As futuras gerações perante as alterações climáticas

É interessante constatar que a juventude tem vindo a demonstrar grande preocupação pelo futuro, no que se refere à sustentabilidade do nosso planeta. Essa preocupação reflete-se nas iniciativas que os jovens têm vindo a adotar à escala mundial, em prole de um futuro sem combustíveis fósseis, os quais são considerados como a principal causa do aumento da concentração de gases de efeito de estufa (GEE) na atmosfera, e consequentemente das alterações climáticas. É incontestável a consequente degradação progressiva do meio-ambiente, a perda de ecossistemas e a diminuição drástica da biodiversidade, o que se reflete na sustentabilidade do nosso planeta e na deterioração das condições de vida.

Das organizações e programas das Nações Unidas que mais ações têm levado a cabo para alterar esta situação, sobressaem a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), sob os auspícios dos quais foi criado o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, órgão que procede à monitorização das transformações a que o clima tem estado sujeito devido às atividades antropogénicas.

A OMM é a agência especializada das Nações Unidas que tem como missão a cooperação internacional e a coordenação de atividades que envolvem o estado e o comportamento da atmosfera do nosso planeta, a sua interação com a terra e os oceanos, o tempo, o clima e os recursos hídricos.

Por outro lado, o Programa das Nações Unidas para o Ambiente, criado em 1972, tem como missão informar e aconselhar os Estados sobre como melhorar a qualidade de vida das suas populações e das gerações futuras, através da implementação de uma agenda ambiental que entra em consideração com o desenvolvimento sustentável.

Apesar dos esforços da OMM, do PNUA e de outras organizações e programas das Nações Unidas, que se têm refletido no estabelecimento do Protocolo de Quioto e na realização das 27 Conferências das Partes (Conferences of the Parties – COP), onde têm sido estabelecidos compromissos para reverter o aumento da concentração dos GEE, parece estar comprometido o almejado objetivo do Acordo de Paris, que consiste em que o aumento da temperatura média do ar , à escala global, não ultrapasse os 2 ºC, de preferência inferior a 1,5 ºC, até ao fim do corrente século.

Na realidade, esse aumento já ultrapassou 1,1 ºC em relação ao início da era industrial, há aproximadamente 150 anos. A passividade com que os governos dos países e as diferentes partes envolvidas têm vindo a atuar tem sido confrangedora, na medida em que não põem em prática, ou o fazem-no com grande lentidão, as recomendações acordadas nos vários fóruns onde estes assuntos são tratados.

A preocupação com as gerações futuras sobre a sustentabilidade da vida no nosso planeta perante o que pode acontecer ao clima está expressa no tema que a OMM escolheu para celebrar este ano o Dia Meteorológico Mundial (DMM) de 2023: “O Futuro do Tempo, do Clima e da Água através das Gerações” .

O dia 23 de março, data do aniversário da entrada em vigor da Convenção da OMM, é normalmente celebrado pelos serviços meteorológicos nacionais, realizando palestras, visitas de estudo, artigos nos órgãos de comunicação social, emissão de selos comemorativos, etc. A decisão oficial da criação da OMM foi há 150 anos, em 1873, no Congresso Internacional de Meteorologia, que teve lugar em Viena, nessa altura capital do Império Austro-Húngaro.

Neste encontro foi tomada a decisão de criar uma organização que tivesse como funções a coordenação das atividades relacionadas com o intercâmbio de informação meteorológica entre países, a Organização Internacional de Meteorologia , que incumbiu um comité de redigir as regras e os estatutos de uma organização mais vasta, que veio a designar-se por Organização Meteorológica Mundial.

A OMM tem sede em Genebra e conta com 193 membros entre Estados (187) e Territórios Membros (6). Portugal aderiu à OMM em 1951 e, na sequência de diligências conjuntas entre o nosso país e a China, Macau foi aceite como Território Membro em 1996, ainda sob administração portuguesa.

