atrás falámos ao telefone e discutimos a sua grande obsessão: a Cultura Hongshan

JOY: O que é a Cultura Hongshan?
MD: É uma cultura neolítica do Nordeste da China. Foram encontrados locais com vestígios da Cultura Hongshan numa zona que se estende desde a Mongólia Interior até Liaoning, datados do período compreendido entre 4700 e 2900 AC. Nestes últimos 20 anos, tenho vindo a dar a volta ao mundo. Já visitei mais de 40 países e regiões da Ásia, África, América Latina, Estados Unidos e outros continentes. De momento tenho mais de 10.000 peças que são verdadeiros tesouros culturais de períodos muito antigos da China. Sou louco? Acho que sim, mas um louco com curiosidade intelectual e o coração no sítio certo.

JOY: Como é que iniciou a colecção de artefactos Hongshan?
MD: Foi em Agosto de 1993, num dia que nunca vou esquecer. Estava em Trieste, na Itália, para visitar uma colecção de mobiliário da antiga Dinastia Qing; tenho um negócio de mobiliário antigo. O proprietário mostrou-me alguns exemplares de mogno muitíssimo originais, com preços proibitivos. Mas, sem me dar conta, o meu olhar foi atraído pela estranha forma de um objecto. Era, só soube mais tarde, um dragão de jade em forma de C, algo característico da Cultura Hongshan. Examinei o material, a densidade, a cor e o modelo. Claro que era chinês, mas de que período? Já tive nas mãos tantos objectos de jade, mas nunca tinha visto nada de semelhante na vida! Este dragão em forma de C era-me completamente estranho e deixava-me confuso…O proprietário conseguiu adivinhar os meus pensamentos. Antes que eu conseguisse formular uma pergunta que fizesse sentido, respondeu-me: “Dragão Hongshan. A Cultura Hongshan é fascinante.” Fiquei de cara à banda. Era a primeira vez que ouvia um estrangeiro mencionar o termo Hongshan! Compreendi naquele momento que estava a segurar o pai de todos os dragões. Fiquei sem palavras por alguns momentos e senti-me envergonhado da minha ignorância. Acabei por conseguir dizer: “Compro-o.” Não regateei, nem olhei para mais nada. Vim imediatamente para casa e consultei alguns peritos, mas ninguém sabia nada sobre este dragão chinês com 20 cm de altura. O acesso à informação era muito mais difícil na altura. Começou então o meu périplo por bibliotecas e livrarias em busca de informação em jornais e revistas da especialidade. Sentia-me um verdadeiro detective Hongshan. Ao tentar compreender o significado meu dragão em forma de C, acabei por ficar absolutamente convencido que a Cultura Hongshan é a verdadeira origem da civilização chinesa. Embarquei numa aventura excitante e de grande valor cultural, para um coleccionador como eu.

JOY: Sr. Du, por favor, explique-nos como é que foi fazendo a sua colecção. Como é que conseguiu reunir 10.000 peças antigas de bronze e de jade?
MD: Há mais de dez anos, soube que um coleccionador americano queria vender os seus objectos porque já tinha muita idade e estava doente. Passei uma semana com ele, a tentar convencê-lo de que eu era a pessoa certa. Acabei por comprar-lhe a colecção, com cerca de 1.000 artefactos Hongshan, por um preço razoável. Os primeiros objectos Hongshan de “jade negro” eram cobertos por uma liga muito antiga, através de uma tecnologia que estudiosos e historiadores nunca conseguiram compreender nem explicar. Daqui resultou que coleccionadores sul-coreanos começaram a comprá-los em grandes quantidades, vendendo-os posteriormente como objectos preciosos, mas sem os identificarem. Muitos locais Hongshan foram pilhados e inúmeros artefactos muito antigos saíram do País. É um duro golpe na nossa herança cultural e magoa-me imenso. Mas eu estou sempre atento às novidades e aos mexericos e, mal apanho qualquer sinal, viajo até onde for preciso para ver as peças. Se tiver a certeza que são objectos genuínos, estou disposto a pagar o dobro do preço de mercado. Tenho hoje em dia na minha colecção muitas peças absolutamente únicas.

JOY: Corre muitos riscos e investe imenso para actualizar a sua colecção. Quais são as suas metas?
MD: Disse que sou intelectualmente curioso e é verdade. De momento, pretendo publicar uma edição de luxo com ilustrações de 600 artefactos Hongshan, todos pertencentes à minha colecção. Esta obra de referência pretende galvanizar amigos, colegas, investigadores e amantes da Cultura Hongshan, provenientes do nosso circulo internacional. Podemos chamar-lhe a “Bíblia Hongshan”. Entretanto estamos a preparar a abertura de um museu privado em Xangai, que deverá acontecer em breve. Vejo-me a mim próprio como um devotado fã dos Hongshan, como um promotor e um anjo da guarda.

Julie O’yang

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