Líderes estudantis de Hong Kong detidos por “defenderem terrorismo”

A polícia de Hong Kong deteve esta quarta-feira três líderes estudantis universitários, acusados de “defenderem o terrorismo”, noticiou a imprensa local. Entre os detidos estão o presidente e mais dois responsáveis do sindicato dos estudantes da Universidade de Hong Kong.

Os três terão participado numa reunião, no mês passado, durante a qual foi aprovada uma moção que lamentava e “apreciava o sacrifício” de um homem que apunhalou um agente da polícia e depois se suicidou, em 01 de julho.

Perante as críticas à moção, aprovada em 07 de julho, com 30 dos 32 presentes a votar a favor, o sindicato decidiu retirá-la, mas a universidade proibiu este mês o acesso ao ‘campus’ dos participantes na reunião.

O presidente do sindicato estudantil, Charles Kwok Wing-ho, de 20 anos, repudiou mais tarde a moção, considerando-a como “extremamente inapropriada”, enquanto outros líderes do movimento estudantil apresentaram desculpas.

De acordo com o diário South China Morning Post, a polícia considerou o ataque um “acto terrorista” de um “lobo solitário”. Em meados do mês passado, agentes das forças de segurança invadiram as instalações do sindicato de estudantes, no âmbito de uma investigação sobre se o grupo tinha defendido ou incitado o terrorismo.

Ao abrigo do artigo 27.º da lei da segurança nacional de Hong Kong, que Pequim impôs ao território no ano passado, os acusados de incitar ou defender o terrorismo enfrentam uma pena de prisão entre cinco a dez anos, “se as circunstâncias da infração (…) forem de natureza grave”. A lei também prevê penas de prisão perpétua para actos de secessão, terrorismo ou conluio com forças estrangeiras.

19 Ago 2021

Covid-19 | Académico considera que Hong Kong não se preparou para a pandemia

No livro “Coronavirus Politics: The Comparative Politics and Policy of COVID-19”, lançado recentemente, John P. Burns, professor da Universidade de Hong Kong, defende que continua a falhar em Hong Kong cooperação entre o sector público e privado de saúde. O académico acredita que reformar o sistema fiscal facilitaria a missão do sector da saúde no acesso a financiamento

 

Apesar de ter lidado com a SARS em 2003, as autoridades de Hong Kong não demonstraram capacidade para lidar com a pandemia da covid-19. A conclusão é do académico John P. Burns, professor do departamento de política e administração pública da Universidade de Hong Kong, no livro “Coronavirus Politics: The Comparative Politics and Policy of COVID-19”. Recentemente publicado, a obra traça o panorama de como vários países lidaram com a pandemia nos últimos meses.

John P. Burns conclui, assim, que “Hong Kong aprendeu com a sua experiência com a SARS-1” mas “a preparação foi incompleta”. “Com a preparação obtida por parte de especialistas e burocratas, os planos revelaram a falta de reforma de um sistema de finanças públicas [que vigora] desde o período colonial e um sistema de saúde frágil e com pouca capacidade para cooperar com o serviço público de saúde”, pode ler-se.

O académico considera que “o sistema político de Hong Kong provou ser incapaz de produzir líderes políticos capazes de uma mudança”. Ainda assim, esse mesmo sistema levou “à prevenção da ocorrência de divisões políticas profundas e de uma desconfiança em relação ao Governo”.

O HM contactou John P. Burns no sentido de estabelecer um paralelismo com a forma como Macau lidou com a pandemia da covid-19, mas o académico recusou por nunca ter estudado a situação em Macau.

