“Aprende com o material geológico sob os teus pés”

* Mário Duarte Duque

[dropcap style=’circle’]”[/dropcap]Aprende com o material geológico sob os teus pés” era a proposição 33 das 50 Ideas for the New City, in The Urbanomnibus net, 2011 [https://urbanomnibus.net/ideas/].
Proposição que assentava no princípio de que o que permite fazer melhores escolhas sobre o modo de construir é a compreensão sobre a constituição e sobre o modo como os impactos do tempo geológico afectam o nosso ambiente edificado.
Tais processos, designados por geomorfológicos, desenvolvem-se em diferentes escalas de tempo e de espaço, que tanto podem respeitar a uma região como apenas a um local dessa região, mas também processos que tanto se podem manifestar num instante, como numa escala temporal tão dilatada que os tornam imperceptíveis ao longo de gerações.
Disso resulta que a interpretação e a definição desses enquadramentos geográficos e temporais, constitui uma base de conhecimento próprio que é intrínseca e essencial desenvolver e organizar em cada localização urbana.
Ou seja, o património geológico faz parte da tradição urbanística e física dos lugares, tal como a paisagem edificada e a paisagem natural sobre as quais já recaem convenções de protecção. Por isso, o património geológico, no qual também se inclui o património hídrico, deveriam ser igualmente contemplados como acervo de um grupo cultural. 22915P17T1
Chegados aqui, a entrevista do Sr. Eng. Lee Hay Ip publicada ontem neste jornal, é pertinente porque não só denuncia a falta de sensibilidade para as questões da geotecnia na RAEM, mas também, senão principalmente, denuncia ignorância dos actuais habitantes da RAEM no que diz respeito a essa realidade que é intrínseca à cultural local.
Em verdade, o conhecimento de que era lodo, grande percentagem do solo no local designado hoje para o parque de materiais e oficina do metro ligeiro, poderá ter sido uma incógnita para o Gabinete para as Infra-Estruturas de Transportes (GIT), mas já não seria incógnita para qualquer pescador da região com 60 anos, que poderia assegurar que já não era possível aproximar-se de barco do istmo entre taipa e Coloane, antes da construção do aterro do COTAI, exactamente por causa do lodo.
Como está ao alcance de qualquer um interpretar que as encostas de granito da ilha da Taipa descem até ao actual aterro do COTAI, aí afundam, para voltar a emergir na ilha de Coloane. E que, assim sendo, é sob o COTAI que está o vale mais profundo dessa formação rochosa e onde terão que se cravar as estacas mais profundas. Tirando pela distância entre as ilhas, por mera lógica morfológica, admitir-se-ia até que tais estacas fossem as mais profundas que alguma vez se cravaram na RAEM.
Mas também nada que qualquer empreendimento efectuado em torno não pudesse confirmar em função das prospecções que necessariamente tiveram que mandar efectuar ao solo.
E é assim que, em vez de as sociedades desenvolverem soluções mais adequadas e melhor suportadas no que já deveriam conhecer, protelam tais soluções, porque primeiro há que recuperar o que entretanto desaprenderam.

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