Paul Chan Wai Chi Um Grito no Deserto VozesO amigo macaense [dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]ia 19 de Janeiro recebi um telefonema de um amigo para me informar que o Carlos Manuel Coelho tinha falecido. Esta notícia encheu-me de tristeza. É sempre difícil aceitar a morte, mesmo quando sabemos que a pessoa em causa sofria de problemas de saúde há algum tempo. Conheci o Carlos Manuel Coelho há mais de vinte anos, quando ele trabalhava na Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), sediada num edifício da Avenida do Conselheiro Ferreira de Almeida. Nessa altura, fui à DSEJ para entregar as candidaturas dos meus alunos às actividades de Verão e foi o Carlos que recebeu os impressos. Vinte anos volvidos, voltei a encontrá-lo. Tinha ido dar uma palestra à escola onde ele trabalhava como assistente do Reitor e ele honrou-me com a entrega de uma medalha comemorativa. Há quatro anos atrás, tornei-me também assistente do Reitor, na mesma escola onde o Carlos trabalhava, e desta forma tornamo-nos colegas. Em Junho de 2016, deixei de trabalhar na referida escola e assim terminou também a nossa parceria laboral. Carlos Manuel Coelho tinha um belíssimo nome chinês, Kou Vai Lon, que ligava muito bem com a sua imagem. Quem não o conhecesse, ficava invariavelmente com a ideia de estar perante uma pessoa arrogante. Mas após alguma convivência, esta impressão dissipava-se. No entanto, há quem diga que nem toda a gente gostava dele. Mas a partir do momento em que se tornava nosso amigo, sentíamo-nos abençoados. Nas eleições de 2014 para a Assembleia não fui reeleito, mas, apesar disso, não pude continuar a cumprir todos os meus antigos compromissos laborais. Acabei por ter de abandonar a escola, onde tinha estado durante muitos anos, e iniciar um novo trabalho num ambiente completamente diferente. Enquanto funcionário público, que dedicou décadas da sua vida à educação, Carlos Manuel Coelho ensinou-me muito sobre como lidar com pessoas e situações, embora, devido à minha personalidade, não tenha posto tudo em prática. Contudo, ele fazia análises muito certeiras sobre tudo o que o rodeava e ajudou-me a abrir os olhos para determinadas realidades. De todo o trabalho que, durante anos, desenvolveu ao serviço do Governo, o que o enchia de maior orgulho era o Festival Juvenil Internacional de Dança, cuja organização estava a seu cargo. Mas o que mais me impressionava era a sua entrega à promoção do ensino do Português na escola onde trabalhava. Graças à excelente educação que recebeu, Carlos Manuel Coelho tinha um completo domínio da língua portuguesa, o qual desejava partilhar com a comunidade. Para além de organizar aulas de Português na sua própria escola, também o ensinava noutros locais, o que lhe valeu um amplo reconhecimento. Levou ainda o ensino da lusitana língua aos jardins de infância, organizando jogos e encenando para os mais pequeninos acontecimentos do dia a dia. Um dos cacifos do seu escritório estava atulhado de tubos de papel higiénico e outros materiais que coleccionava para mais tarde usar como ferramentas pedagógicas. Era difícil avaliar pela sua aparência como era na verdade um pedagogo tão apaixonado. Carlos Manuel Coelho vestia-se com bom gosto e tinha um sentido da vida muito particular. Na sua mensagem do Weibo podia ler-se, “A vida é curta, por isso aproveitem cada dia ao máximo”. Ao fim de dois anos de o conhecer, acabei por ir aprendendo, aos poucos, a apreciar a Arte e a vida. Sabia confeccionar excelentes pratos macaenses, especialmente doçaria. Tinha também profundos conhecimentos sobre mobiliário em cerejeira e porcelanas. Estava sempre pronto a ajudar e a partilhar o que sabia, mas só se nos considerasse amigos. Por vezes, convivemos com certas pessoas durante anos e nunca passam de conhecidos. Mas, de outras, com quem nos identificamos, ficamos amigos num abrir e fechar de olhos. Com o Carlos Manuel Coelho, verificou-se o segundo caso. Ultimamente tem acontecido de tudo em Macau. Muitas destas coisas são a paga do que as pessoas fizeram ao longo dos anos. A vida é curta na verdade e eu fui um privilegiado por ter conhecido o Carlos Manuel Coelho, que foi um grande amigo. Que o Senhor tenha a sua alma e olhe pela sua família.