Carlos Morais José Editorial MancheteUm preço barato [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]erante a chegada de milhares de pessoas às praias europeias, torna-se óbvio perguntar qual a responsabilidade do Velho Continente em relação a esta calamitosa situação. Bem vistas as coisas, temos de distinguir dois tipos de migrantes: os que vêm de África, por não encontrarem meio de subsistência na sua terra natal; e os que vêm da Síria por causa da guerra. São situações muito diferentes, como diferentes são as pessoas que constituem os dois grupos. Comecemos pelo primeiro. Durante a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século XX, a Europa colonizou África e dividiu o continente como muito bem entendeu, criando nações onde existiam tribos, quando muito esparsos reinos. Obviamente que os recursos naturais foram explorados ao máximo e as formas tradicionais de produção basicamente destruídas, como mostra o livro de René Dumont, “Em defesa de África, acuso”, um clássico dos anos 70, pretensamente esquecido pelos neo-colonialistas, amigados com os regimes ditatoriais. O autor demonstra como a fome, a miséria e o caos foram produtos da presença europeia, na medida em que foram completamente aniquiladas as formas tradicionais de poder e redireccionadas as economias. Hoje aquela gente não aguenta mais e na internet, na televisão, tem imagens de uma outra vida. Darão tudo por ela. Vêm-nos bater à porta. É natural. A nossa riqueza foi edificada sobre a sua miséria. No caso sírio, todos se lembram (espero) que a Europa de Hollande e Merkel foram os grandes incitadores das revoltas anti-Assad. Juntamente com a CIA, claro. Aramaram sem critério os ditos grupos rebeldes que, afinal, mais não eram que islamitas de vários países. Encostaram-se a uma pretensa oposição síria no exílio que, afinal, tinha o mesmo valor que a oposição no exílio do Iraque, gozada e desprezada por todos os iraquianos. Se a Europa fomentou e continua a fomentar a guerra na Síria, é natural que assuma o seu fluxo de refugiados. É mesmo elementar, meu caro Hollande, um homem com sangue de inocentes nas mãos, tomado de histeria no início da pretensa revolta árabe. A História é reversível. A Europa tem um preço a pagar pelas suas acções e pelos lucros que delas resultaram. Receber refugiados, tratá-los com humanidade e bom senso será o mais barato deles todos.