Segundo a Convenção da OMM – Artigo 3(d) – os territórios, desde que tenham serviços meteorológicos próprios, podem tornar-se Territórios Membros, passando a ter os mesmos direitos que os Estados em algumas questões relacionadas com o funcionamento da organização. É o caso da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), que possui os Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG) desde 1952, e da Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAEHK), cujo serviço meteorológico (Hong Kong Observatory), foi criado em 1883. Os respetivos delegados podem votar para a eleição do Secretário-Geral em pé de igualdade com os Estados Membros, o que faz com que a China tenha direito a três votos nessa eleição. Os votos, em princípio, são independentes, mas ninguém acreditaria que os Territórios Membros votariam de modo divergente ao da potência administrante.

Perante esta situação, no 14.º Congresso da OMM (Genebra, 5–24 de maio, 2003), o delegado do México manifestou a sua estranheza por esse facto, tendo o Secretariado esclarecido que a China e o Reino Unido haviam submetido o pedido de admissão de Hong Kong, China, no 12.º Congresso (1995), e que analogamente, a China e Portugal submeteram um pedido semelhante ao 13.º Congresso (1999), em relação a Macau, China. Em ambos os casos, o Congresso aceitou os pedidos, conforme o estabelecido na Convenção da OMM.

Esta situação, no entanto, não é caso único, na medida em que outros países que administram Territórios Membros, como a França, os Países Baixos e o Reino Unido, também têm direito a mais do que um voto. Tal deve-se ao facto de administrarem, respetivamente, a Polinésia Francesa e a Nova Caledónia, Curaçau e São Martinho, e Territórios Britânicos das Caraíbas. Portugal esteve em situação análoga no XIII congresso da OMM (4-26 maio 1999), devido ao facto de Macau ainda estar sob administração portuguesa.

Portugal e os restantes países de língua portuguesa têm-se batido, nos congressos da OMM, pela adoção do português como língua oficial desta organização. O argumento defendido pelos países lusófonos baseia-se na realidade de o português ser uma das línguas mais faladas no mundo. Com cerca de 280 milhões de falantes, mais do que os de língua russa, é a quinta língua à escala mundial e a mais falada no hemisfério sul.

Acontece, porém, que essa medida implicaria um forte acréscimo nas despesas com a tradução de documentos, e no recurso a intérpretes durante as sessões. Segundo aqueles que se opõem às pretensões dos países lusófonos, o facto de haver seis línguas oficiais (árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo) já implica um grande esforço financeiro por parte da OMM. Conseguiu-se, no entanto, que o português alcançasse o estatuto de língua de trabalho, com recurso a um fundo para o qual contribuem alguns membros, nomeadamente Angola, Brasil, Portugal e Região Administrativa Especial de Macau.

Os temas selecionados para as celebrações anuais do DMM refletem frequentemente as preocupações relacionadas com a evolução do clima. Por exemplo, nos últimos dez anos, o conceito “clima” é referido seis vezes: “The Future of Weather, Climate and Water across Generations, 2023”; “The Ocean, Our Climate and Weather, 2021”; “Climate and Water, 2020”; “Weather-ready, climate-smart, 2018”; “Climate knowledge for Climate Action, 2015”; “Weather and Climate: Engaging youth, 2014”.

Perante a realidade do facto de se constatar um aumento da frequência de fenómenos meteorológicos extremos, da subida do nível do mar em consequência do degelo de glaciares e calotas polares, dos oceanos estarem mais quentes e com maior grau de acidez, é natural a preocupação sobre as condições de vida das novas gerações. Neste contexto, a OMM está a trabalhar no sentido de desenvolver uma infraestrutura à escala mundial para monitorização da concentração dos GEE, com o intuito de apoiar a implementação do Acordo de Paris.

Atendendo a que o tempo, o clima e os recursos hídricos não conhecem fronteiras, é importante que as Nações Unidas, como instituição transnacional, e outras instituições internacionais, continuem a zelar pelas gerações futuras, e a reunir esforços para que estas tenham a possibilidade herdar um planeta mais sustentável. Todos nós, a título individual e coletivo, somos também responsáveis pela concretização desse objetivo.

