Angeline Silva, educadora de infância: “A oportunidade que nunca tive”

[dropcap style=’circle’]É[/dropcap]o olhar mais recente que a equipa do HM tem a oportunidade de partilhar. Chama-se Angeline Silva, mas é por Angie que a tratamos. Foi em Fevereiro que visitou pela primeira vez Macau.
“O meu marido veio trabalhar para um projecto aqui em Macau”, começa por explicar. Um projecto que deu frutos e abriu a porta à possibilidade de Angie se ficar pelo território.
“Vir para Macau tornou-se um objectivo pela presença do meu marido aqui, isso e a falta de oportunidades em Portugal”, partilha. A conversa começou logo ali, num parque exterior carregado de baloiços e risadas de mais de 20 crianças. Um choro aqui, um corrida para ali, o ambiente não podia ser mais descontraído e isso era evidente na cara de Angie: as crianças são a sua praia.
“Tenho de colocar os meus meninos na aula de Mandarim, já volto”. É assim que a educadora de infância interrompe a conversa com o HM. Ao seu lado uma criança chorava, outra sentava-se no chão sem vontade de parar de brincar. Em Inglês, Português e noutras expressões que, para nós, são difíceis de perceber, Angie coloca ordem na turma e todos focam a atenção na aula que ia começar.

Oportunidade de ouro

“Adoro o que faço”, reinicia a conversa, explicando que as aulas começaram há poucas semanas e que todas as crianças ainda estão em fase de adaptação. “São muito pequeninos, é uma nova fase da vida deles é normal”, explica quando percebe que à nossa volta estavam pelo menos três crianças a chorar.
Numa sala que parecia de contos encantados, em cadeiras para pessoas de tamanho pequeno, a educadora mostra o brilho do olhar típico de quem acabou de aterrar no território.
“Gosto muito de estar cá, não tive medo nenhum em vir viver para aqui”, indica. A verdade, confessa, é que Macau deu à educadora “a oportunidade que Portugal nunca deu”. Angie está a fazer o que realmente gosta: ser educadora de infância, algo que nunca conseguiu naquele país.
“A crise, mais a vontade de estar com o meu marido, trouxe-me aqui. E gosto”, partilha.
Num cenário cheio de cor, numa mesa com sete pratos pequenos, sete colheres e sete guardanapos para um almoço que iria acontecer num par de horas, Angie ri-se ao contar que está em fase de adaptação.

Sim, Yes, Ci

Um dos maiores desafios que esta aventura lhe trouxe foi a multiculturalidade existente na turma pela qual é responsável. “Aquilo fala-se em Chinês, Inglês e Português, tem sido um desafio. Quando dou por mim estou a dizer ‘sim’ e olho para o lado e digo ‘yes’”, relata.
A sua turma tem meninos chineses que nada falam em Inglês e por isso Angie tem-se esforçado para captar e aprender a língua, permitindo uma comunicação para além de gestual com essas crianças. “Já vou percebendo palavras soltas, já reconheço alguns sons e sei o que eles querem dizer com isso, mesmo que não os consiga perceber. Mas quero tentar aprender a língua local”, adianta. O jardim de infância proporciona a cada sala uma auxiliar intérprete para melhor facilitar a comunicação, algo que tem sido uma ferramenta muito útil.

Mudam-se os hábitos

O trânsito é de facto o que mais estranheza lhe causa. “Nunca vi um sítio assim, mesmo que tente não sei explicar como é que eles conduzem. Os taxistas… Já para não falar dos condutores de autocarros em que as pessoas, com as travagens bruscas, com os buracos, balançam como bailarinas”, relata, entre gargalhadas.
A massa populacional é também uma novidade para a educadora. “Nunca vi tanta gente em ruas tão pequenas e parece que eles se movem de forma automática, nem olham para os lados ou para a frente, e se for preciso vão contra as pessoas”, brinca.
O mar, esse é o que mais falta lhe faz. “Vivia perto do mar, tenho uma ligação muito forte com o mar. Sempre que me sentia triste, ou precisava de pensar em alguma coisa, ou só porque sim, ia passear à beira-mar, ia ver o meu mar. Aqui não posso fazer isso”, anota.
Curiosamente, Angie conseguiu encontrar um substituto para o seu mar. É um espaço que não se assemelha a ele, mas que o substituiu. O Bellini. “Eu sei que é estranho, mas agora é um ritual. Todas as quartas feiras vou àquele bar, dançar, ouvir música. Descontrai-me”, anota. Entre passos de dança e rodopios, Angie vai-se adaptando ao novo mundo que a acabou de receber.

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