Neste momento, Hong Kong tem a situação epidémica bem mais controlada, mas corre o risco de ter de deitar fora milhões de vacinas contra a covid-19 dada a desconfiança da população. Apesar de ter conseguido adquirir vacinas para toda a população, actualmente contabilizada em 7,5 milhões de pessoas, apenas 1,2 milhões de vacinas foram administradas. Segundo a agência AFP, 19 por cento da população recebeu a primeira dose da vacina da Pfizer-BioNtech, tendo 14 por cento completado a vacinação. Tanto as autoridades de Hong Kong como de Macau continuam a analisar a possibilidade de reabertura de ligações entre os dois territórios, embora não haja ainda uma data concreta para isso acontecer.

Eficiência não chega

John P. Burns recorda que Hong Kong possui um dos mais eficientes sistemas de saúde do mundo, mas que, ainda assim, não conseguiu travar “um surto comunitário descontrolado de covid-19”. Desde Janeiro de 2020, e durante cinco meses, “Hong Kong teve apenas seis mortes por covid-19”. No entanto, “a 26 de Agosto de 2020, Hong Kong registava 4,736 casos confirmados ou prováveis e 78 mortes nas três vagas de infecção por covid-19”.

Apesar da reforma das instituições implementada depois da ocorrência da SARS, continua a prevalecer um sistema de financiamento da saúde que é alvo de críticas do académico.

“Os sucessivos governos em Hong Kong estabeleceram um sistema de saúde público-privado”, em que o sistema público, gerido pela Autoridade Hospitalar (HA, na sigla inglesa), providencia cerca de 90 por cento de serviços a todos os residentes que necessitam de cuidados médicos a um preço “acessível”. Uma rede de 43 hospitais, com 40 por cento dos médicos locais opera este sistema, descreve o autor do artigo, citando dados da HA relativos a 2020. Enquanto isso, o sector privado providencia cerca de 70 por cento de cuidados médicos pagos para residentes, além de que o HA “disponibiliza [os restantes tratamentos] através de clínicas públicas, de novo com a cobrança de uma taxa nominal”.

No entanto, John P. Burns lembra que “o sistema da HA enfrenta uma crónica falta de profissionais de saúde públicos, e os pacientes enfrentam longas listas de espera para serviços não urgentes”. O académico traça depois uma ligação com a falta de reforma do sistema fiscal, uma vez que “apenas 40 por cento da população empregada paga impostos sobre os seus salários e apenas dez por cento dos empresários pagam impostos”.

“Nem os empregadores nem os empregados em Hong Kong contribuem para o esquema de seguros de saúde obrigatório. Think-tanks fundados por empresários argumentam que o sistema público de saúde é financeiramente insustentável tendo em conta os actuais níveis de serviço, acessibilidade e receitas”, pode ler-se.

Embora o Governo de Hong Kong conceda subsídios à HA, e mesmo com os “investimentos substanciais a nível financeiro e de infra-estruturas na preparação da epidemia da SARS-1”, o autor lembra que “o sistema de saúde pública baseado em hospitais é frágil e financeiramente insustentável”.

“Em finais de Agosto de 2020, Hong Kong tinha gerido os três surtos de covid-19 de uma forma relativamente bem-sucedida. Este resultado partiu da experiência de Hong Kong com a SARS-1”, escreveu o autor, alertando, no entanto, para o peso excessivo da burocracia sistemática e “investimento suficiente em saúde para apoiar um frágil sistema público de saúde”.

Um difícil cenário político

John P. Burns destaca também o facto de Hong Kong ter vindo a lidar com a crise pandémica num contexto de “baixa confiança no Governo”, embora “a saúde pública não se tenha tornado, em grande parte, numa questão política”, devido ao espírito comunitário na luta contra a pandemia.

“A experiência de Hong Kong com a SARS preparou a população de Hong Kong para meses de uso de máscara, mais cuidados com a higiene pessoal e distanciamento social”, descreve o autor. “Os hong kongers são pragmáticos e procuram proteger-se a si mesmos e às suas famílias. São geralmente cumpridores da lei e a gestão das regras de combate à covid-19 foi feita de acordo com a lei. O respeito pelos especialistas e a pressão dos pares também contribuiu para este resultado, que foi largamente afectado por profundas divisões políticas, meses de protestos anti-Governo e falta de confiança no Governo”, analisou John P. Burns.