*Meteorologista

5 Abr 2023

Tsunamis, Meteotsunamis e outros fenómenos similares

Recentemente o público mais atento foi surpreendido pela notícia sobre a ocorrência de um fenómeno pouco vulgar, que consistiu numa perturbação da superfície do oceano Pacífico e que se estendeu pelo Atlântico. Os marégrafos, instalados nas regiões costeiras mais longínquas do local onde foi originado o fenómeno, registaram alterações do nível do mar fora do normal. Os técnicos que procedem à monitorização deste tipo de fenómenos mostraram-se inicialmente surpreendidos, na medida em que não foi registado nenhum sismo que pudesse justificar este tipo de ondas. A surpresa desvaneceu-se quando se tomou conhecimento da ocorrência de uma forte erupção explosiva de um vulcão na região das ilhas Tonga.

O Reino de Tonga é um país constituído por 169 ilhas, onde cerca de um quarto são inabitadas. O arquipélago tem uma área de aproximadamente 700 km2 que se estende por uma vasta região de cerca de 700.000 km2, no Pacífico Sul, a sueste das ilhas Fiji, a uma distância aproximada de 3.300 quilómetros a leste da Austrália.

As ondas no arquipélago chegaram a atingir cerca de 15 metros, propagando-se, à medida que diminuíam de amplitude, pelo Pacífico, até atingirem regiões tão distantes como o litoral do Japão, Austrália, Nova Zelândia e a costa oeste do continente americano. Propagaram-se também pelo Atlântico, onde, segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), atingiram Portugal, tendo sido o sinal registado de maior amplitude de cerca de 40 cm em Ponta Delgada e Peniche.

O vulcão parcialmente submerso Hunga Tonga-Hunga Haʻapai estava latente, entre as pequenas ilhas Hunga Tonga e Hunga Haʻapai, daí a ser designado pela junção dos dois nomes. A erupção ocorreu em 14 de janeiro de 2022, atingindo o seu máximo no dia seguinte, a cerca de 65 km a norte da ilha Tongatapu, onde se encontra a capital Nukuʻalofa, dando origem à formação de uma enorme nuvem de fumo e cinzas, em forma de cogumelo, com o diâmetro de cerca de 260 km.

Grande quantidade de cinzas vulcânicas cobriu parte das ilhas, prejudicando culturas e cobrindo a pista de aterragem do aeroporto internacional, o que impediu durante alguns dias a aterragem de aviões com meios de assistência à população. As cinzas vulcânicas prejudicaram também a navegação aérea no espaço aéreo de algumas ilhas do Pacífico Sul. O cabo submarino que liga o Reino do Tonga ao mundo exterior foi também danificado, tendo impedido as comunicações durante alguns dias. Foram registados estragos nas zonas costeiras das ilhas do arquipélago e de algumas regiões bastante longe da zona de geração. No Peru ocorreu um derrame de petróleo correspondente a cerca de 12.000 barris, durante a descarga de um petroleiro, do qual causou grave desastre ecológico a 30 km a norte de Lima, vitimando inúmeros peixes e aves. O número de vítimas mortais foi relativamente baixo, contando-se três no arquipélago de Tonga e duas no litoral do Peru.

A explosão, que projetou material vulcânico a mais de 20 km de altitude, gerou uma onda de choque atmosférica que se propagou com velocidade supersónica, dando várias vezes a volta ao globo, potenciando perturbações na superfície dos oceanos que o IPMA classificou como um meteotsunami. No entanto tal designação é discutível. A queda sobre a superfície do oceano de material vulcânico que havia sido projetado poderá também ter contribuído para a geração dessas perturbações, contribuindo assim para reforçar a ondulação causada pela onda de choque.

Os meteotsunamis não devem ser confundidos com os tsunamis. Os primeiros são em geral menos intensos e consistem em ondulação de grande comprimento de onda associada a fenómenos atmosféricos caracterizados por variações bruscas da pressão, podendo ocorrer, por exemplo, durante a passagem de formações de cumulonimbus (linhas de borrasca) e frentes frias muito ativas. No que se refere ao fenómeno tradicionalmente designado por tsunami, a sua geração nada tem a ver com fenómenos meteorológicos, mas com a ocorrência de eventos geofísicos abruptos, como sismos submarinos, erupções vulcânicas e deslizamento costeiro ou submarino de terras. A queda de meteoritos no mar pode também provocar tsunamis. (Consta que o desaparecimento dos dinossauros foi consequência da queda de um asteroide que provocou um enorme tsunami há cerca de 65 milhões de anos).

