Aquela máquina

[dropcap style=’circle’]U[/dropcap]fa, que nos livrámos de boa, caro leitor, upa upa, olarilas. Nem quero imaginar o que seria tivesse estado eu naquele dia no Posto Fronteiriço das Portas do Cerco, quando se deu a avaria do sistema informático de verificação do BIR, que deixou apeados e à chuva, COITADINHOS (entra música de violino), milhares de residentes que…que o quê? Ah, iam à China, ou voltavam de lá, sei lá, raramente o fazem por uma questão de vida ou de morte, ou para servir uma causa nobre, mas tenho a certeza que se fosse comigo, despejava ali o meu reportório completo de obscenidades em versão trilingue.
Confesso que adoro aquele novo sistema que permite aos residentes de Macau passarem na migração através de não uma mas sim duas portinholas – uma que lê o “chip” do BIR e outra que lê a impressão digital – dispensando assim ter que ir fazer fila e dar de caras com um simpático sr. agente, que lá vai fazer o frete de verificar se estamos autorizados a bazar daqui p’ra fora, ou se o nosso bebé de meses de idade não calha ter o mesmo nome de algum professor universitário honconguense, e assim deixar-nos à porta a chuchar no dedo. E adoro esse sistema porque é isso mesmo: a única coisa boa de todo esse enfado que é viajar, especialmente se for de avião, onde se chega a perder mais tempo a passar nos “checkpoints” e à espera do que no voo propriamente dito. Precisavam de me ver aqui há umas semanas, voltava eu do Laos via Kuala Lumpur, a passar nas tais portinhas, com o mesmo entusiasmo de uma criança de três anos que racionaliza o funcionamento dos elevadores. Se me tirassem isso pá, tinham que me aturar , ai tinham pois.
Entendo, entendo muito bem, sim senhor, que apesar de estar aqui a tratar do incidente com ligeireza, este sucedeu-se logo na véspera do feriado do 1 de Maio, um dos dias mais movimentados do ano no posto fronteiriço. Achei estranho, contudo, foi – e mais uma vez, diga-se de passagem – a forma trapalhona com que as autoridades lidaram com o caso, necessitando de mobilizar um contingente de simpáticos agentes para verificar os cartões. Onde é que já se viu?!?! Imagino até a conversa entre um “xô” comandante e um desses agentes, subitamente convocado para reconhecer centenas de carantonhas:
– “Epá Fong, anda daí que tens que vir aqui para as Portas do Cerco verificar os BIRs. Toca a andar”.
– “Mei-ah, tai lou…ma fan. Mande os ursos irem lá meter o cartão naquelas portinhas, que já era altura de aprenderem a mexer naquilo”. [de facto aqui a ignorância ainda é muita].
– “Não dá, pá, é que o sistema informático avariou e as máquinas não funcionam”.
– “Sistema avariado? Máquinas não funcionam??? Impossível!”.
Sim, e nesse chuvoso dia as Forças de Segurança aprenderam uma valorosa lição: as máquinas avariam-se. Quem diria, e quem sabe se da próxima vez não antecipam essa possibilidade e lembram-se assim de, sei lá, convocar um contingente a entrar em acção na eventualidade de se dar o mesmo problema? Ou não, o que digo? Afinal os secretários, procurados et all eram (e são, e são!) pessoas de bem, acima de qualquer suspeita, e até parece um insulto considerar-se a possibilidade de serem julgados numa instância judicial sem a possibilidade de recurso para outra superior. O quê, julgados? Ai, ai, cala-te boca.

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