E na China?

O livro aborda também a resposta da China em relação à covid-19 através da análise feita por Victor C. Shih, um economista político autor de várias obras sobre o país. No capítulo “China’s Leninist response to covid-19 – From Information Repression to Total Mobilization”, o autor considera que a forma bem-sucedida como o país lidou com as piores fases da pandemia está relacionada com a forma como a Administração Pública está organizada, ou seja, fortemente ligada às estruturas do Partido Comunista Chinês (PCC).

“Além da estrutura leninista do partido, o esforço para controlar contágios foi apoiado fortemente por organizações pró-estatais e comités comunitários onde o partido decretou a implementação de objectivos relacionados com [o cumprimento] da quarentena. Sem este esforço frenético, os resultados na China teriam sido muito piores”, considera o autor.

Além disso, Victor C. Shih destaca também “o programa de vigilância digital que facilitou a monitorização dos contactos”, embora “não tenha tido um papel decisivo no controlo da covid-19 na China”.

Segundo o autor, as regras do PCC acabaram por desempenhar um papel importante na gestão da pandemia. “Assim que a mobilização para travar os contágios foi decretada, as autoridades locais ficaram de imediato sob uma enorme pressão por parte das autoridades superiores para implementar o regime de quarentena tanto ao nível da província como dos bairros [urbanos]”, conclui-se.

27 Mai 2021

Universidade de Hong Kong expulsa Benny Tai, figura do movimento Occupy Central, e provoca indignação

[dropcap]A[/dropcap] demissão do professor universitário e figura proeminente do movimento pró-democracia de Hong Kong Benny Tai, conhecida ontem, está a provocar indignação contra as pressões de Pequim na antiga colónia britânica.

O professor de direito, de 56 anos, disse que foi afastado por uma comissão disciplinar da Universidade de Hong Kong (HKU), depois de já ter sido preso, no ano passado, por participar nos protestos pela defesa de direitos, liberdades e garantias.

O Gabinete de Ligação, que representa o governo central da República Popular da China em Hong Kong, saudou o afastamento do professor e disse hoje através de um comunicado que Benny Tai “é uma pessoa maléfica”.

A demissão do académico provocou consternação e indignação entre os ativistas da região administrativa especial, marcada por meses de contestação sem precedentes contra Pequim, que impôs recentemente a nova lei de segurança nacional que fere os direitos, liberdades de garantias em Hong Kong.

“Benny Tai é um mártir da desobediência civil”, afirmou Joseph Chan, professor de ciências políticas da Universidade de Hong Kong através de uma mensagem no Facebook. “A universidade de Hong Kong está a sacrificar a própria reputação e fica impedida de ‘levantar a cabeça’ perante a comunidade académica mundial” acrescentou Chan considerando a demissão de Benny Tai “uma grande mancha” na história da instituição.

Sophie Richardson, da secção China da organização não-governamental Human Rights Watch, disse que as universidades de todo o mundo devem rever as relações com a Universidade de Hong Kong. “Chegou a altura para que sejam levantadas vozes contra o escândalo”, disse Richardson numa mensagem dirigida aos universitários.

“Pequim começou agora a atacar as liberdades académicas de Hong Kong”, disse Joshua Wong, figura do movimento de contestação estudantil contra Pequim.

Benny Tai apelou ontem, através da plataforma digital Facebook, para que a chefe do Executivo da Região Administrativa Especial de Hong Kong impedisse o processo de demissão. “Carrie Lam não pode alhear-se das responsabilidades que tem na erosão das liberdades académicas em Hong Kong”, escreveu Benny Tai acusando Pequim de pressão direta na decisão da universidade.