Outro fenómeno que poderá ser confundido com tsunami é designado por “storm surge” (traduzido frequentemente para português, embora indevidamente, como “maré de tempestade”). A sua ocorrência resulta do arrastamento das ondas pelo vento contra a costa e a consequente inundação de zonas baixas, quando o mar que se encontra sobre-elevado devido a pressão atmosférica muito baixa (quando a pressão diminui 1 hPa, o nível do mar sobe cerca de 1 cm). Ocorreu um fenómeno deste tipo em Macau, em agosto de 2017, aquando da passagem do tufão Hato. Em novembro de 2013, nas Filipinas, a “storm surge” associada ao tufão Haiyan (chamado Supertufão Yolanda nas Filipinas), foi a causa de muitas das cerca de 6.000 vítimas mortais. As consequências de tsunamis e de “storm surges” são muito semelhantes, embora as características das ondas sejam diferentes.

Nas “storm surges” as ondas são sempre causadas pelo vento, têm maior frequência e propagam-se com menor velocidade, enquanto que as geradas pelos tsunamis são em geral consequência de sismos submarinos e são caracterizadas por maior comprimento de onda, menor frequência e muito maior velocidade. As ondas de um tsunami propagam-se em águas profundas com velocidade próxima da velocidade de cruzeiro de aviões comerciais, ou seja, cerca de 900 km/h. À medida que entram em águas menos profundas, a velocidade das ondas diminui e a amplitude aumenta. Ambos os fenómenos geram ondas que, invadindo as zonas baixas do litoral, podem provocar estragos consideráveis e elevado número de vítimas.

A semelhança das consequências de tsunamis e de “storm suges” é tão grande que, conforme noticiado na imprensa filipina, o Mayor de Guiuan, a primeira cidade a ser atingida pelo tufão Haiyan, perante a passividade da população relativamente a um aviso de “storm surge”, enviou mensageiros em motociclos para alertar as comunidades costeiras da iminente chegada de um tsunami de grandes proporções. O termo “tsunami” sobressaltou a população que, seguindo instruções, se concentrou em locais de onde pôde ser evacuada. A expressão “storm surge”, difundida em inglês e traduzida para a língua local, foi considerada muito técnica e pouco compreensível por uma população não muito instruída.

(Curiosamente, Guiuan teve um papel importante na história das Filipinas. Reza a história que, no século XVI, foi na ilha Homonhon, pertencente àquela municipalidade, que Fernão de Magalhães desembarcou pela primeira vez naquele arquipélago. Talvez por esta razão a população da cidade é maioritariamente católica).

Outro fenómeno que poderá ser confundido com tsunamis são as “Seiches” (termo do francês falado na Suíça que significa abanar periodicamente). Trata-se, no entanto, de ondas estacionárias que ocorrem geralmente, em determinadas condições, em bacias parcial ou totalmente fechadas, como por exemplo, o lago Erie, um dos cinco lagos na fronteira entre os EUA e o Canadá, ou no lago Lémand, entre a Suíça e a França. Ocorrem normalmente quando ventos fortes associados a alterações bruscas da pressão atmosférica empurram a massa de água contra um dos limites da bacia. Quando o vento cessa, a massa de água inverte o sentido do deslocamento, oscilando durante horas ou mesmo dias.

Tratando-se este texto de um artigo de opinião, permito-me discordar do IPMA no que se refere a ter classificado como um meteotsunami a perturbação dos oceanos Pacífico e Atlântico provocada pela explosão vulcânica do Tonga. Um meteotsunami é um tsunami cujas causas estão relacionadas com fenómenos meteorológicos. Não sendo fenómenos deste tipo a erupção vulcânica nem a onda de choque por ela provocada, não se trata, portanto, de um meteotsunami, mas simplesmente de um tsunami.

*Meteorologista

10 Fev 2022

O Oceano, o clima e o tempo

O Dia Meteorológico Mundial (DMM) é celebrado em 23 de março desde 1961, no mesmo dia em que entrou em vigor a Convenção da Organização Meteorológica Mundial (OMM), em 1950. Anualmente é escolhido um tema, que é desenvolvido para chamar a atenção das autoridades e do público para um determinado assunto. O tema deste ano, “O Oceano, o Clima e o Tempo”, serve de pretexto para enfatizar a interdependência entre a hidrosfera e a atmosfera, as quais, conjuntamente com a criosfera, a litosfera e a biosfera, compõem o sistema climático.

