Julie Oyang h | Artes, Letras e IdeiasA chinesa sexista e o seu marido 罗敷的丈夫究竟是谁? [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hamavam-lhe Qin Luofu e o mais certo é nunca terem ouvido falar dela. Luo Fu quer dizer “uma beldade”, o que significa que podia ser qualquer mulher bela, mas os chineses sabem que pertencia à família Qin. Leiam a biografia de Luofu comigo. Na Estrada das Amoreiras A luz da manhã Ilumina a Mansão Qin, orgulhosa da sua dama, A dama Luofdamau. Alimentava os bichos da seda com folhas das amoreiras que cresciam a sul; A cassia pendia do seu cesto, presa por uma fita de seda. Cabelo lindamente entrelaçado, Brincos de pérola como raios de Lua, Jaqueta amarela, Aventalinho púrpura Quando um viajante a avistou, Pousou o seu fardo por instantes e coçou a barba. Sentiu um alvoroço quando a viu Tirou o boné e cumprimentou. O lavrador deixa de lavrar, o cavador de cavar, E quando voltam a casa, não encontram graça nas mulheres, depois de terem vislumbrado Luofu. Do sul vem um Senhor numa carruagem com cinco cavalos; Surpreendido, pára e manda perguntar, “Quem é aquela beldade, A que família pertence?” “Pertence aos Qins, E o seu nome é Luofu.” “E que idade terá?” “Menos de vinte Primaveras, mas mais de quinze.” E então, condescendente, diz, “Luofu, gostarias de entrar na minha carruagem?” Ela encara-o sem medo, e responde: “Que disparate dizeis, senhor! Tendes uma esposa, e eu, um marido. De Leste vêm cem cavaleiros e ele vem na sua frente. Como sabereis quem ele é? Pelos cavalos que monta, com sedosas caudas entrançadas E pelo pónei que o segue, Pelos chicotes dourados; e p’la espada com punho de jade à cintura, pela qual pagou milhões. Com quinze anos era guarda-livros da Prefeitura, Escrivão aos vinte, Aos trinta era ministro; E agora, aos quarenta, É Governador de Distrito. A sua pela é muito clara a sua barba comprida. Desloca-se na casa dos mandarins Com passos lentos e seguros; Senta-se entre milhares que lhe cedem o melhor.” (1) Este é um dos mais famosos poemas Yuefu da Dinastia Han (202AC-220AD). Yuefu foi um departamento musical do Governo fundado durante a Dinastia Qin (221AC-206AC). A Dinastia Han herdou a supervisão deste departamento tendo-se concentrado na recolha do folclore e nos arranjos destas peças musicais que viriam posteriormente a ser usadas em cerimónias e rituais oficiais. Quando Luofu nos é apresentada, tem. “Cabelo lindamente entrelaçado, /Brincos de pérola como raios de Lua,/Jaqueta amarela,/Aventalinho púrpura.” Uma visão não é verdade? E para quê? Não ia propriamente a nenhuma festa, apenas apanhar folhas de amoreira para dar aos bichos da seda! Esta cena faz-me lembrar o filme Disponível para Amar de Wong Kar-Wai. A protagonista vestia-se todos os dias a rigor só para descer as escadas e ir comprar massas a um vendedor de rua. No nosso poema, Luofu, domina a arte da sedução porque, não só sabe que é sexy como os diabos, mas também porque é espirituosa e bem-humorada e de alguma forma provocadora no que diz respeito ao marido: “Que disparate dizeis, senhor! Tendes uma esposa, e eu, um marido. De Leste vêm cem cavaleiros e ele vem na sua frente. Como sabereis quem ele é? Pelos cavalos que monta, com sedosas caudas entrançadas E pelo pónei que o segue, Pelos chicotes dourados; e p’la espada com punho de jade à cintura, pela qual pagou milhões. Com quinze anos era guarda-livros da Prefeitura, Escrivão aos vinte, Aos trinta era ministro; E agora, aos quarenta, É Governador de Distrito. A sua pela é muito clara a sua barba comprida. Desloca-se na casa dos mandarins Com passos lentos e seguros; Senta-se entre milhares que lhe cedem o melhor.” (1) Cá para mim o marido a que Luofu se referia era um bicho da seda!