Tai é uma figura popular do campo pró-democrata em Hong Kong, defensor da não-violência e fortemente criticado pelas autoridades. A Universidade de Hong Kong, por seu turno, ainda não explicou os motivos que provocaram a expulsão de Benny Tia nem responde às perguntas dos jornalistas. Benny Tai foi um dos fundadores do movimento “Occupy Central”, em 2013.

Em 2019, Tai foi condenado a 16 meses de prisão por “responsabilidade e envolvimento” nos movimentos de contestação.

Recentemente o professor de Direito esteve envolvido na organização das primárias que escolheram os candidatos pró-democracia para as eleições de setembro em Hong Kong. Mais de 600 mil pessoas participaram na votação considerada ilegal pelo Executivo local tendo o Gabinete de Ligação acusado “o ‘gang’ de Benny Tai de tentar provocar uma revolução”.

30 Jul 2020

Covid-19 | Infectados podem contagiar outras pessoas vários dias antes dos primeiros sintomas, conclui estudo

[dropcap]A[/dropcap]s pessoas infectadas com o novo coronavírus podem contagiar outras vários dias antes de surgirem os primeiros sintomas da doença covid-19, indica um estudo publicado pela revista Nature Medicine, que defende um alargamento no rastreamento de contactos. O estudo foi desenvolvido por uma equipa da Universidade de Hong Kong.

Uma das medidas que está em vigor em vários países afetados pela pandemia de covid-19, como Portugal, é o rastreamento de contactos, ou seja, a procura de pessoas que estiveram em contacto com um doente a partir do momento em que testou positivo para o novo coronavírus, mas os investigadores defendem que esse universo deve ser alargado às pessoas que tiveram contacto nos dias anteriores à doença ser detectada.

“Devem ser levados em consideração critérios mais inclusivos no que toca ao rastreamento de contactos, para identificar possíveis focos de transmissão dentro dos dois ou três dias anteriores ao início dos sintomas”, realçam os autores do estudo, sublinhando que tal permitirá “controlar a epidemia com mais eficiência”.

Para chegar a esta conclusão, a equipa de investigadores, co-dirigida por Eric Lau, da Universidade de Hong Kong, comparou dados clínicos sobre a disseminação do vírus em pacientes internados num hospital em Guangzhou, sul da China. A pesquisa levou à recolha de amostras da garganta de 94 doentes, tendo sido medido o grau de contágio do vírus desde o primeiro dia de sintomas e por 32 dias. A descoberta é que os doentes, nenhum em estado grave ou crítico, apresentavam a maior carga viral assim que os sintomas apareciam, antes de diminuírem gradualmente.

O estudo usou também dados públicos de 77 transmissões “ponto a ponto” na China e em outros países para avaliar o tempo entre o início dos sintomas em cada paciente para chegar à conclusão de que o período de incubação é de um pouco mais que cinco dias. E também foi concluído que a infeção surgiu entre dois a três dias antes de aparecerem os primeiros sintomas, atingindo o pico da capacidade de transmissão 0,7 dias antes de os primeiros sinais da doença. Os investigadores concluíram ainda que 44% dos casos secundários nas cadeias de transmissão foram infetados durante o período pré-sintomático.

16 Abr 2020

Hong Kong | Estudo revela maioria a favor do casamento gay. Em Macau não há dados

Um estudo do Centro de Direito Público Comparado da Universidade de Hong Kong revela que 50,4 por cento dos inquiridos concorda com a legalização do matrimónio entre pessoas do mesmo sexo e com a igualdade direitos. Em 2013, apenas 38 por cento concordava com a legalização do casamento gay. Em Macau não há dados oficiais, numa sociedade que permanece conservadora, segundo activistas locais

 

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m quatro anos muito mudou no que diz respeito à atitude que a sociedade de Hong Kong tem em relação à comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero). Um estudo ontem divulgado pelo Centro de Direito Público Comparado da Universidade de Hong Kong revela que cerca de metade dos inquiridos, ou seja, 50,4 por cento, concorda com a legalização do casamento homossexual na região vizinha. Em 2013, apenas a 38 por cento dos inquiridos se mostrava a favor, “uma minoria de residentes”, apontam os autores do estudo.