Quando nos referimos ao “tempo”, pensamos em nuvens, vento, chuva, céu limpo ou nublado, frio ou calor, etc., que poderão ocorrer hoje, amanhã ou, em geral, num período relativamente curto. Já quando nos referimos ao clima, a imagem que nos vem ao espírito é a do tempo médio num período mais longo.

Normalmente, para caracterizar o clima de uma região, recorre-se aos valores médios dos parâmetros meteorológicos registados durante um determinado período, de preferência 30 anos no mínimo.

Nunca é demais realçar a importância dos oceanos para o tempo e o clima. A sua proximidade atua como que um íman que atrai as populações. Estima-se que cerca de 40% da população mundial habita numa faixa de 100 km junto ao mar. Por outro lado, aproximadamente 90% do comércio mundial é feito através de rotas marítimas. Neles são despejadas diariamente milhares de toneladas de efluentes domésticos, industriais e agrícolas, frequentemente não devidamente tratados. Os derramamentos de óleo e a exploração mineira oceânica também contribuem para a sua poluição. Os oceanos ressentem-se do aquecimento global devido à crescente injeção de gases de efeito estufa na atmosfera, aumentando a sua temperatura, o que potencia a fusão do gelo marítimo, o aumento do nível do mar e a danificação de ecossistemas, como os recifes de coral, de grande importância para a reprodução de numerosas espécies piscícolas.

A OMM conta com 193 membros, em que 187 são Estados e 6 são Territórios Membros. Macau foi admitido como Território Membro em 23 de janeiro de 1996, ainda sob administração portuguesa. Curiosamente, para certos assuntos, o voto de um Território Membro vale tanto como o de um Estado Membro. É o caso, por exemplo, da nomeação do Secretário-Geral, que é feita durante os congressos, de 4 em 4 anos, com base no resultado da votação de todos os Estados e Territórios Membros. Assim, para este efeito, o voto de Macau conta tanto como o voto de um grande país, como o Canadá ou a Federação Russa. Pode-se então afirmar que a China tem direito a 3 votos para a eleição do Secretário-Geral, o cargo executivo mais importante da OMM. Os votos de Macau e de Hong Kong são teoricamente independentes dos da China, mas é natural que haja um acordo informal para que convirjam no mesmo candidato. No XIV Congresso da OMM (Genebra, 5-24 maio 2003), o delegado do México criticou este processo de nomeação do Secretário-Geral, tendo pedido esclarecimento por que razão a China tinha direito a 3 votos, o que a colocava em vantagem em relação aos outros países (neste congresso foram apenas 2 votos, por a delegação de Macau não ter podido participar devido à pneumonia SARS). Perante este comentário, o Secretariado da OMM explicou que a China e o Reino Unido haviam solicitado ao XII Congresso (Genebra, 30 maio-21 junho 1995), a inclusão de Hong Kong com a designação “Hong Kong, China” como Território Membro, e que a China e Portugal procederam de igual modo no XIII Congresso (Genebra, 4-26 maio 1999). Ambos os pedidos foram aceites, na medida em que estas regiões administrativas possuem Serviços Meteorológicos próprios, condição para que pudessem usufruir desse direito, conforme estipulado na Convenção da OMM. A China não é caso único, atendendo a que há outros países que também têm direito a mais do que um voto, como, por exemplo, o Reino Unido e a França, devido a administrarem territórios ultramarinos, considerados Territórios Membros. Ninguém acreditaria que os Territórios Caribenhos Britânicos, ou a Polinésia Francesa, votariam de maneira discordante das respetivas potências administrantes. A realidade é que, nos corredores da sede da OMM, durante os congressos, os representantes de alguns países continuam a comentar este processo de eleição.

Voltando ao tema do DMM deste ano, é importante salientar a necessidade de assegurar o equilíbrio entre as várias componentes do sistema climático, com especial ênfase para os oceanos e a atmosfera, que têm vindo a sofrer degradação das suas características. Os oceanos cobrem cerca de 70% da superfície da Terra e constituem o maior condicionador das condições meteorológicas. A alteração das suas características repercute-se no comportamento do tempo e, consequentemente, do clima. O aquecimento global, que se atribui à injeção de gases de efeito de estufa resultantes de atividades antropogénicas, afeta não só a atmosfera mas também os oceanos. O aumento da temperatura da água do mar potencia a evaporação, o que implica transferência de energia do mar para a atmosfera, sob a forma de calor latente de evaporação.

