China substitui selecionador devido às dificuldades no apuramento para o Mundial 2022

O treinador Li Tie deixou o comando técnico da seleção chinesa de futebol, sendo substituído por Li Xiaopeng, devido às dificuldades na qualificação para o Mundial2022.

A decisão foi anunciada na quarta-feira, após os 14 dias de confinamento a que a seleção chinesa esteve votada, após a permanência nos Emirados Árabes Unidos, onde tem disputado como anfitrião os jogos de qualificação.

Li Xiaopeng, de 46 anos, orientava a formação do Wuhan Zall, depois de ter comandado as equipas do Shandong Luneng, do Qingdao Jonoon e a seleção feminina.

O antigo médio integrou a seleção que participou pela única vez na fase final de um campeonato do mundo, em 2002, quando não teve de enfrentar na qualificação as ‘potências’ Coreia do Sul e Japão, que asseguraram as suas presenças como anfitriãs da competição.

A China ocupa, após seis jornadas, o quinto e penúltimo lugar do Grupo B de qualificação asiática, com cinco pontos, menos 11 do que a líder Arábia Saudita e menos sete do que o Japão.

Qualificam-se diretamente para o Mundial2022, que vai ser disputado no Qatar, os dois primeiros de cada grupo, enquanto os terceiros colocados avançam para um ‘play-off’, que dá acesso à ronda de apuramento intercontinental, com o quinto classificado da CONMEBOL.

Li Tie, de 44 anos, sucedeu em 2020 no comando da seleção chinesa ao italiano Marcello Lippi, um dos vários treinadores estrangeiros contratados no país nos últimos anos.

Apesar dos apelos do Presidente do país, Xi Jinping, para que a China se torne uma superpotência do futebol, a seleção masculina atualmente ocupa a 74.ª posição do ‘ranking’ da FIFA.

3 Dez 2021

Rui Mota, treinador de futebol na China: “Consegui mais do que aquilo em que acreditava”

Natural de Guimarães, Rui Mota chegou à China em 2016 para treinar um clube da terceira divisão, o Sichuan Longfor, e desde então que o seu percurso profissional tem sido ascendente no mundo do futebol. No início deste mês, Rui Mota assinou por mais dois anos com a federação chinesa e garante que o objectivo é levar a selecção ao campeonato asiático e do mundo

 

Acabou de renovar contrato com a federação chinesa de futebol por mais dois anos. Como foi chegar até aqui?

Estou no futebol há cerca de 15 anos, e em Portugal fiz um percurso interessante, em que época a época ia dando passos em frente. Até que em 2016 surgiu a oportunidade de poder ingressar num projecto ligado a um clube na China, na altura na terceira divisão. Vim sozinho, era o único português e estrangeiro no clube. Entreguei-me de corpo e alma porque estou muito focado na minha carreira, venho de baixo para chegar ao topo e quero chegar ainda mais longe, e só assim é que pode ser feito.

Como é o futebol na terceira divisão face aos outros escalões? Há ainda uma grande diferença em relação à qualidade de jogo e na própria formação de jogadores?

Na China há uma realidade diferente da nossa. Os clubes vão fechando e vão abrindo, há clubes muito recentes. Em 2016 o clube onde estava só tinha um ano de existência. Eles queriam tentar chegar à segunda liga, era um projecto para três anos, e a minha contratação foi mesmo nesse sentido, para tentar modernizar. Aqueles meses iniciais correram bastante bem, tanto que a divulgação na China, nos media e nas redes sociais, foi forte, houve um grande impacto. Desse trabalho surgiu-me, passados oito meses, na parte final da época, a possibilidade de fazer uma experiência na selecção de sub-19 da China. Na altura ia participar no campeonato asiático no Bahrein e foi uma decisão que tomei, correndo o risco de sair do clube e ir à selecção tentar a minha sorte. Se corresse bem seria um passo enorme. Estamos a falar de uma selecção com toda a magnitude que isso representa e teria também a possibilidade de participar numa prova internacional, com selecções, algo que nunca me tinha passado pela cabeça. A verdade é que o seleccionador, agradado com o meu trabalho, me convidou para integrar a equipa técnica dele. O seleccionador era chinês, um grande nome no futebol aqui no país, e fui o braço direito dele no campeonato asiático no Bahrein. Esse foi também o momento em que a selecção A estava com resultados menos bons e o seleccionador fez uma mudança. Nessa altura estávamos no Dubai e surgiu a possibilidade do meu seleccionador poder avançar para a selecção A. Mas depois foi contratado um estrangeiro e mantivemo-nos no campeonato asiático.

Quando terminou essa experiência no Bahrein, o que aconteceu?

No final desse campeonato o meu trabalho foi bastante falado na China. Quando cheguei ao país tinha um objectivo, a possibilidade de tentar ficar no país durante quatro anos, em que tentaria chegar à super liga chinesa. Não fui jogador a nível profissional e é um trabalho que tem sido desenvolvido a pulso. Quando terminou o campeonato asiático pensei que tinha de tentar entrar na segunda liga no ano seguinte, e felizmente isso aconteceu.

Foi para que clube?

Na altura fui trabalhar com uma antiga glória do futebol, o holandês Jo Bonfrere, que tinha sido seleccionador da Nigéria durante muitos anos. Consegui ter essa aprendizagem, concluímos essa época na segunda liga, e depois felizmente fui surpreendido com o convite do Beijing Guoan, que é uma espécie de Real Madrid aqui na China, um clube com mais antiguidade, com muitos adeptos.

Onde esteve até 2018.