O trabalho desenvolvido teve como objectivo estabelecer um termo de comparação com os dados de há quatro anos atrás, com a diferença de que, o ano passado, os investigadores decidiram perguntar às pessoas se concordavam com a inclusão dos casais do mesmo sexo no pedido de visto de permanência em Hong Kong, no caso de um dos parceiros ser natural da RAEHK.

“Um total de 53 por cento dos inquiridos concorda que homossexuais e lésbicas de Hong Kong devem poder pedir um visto para os seus parceiros de longo termo que vivem no território. 18 por cento mostraram-se neutros, enquanto que 29 por cento concordaram”, lê-se no documento divulgado na página oficial do centro da Universidade de Hong Kong no Facebook.

Holning Lau, Charles Lau, Kelley Loper, Yiu-tung Suen, os autores do estudo, apontam alguns factores para esta mudança de atitude. “É importante realçar que, no período que separou os dois inquéritos, os tribunais de EUA e Taiwan consideraram ser inconstitucional excluir os casais do mesmo sexo do casamento. Estes desenvolvimentos fizeram muitas manchetes em Hong Kong e podem ter contribuído para uma mudança na opinião pública.”

Os autores apontam ainda para o facto das opiniões não estarem directamente relacionadas com questões morais, uma vez que os dados são diferentes no que diz respeito à aceitação da homossexualidade e do casamento gay.

“É interessante observar que, tanto em 2013 como em 2017, a percentagem de pessoas que aceitavam muito ou de forma moderada os homossexuais e lésbicas é menor do que a percentagem de pessoas que disse que os casais do mesmo sexo deveriam, pelo menos, ter os mesmos direitos dos casais heterossexuais. Esta discrepância pode sugerir porque os indivíduos em Hong Kong não formam as suas opiniões sobre direitos legais com base nas suas crenças privadas e morais.”

Na visão dos autores, “os indivíduos podem opor-se à homossexualidade com base nas suas convicções religiosas mas, ao mesmo tempo, podem acreditar que as leis de Hong Kong deveriam basear-se em noções seculares de igualdade e aceitam os direitos dos casais do mesmo sexo”.

Apesar da homossexualidade continuar a não ser bem aceite em muitos países, os investigadores defendem que a mentalidade da sociedade de Hong Kong está a ir numa direcção mais positiva do que negativa.

“Estudos recentes sugerem que a aceitação da comunidade gay e dos seus direitos tem vindo a aumentar em muitas partes do mundo. Contudo, o mundo também tem vindo a polarizar-se neste sentido, com a aceitação a diminuir em alguns países. A nossa investigação sugere que o padrão de mudança de Hong Kong está relacionado com a o padrão global e maioritário de uma aceitação crescente.”

Direitos para todos

Este trabalho foi realizado entre 12 de Maio e 6 de Junho do ano passado, com uma amostra de residentes de Hong Kong com mais de 18 anos. Um total de 1437 pessoas completaram o inquérito em cantonês e inglês. No geral, 78 por cento dos inquiridos acredita que os “casais do mesmo sexo deveriam ter, pelo menos, alguns dos direitos de que usufruem os casais heterossexuais, comparando com os 73 por cento registados em 2013”.

“Concluímos que, na questão sobre a aceitação social, que houve um significativo aumento estatístico na percentagem de pessoas que afirmam aceitar homossexuais e lésbicas”, acrescentam os autores, explicitando os direitos que os inquiridos gostariam de ver alargados aos casais gay. Igualdade nas visitas a hospitais, direitos legais a pedir indemnizações em caso de acidentes mortais ou acesso à herança, entre outros, foram algumas situações apontadas e que registaram também uma maior aceitação em relação a 2013.

