Perspectivas VozesA Europa em risco de desintegração Jorge Rodrigues Simão - 24 Mar 2016 “The European Union, in turn, would be diminished by Britain’s departure. Britain would cease to play its historic role of maintaining a balance between hostile blocks on the continent. Its departure would powerfully reinforce a process of economic and political disintegration that is already under way.” The Tragedy of the European Union: Disintegration or Revival? George Soros and Gregor Schmitz O sistema de controlo de fronteiras europeu teve fortes probabilidades de se estalar em pedaços, após a reunião a 7 de Março de 2016, entre a União Europeia (UE) e a Turquia. Estava em causa o problema dos imigrantes, pois mais de cinquenta mil refugiados da Síria e do Iraque inquietam a Grécia, que não sabe o destino a dar-lhes, enquanto os países próximos, liderados pela Áustria, constroem barreiras físicas e impõem rígidos controlos. O primeiro-ministro inglês e o presidente francês, entretanto, reuniram-se na França, por causa das comemorações relativas ao centenário aniversário da batalha do Somme, a mais sangrenta da I Guerra Mundial. A ansiedade do primeiro-ministro inglês reside no próximo referendo britânico que decidirá se existirá “Brexit”, ou seja, se a “Ilha” abandona ou não a UE. O presidente francês, não consegue entender esta frivolidade inglesa, quando a Europa faz face ao enorme problema dos refugiados, apelidada de nova invasão dos bárbaros e a uma grave crise económico. A chanceler alemã jogava o seu futuro político, pois necessitava de convencer a Turquia, a assumir o papel da Grécia e conter as centenas de milhares de refugiados no seu território, em troca de importantes ajudas económicas, que seriam de três mil milhões de Euros iniciais e a promessa de retirar do congelador a integração da Turquia na UE. A Turquia não é fácil de ser convencida, mais quando, está envolvida no conflito militar generalizado da Síria, e na sua eterna luta contra os curdos. Os Estados membros da UE, pela primeira vez, não demonstram vontade de assumir posições colectivas e preferem a situação oposta, privilegiando soluções nacionais, como é evidente nos casos da Hungria, Áustria, Eslovénia e da Macedónia (Estado candidato à integração desde 2004). Esta sintonia pode ser nefasta, agravada em caso da saída britânica, conjuntamente, com um agravamento da crise de refugiados, a UE não ficaria destruída, mas irremediavelmente prejudicada e com menor relevo global. A UE com quinhentos milhões de habitantes pode absorver um milhão de refugiados por ano, devidamente repartidos entre os seus Estados membros, após resolução das crises económicas e financeiras de alguns países e do desemprego. A Alemanha não tem capacidade para resolver por si só, o grave problema que atormenta a Europa. Existe o risco de várias divisões. A primeira é Norte-Sul, onde o esquema de Schengen, constituído pelo grupo de países que aceitam estrangeiros em um dos países membros, sendo suficiente para que se desloquem pelos demais, pode ser anulado. A segunda, também Norte-Sul, é o futuro do Euro. A moeda comum tem fortes condicionantes em países como a Grécia, mas também, em Itália, Espanha e Portugal. A terceira, é uma nova divisão Este-oeste, onde os governos democráticos ocidentais começam a sentir dificuldades, com regimes com tendências autocríticas como nos Balcãs, todos herdeiros de anos de dominação do modelo soviético. O “Brexit”, o novo fantasma que agoira a Europa, e que ninguém parece animado a prever o resultado do referendo inglês, é incómodo, pois o resultado pode ser “SIM” e o Reino Unido sai da EU, e poderá acontecer que a Suécia e a Dinamarca sigam o desastroso exemplo. Após um lento processo evolutivo de integração de sessenta anos, emerge a possibilidade do retrocesso. A UE iniciou negociações com a Turquia a 28 de Fevereiro de 2016, para tomar medidas para cortar o fluxo de imigrantes que entram na Europa, e em troca, receberá ajuda financeira e apoio à sua pretensão de entrada no bloco dos vinte e oito Estados membros. Assim, o governo turco foi pressionado pela UE e pela Alemanha para rejeitar sistematicamente imigrantes não sírios, e a tomar medidas para combater o contrabando, tendo chegado a uma plataforma de entendimento. A sua implementação, apesar das contrapartidas tentadoras irá ser muito difícil, pois o seu conteúdo, tem por objectivo terminar com a crise de imigração que assoma a Europa. As estratégias implementadas para reduzir a quantidade de pessoas que fogem para a Europa fracassaram. A Turquia concorda em aceitar todos os imigrantes resgatados, em águas internacionais pela missão da NATO. O presidente do Conselho Europeu, advertiu que as portas da Europa se encerravam para todos os que não estavam a ser perseguidos, e assim, em conformidade com tal aviso, a Europa implementará o seu sistema de devolver os imigrantes sem condições de poderem obter o estatuto de refugiado. É de notar que cerca de duas mil pessoas chegam diariamente, às ilhas gregas, sendo metade de não sírios, e em 2016, chegaram por mar aos países europeus, um milhão e duzentos mil imigrantes. O acordo com a UE é muito sedutor, pois a Turquia recebe o equivalente a seis mil e seiscentos milhões de dólares para deter os refugiados; visto para os seus cidadãos poderem entrar nos Estados membros e negociações para integrar a UE. A Turquia para controlar as entradas