Perante esta realidade, é natural que haja tendência para uma maior frequência e (ou) intensidade de ciclones tropicais. O que aconteceu na estação dos furacões de 2020, no Atlântico Norte, favorece esta interpretação, na medida em que houve 30 ciclones tropicais aos quais foram atribuídos nomes próprios (tempestades tropicais e furacões), o que fez com que se esgotassem os nomes da lista previamente elaborada pelo Comité dos Furacões (com sede em Miami), entidade homóloga do Comité dos Tufões (com sede em Macau). As listas dos furacões são usadas rotativamente de 6 em 6 anos. Assim, a lista usar em 2021 será a mesma de 2026, exceto no que se refere a eventuais ciclones tropicais cujos nomes virão a ser retirados, devido à sua forte atividade e consequências nefastas. Estas listas constam de 21 nomes de pessoas, alternadamente femininos e masculinos, em ordem alfabética, sem usar 5 letras (Q, U, X, Y e Z), pouco utilizadas como primeiras letras de nomes próprios.

A estação dos furacões de 2020 foi, desde que há registos, a mais ativa de sempre. A seguir ao último nome da lista teve de se recorrer, pela segunda vez, a letras gregas para os designar. Foram 9 os ciclones tropicais que excederam a lista: Alpha, Beta, Gamma, Delta, Epsilon, Zeta, Eta, Theta e Iota. Curiosamente, a primeira destas (Alpha) foi atribuída a uma tempestade subtropical que se dissipou sobre Portugal, em 18 de setembro de 2020.

A primeira vez que se recorreu ao alfabeto grego foi em 2005, em que ocorreu a segunda estação de furacões mais ativa. A seguir à letra “W” (Wilma) teve de se designar os ciclones tropicais seguintes por Alpha, Beta, Gamma, Delta, Epsilon e Zeta. Foi neste ano que o furacão Vince, anterior ao Wilma, afetou a Madeira e o sul de Portugal continental, já como tempestade tropical.

Note-se que têm havido discussões no Comité de Furacões para acabar com a prática de designar as tempestades tropicais e os furacões por letras do alfabeto grego, o que levou à decisão de que, de futuro, não serão mais usadas. Chegou-se à conclusão que as populações têm tendência a subestimar a perigosidade destes sistemas meteorológicos quando não se lhes atribui nomes próprios. Assim, no Atlântico Norte, se na próxima estação de furacões o número de ciclones tropicais ultrapassar 21, aplicar-se-ia uma lista suplementar já estabelecida para esse efeito, com o mesmo número de nomes da lista inicial. O 22º ciclone tropical passaria a chamar-se “Adria” e o último da lista suplementar teria “Will” como nome.

É de salientar que os ciclones tropicais se formam sempre sobre os oceanos, em zonas em que a temperatura da água é mais elevada (estatisticamente no mínimo 26,5 graus Celsius), e que, apesar de serem fenómenos por vezes extremamente violentos, são imprescindíveis para o equilíbrio do sistema climático, fazendo com que haja transporte de energia das latitudes mais baixas para as mais altas.

Nunca foi tão importante como agora compreender a interação entre os oceanos, o tempo e o clima, na medida em que, sem este conhecimento, não se poderá concretizar o objetivo nº 14 da “Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015: “Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e recursos marítimos para o desenvolvimento sustentável”. A ONU, atenta a esta realidade, deu início este ano à “Década da Ciência do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030)”.

1 Abr 2021

Clima – Um sistema em desequilíbrio?

[dropcap]A[/dropcap] Terra é o único planeta conhecido com condições para que haja vida, tal como a conhecemos. Localiza-se no universo, na Via Láctea, e desloca-se a uma distância ideal em torno do Sol, uma das milhares de milhões de estrelas desta galáxia. A atmosfera, além de respirável, filtra alguma radiação que seria prejudicial se atingisse a superfície. Possui também uma espécie de escudo protetor, constituído por um campo magnético, que impede a radiação cósmica de atingir a superfície do globo, evitando assim que a vida seja impossível.