“Em quatro anos houve um aumento significativo na percentagem de pessoas que concordam que os casais do mesmo sexo deveriam ter os mesmos direitos em todas estas áreas”, referiram os autores do estudo. Olhando para os números, 67 por cento concorda que os casais do mesmo sexo deveriam estar protegidos da discriminação ao nível da habitação. Já 72 por cento concorda que o parceiro deve ter direito a uma indemnização em situações de acidentes fatais, enquanto que 61 por cento concorda que os casais do mesmo sexo deveriam poder herdar a propriedade do outro.

A nível jurídico, a população de Hong Kong não está apenas aberta à legalização do casamento gay como também está a favor que estes casais estejam protegidos por lei em situações discriminatórias. “Um total de 69 por cento das pessoas afirmaram em 2017 que Hong Kong deveria ter uma lei contra a discriminação sexual, comparando com os 58 por cento de 2013.”

Macau, aquele deserto

O HM contactou a Associação Arco-Íris de Macau, da qual fazem parte Anthony Lam e Jason Chao, no sentido de perceber se também no território houve uma mudança de mentalidades nos últimos anos. Os únicos dados estatísticos que existem sobre a comunidade LGBT surgiram de dois inquéritos realizados pela associação, e que foram feitos com uma amostra de pessoas que pertencem à comunidade LGBT.

Foi este o motivo que levou Anthony Lam, presidente da associação, a ter dificuldades em traçar o retrato da situação na RAEM. “O estudo que fizemos há dois anos mostra que quase 100 por cento dos participantes defenderam a importância de legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo em Macau, e que a comunidade LGBT não deveria ser discriminada. As leis de Macau não protegem os casais do mesmo sexo, o casamento não é permitido e não temos direitos em termos de heranças dos nossos parceiros”, exemplificou.

Para Anthony Lam, permanece o silêncio quando se fala deste assunto. “No geral, as pessoas de Macau tendem a ser conservadoras, a ficar em silêncio, optam por manter a postura de ‘não perguntes, não respondas’. Não podemos dizer se a sociedade teve progresso em relação à aceitação dos casais do mesmo sexo nos últimos dois anos”, apontou.

Jason Chao, outro activista dos direitos da comunidade LGBT, acredita que a postura da sociedade vai mudar, mas apenas daqui a algumas décadas. Em relação a Hong Kong, apesar de se registar uma mudança na forma de pensar da população, o Governo continua a não querer legalizar o casamento.

“A semana passada tive a oportunidade de discutir a questão da legalização do casamento gay em Hong Kong com alguns dos meus colegas, e eles sabem que pode existir de facto uma maior protecção relativamente aos direitos dos casais do mesmo sexo, mas que as autoridades de Hong Kong continuam a não defender a legalização do casamento.”

Na visão de Jason Chao, o Governo Central não vai travar uma maior protecção de direitos aos casais de LGBT, mas o Executivo da RAEHK deverá seguir a mentalidade mais tradicional vinda do continente. “Não é que vá existir uma proibição clara da parte de Pequim relativamente à legalização do casamento gay, mas parece-me que há muitas autoridades mais fundamentalistas que estão a fazer o que podem para travar os desejos da comunidade LGBT.”

Tanto Anthony Lam como Jason Chao não conseguiram garantir se a Associação Arco-Íris vai realizar um novo estudo sobre este assunto. “Neste momento, não consigo supervisionar a realização de nenhum inquérito, mas deveria ser feito um novo estudo. Não sei se teremos recursos para realizar um novo inquérito”, adiantou Jason Chao, também activista político ligado à Associação Novo Macau.