dos imigrantes, como contrapartida, recebe muito mais do que lhe foi oferecido há seis meses. A questão dos refugiados ameaça a unidade europeia, e provoca uma enorme e não prevista crise. O acordado menciona que cada refugiado que a Turquia leve para o seu território da Grécia, a UE aceitará um refugiado sírio, tendo começado a produzir efeitos, desde 17 de Março de 2016, e não para momento posterior a ser negociado, como se tem vindo a afirmar. O acordado só não estaria em vigor nessa data, se a Turquia por razões fortemente fundamentadas e reais, apresentasse novas exigências. É uma aposta colossal que veio comprometer o futuro político do chanceler alemã, como era de prever. O estreitar de relações com a Turquia, trouxe um profundo descontentamento a diversos Estados membros, pois o seu governo, diariamente, torna-se mais autoritário, e no momento das negociações, privou do exercício de actividade um jornal opositor. O acordo significa um retorno em massa de refugiados que enchem os alojamentos provisórios de toda a Grécia, e obrigam a implementar medidas de segurança excepcionais nos Balcãs, Hungria, Eslováquia e Áustria, permitindo que a UE se concentre nos seus problemas económicos, em especial na falta de crescimento e recessão. A maioria dos Estados membros da UE estão incomodados por um acordo cozinhado exclusivamente entre a Alemanha e a Turquia, à margem das instituições da UE, que previam estar a trabalhar no acordo. A Alemanha teve eleições regionais a 13 de Março de 2016, tendo a extrema-direita populista ganho à direita, e o líder conservador da “União Social – Cristã da Baviera (CSU, na sigla em língua alemã) ” e primeiro-ministro do estado da Baviera, ter renovado os seus ataques à chanceler alemã, aquando do seu triunfo nas eleições. A CSU é meio-irmão da “União Democrata – Cristã (CDU, na sigla em língua alemã) ” da chanceler alemã, prometendo retomar a sua luta contra a política de refugiados do governo federal, após o enorme avanço do partido anti-imigração “Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em língua alemã) ”, com três anos de existência, ter obtido resultados inéditos nas eleições, sendo no estado federado da Saxónia – Anhalt de 22,8 por cento dos votos. O que aconteceu nas eleições regionais não pode ser ignorado, pois tratou-se de um movimento tectónico na paisagem política alemã, tendo aumentado as pressões sobre Angela Merkel, que tudo fez para conseguir apoio à sua política de portas abertas aos refugiados, antes de começar o Conselho Europeu de 17 e 18 de Março de 2016, que iria aprovar os resultados da “Cimeira da União Europeia e Turquia”, realizada a 7 de Março de 2016, e o subsequente acordo, resultado de intensas e difíceis negociações continuadas após a Cimeira. A Alemanha promotora do acordo com a Turquia provocou não apenas uma desusada tensão política interna, mas também dentro da UE. O acordo estabelece que a Turquia aceita que a UE lhe devolva todos os imigrantes que cheguem de forma ilegal, com as contrapartidas anteriormente discutidas e aceites. A chanceler alemã fiel à sua ideia, respondeu a todos os ataques, prometendo manter a sua posição, e sem contar, sofre uma importante derrota frente ao partido anti-imigração. Tal resultado afirma claramente que o discurso populista encontra uma terra de cultivo ideal para os alemães expressarem o seu descontentamento com a entrada de um milhão de refugiados, atribuindo-lhes todas as dificuldades porque passa a Alemanha e toda a UE. A Alemanha perdeu apoio e controlo na Europa. O gatilho para fazer explodir a bomba foi a invasão de imigrantes. A política de portas abertas para os refugiados ressoa por todo o mundo. O pré-candidato republicano Donald Trump, considerado como um dos perigos globais, afirmou que a Alemanha era um desastre e muitos líderes europeus, especialmente da Europa de Leste, partilham a mesma opinião, e por tal razão, a extrema-direita ganhou as eleições regionais. É estranho que a reacção não se tenha produzido antes, se pensarmos que a Alemanha recebeu mais de um milhão de refugiados, em menos de um ano. Além do assunto dos refugiados, é evidente que a posição de Angela Merkel, cada dia se debilita mais no cenário mundial. O ano passado, por contraste, encontrava-se no apogeu do seu poder, e quinze dias antes, negociou um rápido, desesperado e instável acordo com a Turquia para travar a entrada de refugiados na Alemanha, e como resultado perdeu as eleições. A perda de autoridade sofrida, quer na Alemanha, como na Europa, alimentam-se mutuamente, porque a incapacidade de deter a entrada de refugiados na Europa, desgastou o apoio que tinha no seu país, e os eleitores começaram a virar-lhe as costas. A ideia de que os turcos possam entrar sem visto na Europa, desagrada fortemente o presidente francês, e as críticas intensificaram-se até à realização do Conselho Europeu. Todavia, muitas da críticas são profundamente injustas, pois a Alemanha não é responsável pela guerra civil na Síria, nem pela existência do Estado Islâmico e ressurgimento dos talibãs no Afeganistão. Os resultados das eleições regionais na Alemanha são uma clara penalização para os dois grandes partidos que dominam a vida política alemã há setenta anos, a CDU de Angela Merkel e o “Partido Social-Democrata Alemão (SPD, na sigla em língua alemã) ” devido às suas políticas de abertura aos refugiados, mas também para a UE.