Donald Tsang

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]ex Chefe do Executivo de Hong Kong, Donald Tsang Yam-kuen, foi formalmente acusado pela Comissão Independente Contra a Corrupção (ICAC) com base em duas ofensas à lei, praticadas durante o período do seu mandato.
Em 2012 surgiram rumores de que Donald Tsang receberia subornos de representantes de grandes interesses económicos. À época foi ventilado que teria feito diversas viagens na companhia de grandes magnatas, nos seus jactos e iates privados, e que tinha alugado um apartamento de luxo em Shenzhen, já a preparar a retirada do governo.
A decisão de levantar o processo surgiu após um período de investigações que se estendeu por três anos. Em Setembro de 2014 o antigo Procurador Geral de Hong Kong, o Sr. Grenville Cross, afirmou que a lentidão da investigação “poderia vir a figurar nos Recordes do Guinness”. O cargo de Procurador Geral, em Hong Kong, está dependente da Secretaria Geral de Justiça. De acordo com o artigo 63 da Lei Fundamental de Hong Kong, a decisão de formalizar uma acusação criminal é, apenas e exclusivamente, da competência da Secretaria Geral de Justiça. Nenhum organismo poderá interferir nas decisões tomadas por esta Secretaria no que respeita a acusações criminais. Na medida em que as relações de trabalho entre o Chefe do Executivo e a Secretaria Geral de Justiça são muito próximas, para que não haja suspeitas desnecessárias, a Secretaria Geral autorizou o Procurador Geral a tomar a decisão de acusar, ou não, Donald Tsang.
Depois de Grenville Cross se ter retirado do cargo, em Junho de 2015, o Sr. Keith Yeung Kar-hung, o actual Procurador Geral, anunciou que a decisão final seria conhecida nos três meses seguintes.
Esta promessa veio efectivamente a cumprir-se. No dia 5 de Outubro de 2015 assistimos à acusação formal de Donald Tsang.
As implicações deste caso são da maior importância, quer para a sociedade civil de Hong quer para os seus funcionários públicos.
Em primeiro lugar, o caso de Donald Tsang constitui um bom exemplo, para fazer recordar a todos os funcionários governamentais de Hong Kong, o significado dos termos “má conduta” e “declaração de conflito de interesses”. Como é do conhecimento geral, em Hong Kong, depois da reunificação, os casos de suborno e corrupção, e outras más condutas envolvendo funcionários públicos, têm vindo a aumentar. O caso de Donald Tsang é o mais “famoso” já que foi Chefe do Executivo de Hong Kong. Ocupou o mais alto cargo oficial. Esta situação é, até certo ponto, um alerta a todos os funcionários públicos para que não lhe sigam o exemplo. É um indicador de que o governo quer manter Hong Kong afastado de casos de suborno e os seus funcionários públicos longe de “más condutas”.
Em segundo lugar, pensando nos residentes de Hong Kong, a formalização desta acusação aumenta a confiança da população. Faz passar, de forma clara, a mensagem de que a Lei se destina a julgar os procedimentos individuais na sociedade. A Lei irá tratar todos por igual, quer o individuo ocupe um importante cargo governamental, ou quer seja apenas um simples cidadão de Hong Kong. Decorre, pois, que a noção de Estado de Direito é uma pedra basilar da sociedade de Hong Kong. O governo permite que sejam as instâncias judiciais a lidar com estes assuntos.
Em terceiro lugar, Hong Kong está actualmente a enfrentar diversos problemas sociais, como por exemplo, aumento de preços, piores condições económicas – devido ao decréscimo de turismo da China continental, etc. O caso de Donald Tsang pode ajudar os cidadãos de Hong Kong a esquecer estes problemas por algum tempo.
Donald Tsang compareceu a tribunal na tarde de 5 de Outubro. Embora o procedimento judicial já se tenha iniciado, Donald Tsang não é obrigado a prestar depoimento perante os juízes no primeiro dia do julgamento. No primeiro dia, o tribunal limita-se a fazer cumprir certas formalidades, que o réu tem de presenciar. A próxima sessão terá lugar a 11 de Novembro.
Se Donald Tsang for condenado, poderá sofrer graves consequências. Pode ver-se privado da reforma de aposentação, à volta de 80.000 dólares de Hong Kong mensais. Além disso, pode também ver fugir o título honorífico “Grand Bauhinia Medal” (GBM) com o qual tinha sido agraciado. O GBM é um título muito prestigiado em Hong Kong. O titular do GBM é convidado pelo governo de Hong Kong para participar em todos os eventos de destaque; por exemplo, a festa promovida pelo governo a 1 de Outubro para celebrar a fundação da República Popular da China. Este título também abre as portas do Primeiro Acesso no aeroporto de Hong Kong. O Primeiro Acesso é uma passagem destinada apenas às elites de Hong Kong. Sempre que a pessoa distinguida com esta honra está a chegar ou a partir de Hong Kong, os serviços de alfândega tratam a inspecção da sua bagagem à parte. Estes benefícios podem ser-lhe retirados se a sua culpa for provada. A decisão de privação de benefícios é da responsabilidade do actual Chefe do Executivo, Sr. Leung Chun-Ying.
Antes da reunificação, Donald Tsang também tinha sido distinguido com o título “Knight Bachelor” (KB). Esta distinção foi herdada do sistema honorífico britânico. O título confere ao seu portador a categoria de “Sir”. No website “Wikipedia” lê-se o seguinte:
“É o degrau mais baixo para quem é armado Cavaleiro pelo Monarca e não pertence a qualquer das Ordens de Cavalaria. Os Knights Bachelor são os Cavaleiros britânicos mais antigos (esta categoria já existia no séc. XIII no reinado de Henrique III), mas os Knights Bachelor encontram-se abaixo de todos os Cavaleiros de outras ordens.”
Se Donald Tsang for condenado perderá o título de Knight Bachelor. Se for o caso, será lamentável porque vai perder tudo.
Será que Donald Tsang vai ser considerado culpado? Ninguém sabe. Só precisamos acreditar que as nossas instâncias judiciais irão proporcionar a Donald Tsand um julgamento justo. Estejamos atentos para ver o que o futuro nos reserva.

* Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau

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