4 Jul 2018

Universidade de Hong Kong | Reitor sai e fala de pressões de ordem política

O reitor da Universidade de Hong Kong, Peter Mathieson, está de saída do cargo e fala de pressões políticas da parte de “toda a gente”, incluindo membros do Gabinete de Ligação do Governo Central. Em Macau, jamais algum reitor se demitiria pelos mesmos motivos, defendem ex-docentes locais radicados em Hong Kong

 

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á quatro anos que assumia o cargo de reitor na centenária Universidade de Hong Kong, lugar que serviu de embrião à revolução dos guarda-chuvas e que sempre assumiu posições elevadas nos rankings académicos internacionais. Peter Mathieson, em entrevista ao jornal South China Morning Post, disse que se demitiu do cargo, tendo adiantado que também foi alvo de pressões políticas. O nefrologista parte agora para o Reino Unido, onde vai ser vice-chanceler da Universidade de Edimburgo.

Sofreu “pressões de toda a gente”, inclusivamente dos oficiais do Gabinete de Ligação do Governo Central em Hong Kong, que lhe davam avisos “o tempo todo”, revelou Mathieson. “Todos os dirigentes das universidades têm contactos com o Gabinete de Ligação, que tem um interesse no sistema educativo de Hong Kong, tal como em outros assuntos. Considero isso como parte do meu trabalho”, adiantou o reitor.

“Eles podem dizer-me o que acham que eu devo fazer, mas basicamente eu faço o que acredito ser melhor para os interesses da universidade. Sim, houve pressões, mas não considero isso como sendo irrazoável”, admitiu o reitor demissionário. Além disso, Mathieson disse esperar que o ensino superior na região vizinha deixe de ser tão politizado.

Peter Mathieson frisou ainda que, muitas vezes, sentiu que representava as vozes de uma minoria. “Nem sempre consegui o meu caminho no conselho, e isso levou-me a algumas situações difíceis”, adiantou.

Em entrevista ao diário de língua inglesa de Hong Kong, Peter Mathieson disse esperar que a Universidade de Hong Kong se torne mais internacional, apesar de ser importante a busca por fundos que venham do continente, além de outras parcerias com universidades internacionais, como a Universidade de Stanford ou Johns Hopkins.

“Para a Universidade de Hong Kong obtivemos uma boa posição ao trabalhar com a China, mas também conseguimos trabalhar com o resto do mundo. é um símbolo de uma colaboração internacional entre universidades semelhantes e é um sinal de respeito mútuo”, acrescentou.

O responsável adiantou ainda que a sua saída se deveu, em parte, à entrada do professor Arthur Li Kwok-cheung para os corpos dirigentes da universidade, considerado pró-Pequim. Mathieson garantiu que nunca discutiram a possibilidade de um segundo mandato, sendo que este ano o contrato de cinco anos chegaria ao fim. Perante a ausência de discussão, Mathieson resolveu avançar com a proposta que recebeu da Universidade de Edimburgo.

As limitações existem

Eric Sautedé, ex-docente da Universidade de São José, actualmente radicado em Hong Kong, afirmou ao HM que, na região vizinha, “existe liberdade académica”, uma vez que são realizados vários estudos críticos com foco na China e também em Hong Kong. “Mas isso não significa que não haja nenhuma pressão, e se existe na democrática Europa, imagine-se em Hong Kong, onde todas as universidades públicas são lideradas por um reitor que é nomeado por Pequim. Mas Hong Kong é um território internacional, com uma reputação a defender, então os membros das faculdades têm vindo a resistir a várias pressões”, frisou. Para Eric Sautedé, a situação da liberdade académica em Hong Kong “é preocupante, mas há, pelo menos, alguém para a defender ou proteger”.

Bill Chou, ex-docente da Universidade de Macau, actualmente a dar aulas na Universidade Baptista de Hong Kong, prefere recordar o recente episódio do chumbo da nomeação de Johannes Chan, académico pró-democracia, para o cargo de vice-chanceler da Universidade de Hong Kong. “É claro que a autonomia institucional das universidades de Hong Kong está em risco.”