Sim. A estrutura técnica era alemã, liderada pelo alemão Roger Schmitz. Mas trabalhar na China é por vezes desgastante, porque estamos em constantes viagens. Quando temos deslocações, que são de duas em duas semanas, temos de fazer milhares de quilómetros e eu na altura estava desgastado com todas essas viagens e solicitações. Decidi que teria de dar um novo passo na minha carreira e foi aí que passe a integrar os quadros da federação. Assinei contrato no início de 2019. Uma colaboração muito abrangente e permanente até ao ano passado. Depois tive de estar em Portugal até Agosto, mas já regressei à China. Neste momento, renovei contrato e aqui estou.

Qual é agora o caminho? Escreveu nas redes sociais que o principal objectivo é a qualificação da selecção chinesa para o campeonato asiático e do mundo. 

Estamos a viver momentos de muita incerteza, mas existe agora este projecto e a minha participação com a selecção é abrangente. Integro e sou seleccionado para projectos, e o que está em causa é tentarmos a qualificação para o campeonato asiático e depois possivelmente para o campeonato do mundo. A FIFA tem adiado algumas informações e decisões que tinha de tomar devido à pandemia, e estamos a fazer os nossos estágios e preparações, mas correndo o risco de tudo poder ser suspenso ou adiado. Seja como for, estamos preparados para competir quando for necessário.

A selecção chinesa tem capacidade para competir e ter um bom desempenho num campeonato do mundo?

A China tem um projecto até 2050, em que pretende participar no campeonato do mundo e até ser campeã em 2050. A ideia será, não só comigo, mas com todos os estrangeiros que vêm para a China, para os clubes, tentarmos desenvolver o futebol chinês e os seus jogadores no plano individual e colectivo. Esse é um trabalho que demora a ser feito, e comparando com o que vi quando cheguei e com o que vejo agora, parece-me que tem havido uma evolução. É isso que pretendemos. Têm sido feitas algumas naturalizações na selecção, o que de certa forma me poderá ajudar. O nosso pensamento neste momento é tentarmos ser cada vez mais competitivos e dentro da Ásia chegar a um patamar semelhante ao do Japão, Coreia do Sul ou Irão, que são as selecções mais desenvolvidas neste continente. Essa aproximação está a ser feita, mas de uma forma morosa, mas poderemos ter capacidade de ingressar no campeonato do mundo em breve.

A percepção da sociedade chinesa em relação ao futebol também tem vindo a mudar.

Isso aconteceu com a criação de muitas academias em todo o país. Alguns clubes de renome vieram para o país implementar os seus projectos e esse é o caminho que melhores frutos poderá dar no futuro. Tentarmos treinar e desenvolver os jovens jogadores neste momento, crianças dos seis aos dez anos, que serão a futura geração. Esses jogadores poderão estar mais desenvolvidos no plano teórico e poderão elevar o patamar para voos mais altos.

Sobre o plano do Governo chinês para o futebol. Sente pressão no seu trabalho para ser mais competitivo e responder a esse desígnio político?

A pressão no futebol acompanha-nos sempre, seja onde for. É claro que, não só na China mas em todo o lado, quando se fazem investimentos esperam-se retornos, e a China não será excepção. Acima de tudo, a federação e o Governo têm consciência de que é um projecto que precisa de tempo. Que começou em 2012 e vai até 2050. Ficamos logo com a ideia que são precisos resultados, mas é preciso fazer muito trabalho de base para que possamos chegar a um trabalho de detalhe. Neste momento, é importante incutir a paixão pelo futebol e que se criem mais academias e infra-estruturas. A China, desde 2018, 2019, consegue em várias cidades do país apresentar centros de treino com muita qualidade. O facto de terem vindo alguns jogadores estrangeiros de renome também é importante para os jovens. O futebol tornou-se disciplina obrigatória nas escolas e a ideia é que as crianças se possam sentir seduzidas ao ver jogadores com qualidade e com nome.

O futebol existe na China também fora dos grandes centros urbanos.

Sim. A China está a fazer novas construções, não só ao nível dos centros de treino, mas dos próprios estádios. Estão a ser criadas novas academias e clubes, e o projecto [político] inclui uma série de regras e leis que tenta melhorar toda a estrutura. É muito frequente ver também clubes de futebol em cidades mais pequenas. Quando cheguei à China, em 2016, vim para Chengdu, que tem 14 milhões de pessoas e só havia dois clubes de futebol.

Como é que a pandemia tem afectado o seu trabalho?

O trabalho da selecção foi suspenso. E quando fiquei em Portugal, em final de 2019, quando fui de férias, não pude regressar. A China está a encarar esta pandemia como todos os países deveriam encarar, como uma guerra, porque é disso que se trata. As indicações que tive foi para ficar em Portugal e aguardar novos desenvolvimentos. A China joga pelo seguro e pela prevenção máxima, e a nível de selecção os trabalhos foram cancelados, incluindo as idas ao estrangeiro. O campeonato de clubes também foi sendo adiado. Foi feito um campeonato com as mesmas jornadas, mas de forma mais curta e foram escolhidas algumas cidades para tal.

Projectos para o futuro?

A minha mentalidade e personalidade tem sempre a ver com novos objectivos e desafios. Consegui ganhar uma taça da China ao serviço do Beijing Guoan, consegui um apuramento para a Liga dos Campeões Asiática, a participação no campeonato asiático e trabalhar na selecção. Consegui mais do que aquilo em que acreditava. Pretendia, passados esses quatro anos voltar a Portugal, mas como estamos a trabalhar para estas duas grandes competições, e apesar de todas as incertezas, neste momento estou aqui. Mas pretendo voltar a Portugal e chegar a um patamar elevado.

19 Jan 2021