Em relação à liberdade académica, existe mas com algumas nuances negativas. “Mas tudo depende de como definimos liberdade. Se a liberdade está relacionada com o ensino, tenho a dizer que o criticismo em relação ao Governo chinês pode levar a críticas dos alunos junto dos departamentos administrativos e a baixas avaliações dos professores. Alguns departamentos levam essas queixas a sério e avisam os professores para serem mais ‘equilibrados’. Eu próprio tive essa experiência em Macau”, referiu Bill Chou.

Arnaldo Gonçalves, professor convidado do Instituto Politécnico de Macau e jurista, defende que continua a existir liberdade académica em Hong Kong, dando como exemplo os debates que têm vindo a ser organizados pela Faculdade de Direito da Universidade de Hong Kong, sobre democracia e a Lei Básica.

Ainda assim, existem pressões, encaradas pelo académico como algo natural depois do discurso de Xi Jinping no último congresso do Partido Comunista Chinês. “Há uma alteração do tom da relação entre o Governo Central e os governos das duas regiões administrativas especiais que foi anunciado pelo presidente Xi Jinping quando foi reeleito. Ele tem a visão soberanista de que Macau e Hong Kong são China e tem uma visão leninista na forma como se relaciona com os países, a população e o aparelho da administração pública.”

Neste contexto, “o facto da desobediência civil que verificamos com a revolução dos guarda-chuvas ter partido da Universidade de Hong Kong deve ter levado as autoridades da China a pensar que têm de ter uma intervenção mais crispada e evitar manifestações mais empolgadas de espírito anti-Pequim.”

 

 

“Em Macau os reitores são completamente subservientes”

Em Macau a questão de alegadas violações da liberdade académica surgiram em 2014, quando Eric Sautedé deixou a Universidade de São José. Pouco tempo depois, o tema viria à tona com o afastamento de Bill Chou do departamento de ciência política da Universidade de Macau. Poucos anos depois ambos continuam a afirmar que a liberdade académica na RAEM é “limitada” e que jamais um reitor, quer seja de uma instituição pública ou privada, se demitiria por razões políticas.

“Os reitores em Macau são leais”, disse ao HM Bill Chou. Já Eric Sautedé lembra que o financiamento da Fundação Macau cria vários tipos de constrangimentos. “Se algum projecto for ligeiramente crítico da política de Macau ou da China, não é financiado”, referiu.

“Em Macau os reitores das instituições públicas são completamente subservientes, e na UM ainda é pior. Nas instituições privadas uma delas é gerida por pessoas que pertencem ao Conselho Executivo, enquanto que a USJ, a única instituição católica, é gerida por alguém que tem medo da sua própria sombra e que acredita que os ‘portugueses são meros convidados em Macau. Foi o que me disse quando me despediu’”, disse Eric Sautedé, referindo-se a Peter Stilwell, reitor da USJ.

Arnaldo Gonçalves faz referência ao caso da saída do reitor da UM, Wei Zhao, que estaria a ser investigado por alegado incumprimento de contrato. “Veja-se o perfil dos reitores das universidades. Veja-se o caso do ex-reitor da UM, iria haver um inquérito, já houve alguma conclusão? Não vi nada. Ele era um homem pró-Pequim, o novo assim será. Em Macau há uma obediência quase cega em relação aquilo que presumem que é a vontade de Pequim.”

Apesar de considerar que a liberdade académica está garantida na lei do ensino superior, “cada académico pode tomar uma posição de acordo com aquilo que pensa”. “Depois há as diferenças culturais. O chinês que está ligado à cultura confuciana, segue a ideia de lealdade ao chefe”, acrescentou.

Tendo em conta este ponto, Eric Sautedé lança ainda críticas à forma como os professores são recrutados. “Os processos de recrutamento são completamente opacos em Macau, enquanto em Hong Kong temos comités de investigação para preencher as vagas nas faculdades.

9 Jan 2018