Um sistema complexo, a que se convencionou designar por clima, impede que as temperaturas atinjam extremos muito altos ou muito baixos, criando condições para que seja possível a vida de milhões de espécies de seres vivos. As componentes deste sistema (atmosfera, hidrosfera, criosfera, litosfera e biosfera) estão de tal modo relacionadas, que qualquer alteração de uma delas provoca reações nas outras, dando origem a variações no comportamento do clima no seu todo. Para efeitos práticos pode-se caracterizar o clima de uma determinada região recorrendo aos valores médios dos parâmetros meteorológicos referentes a um período relativamente longo, de preferência trinta anos, como aconselha a Organização Meteorológica Mundial. O clima, no entanto, é muito mais do que isso. Como escreveu o eminente meteorologista Professor José Pinto Peixoto, coautor, juntamente com o Professor Abraham H. Oort, do livro Physics of Climate, “o clima está sempre evoluindo e deve ser considerado como uma entidade viva” (“the climate is always evolving and it must be regarded as a living entity”).

A atmosfera é uma fina película que envolve o globo terrestre. Por estarmos mergulhados nela, é a componente do sistema climático que maior influência exerce sobre as condições de vida dos seres humanos. Para termos uma ideia quão fino é este invólucro gasoso, basta relembrar que, enquanto o diâmetro médio do globo terrestre é aproximadamente 12.700 km, a atmosfera tem a espessura de apenas algumas dezenas de quilómetros. Para evidenciar este facto, podemos estabelecer a seguinte analogia: num globo para fins didáticos, daqueles usados nas escolas para representar a Terra, a espessura da atmosfera pouco mais seria do que a espessura da camada de tinta envolvente. Por se rarefazer quando aumenta a altitude, não se pode estabelecer um limite superior para a atmosfera e, por esta razão, convencionou-se designar por Linha Karman, que corresponde a 100 km de altitude, o nível a partir do qual se encontra o espaço exterior.

Entre o nosso planeta e o espaço exterior há uma troca permanente de energia. A maior parte da energia recebida provém do Sol, na forma de radiação de pequeno comprimento de onda, que é absorvida em grande parte pelo sistema climático, sendo outra parte refletida e reenviada para o espaço. Por sua vez a Terra emite radiação infravermelha, de grande comprimento de onda, de maneira que se estabelece um equilíbrio entre a energia recebida e a que é emitida, ou seja, a quantidade de energia que atinge a Terra é igual à que o nosso planeta emite e reflete para o espaço. Durante os cerca de 4,5 mil milhões de anos de existência da Terra têm ocorrido períodos em que este equilíbrio é interrompido, havendo arrefecimento, como durante as glaciações, e outros em que há aquecimento, como acontece atualmente desde o início da era industrial. A grande diferença é que as glaciações duraram dezenas de milhares de anos e foram principalmente devidas a fatores exteriores ao sistema climático, como a variação de parâmetros orbitais da Terra em relação ao Sol, enquanto que o aquecimento global é devido a atividades antropogénicas.

A espécie humana, que constitui uma pequeníssima parte de uma das componentes do sistema climático, a biosfera, tem vindo a contribuir para que parte da radiação infravermelha fique retida na atmosfera, devido ao efeito de estufa, o que se manifesta pelo aumento da temperatura do ar e dos oceanos. Milhões de toneladas de gases de efeito de estufa são injetados anualmente na atmosfera. Como consequência tem vindo a verificar-se a fusão de parte significativa da criosfera, o que implica a subida do nível médio dos oceanos.

Como as áreas cobertas por neve e gelo têm forte implicação no poder refletor (albedo) da superfície do globo, a sua diminuição contribui para que a quantidade de energia que é reenviada para o espaço seja cada vez menor, o que implica um maior aquecimento do sistema climático.

Com o objetivo de alertar para o perigo a que a Terra está sujeita, têm sido levadas a cabo algumas atitudes simbólicas, como a que foi tomada na Islândia em agosto de 2019. O desaparecimento do glaciar Okjokull (abreviadamente Ok), foi assinalado com a colocação de uma placa com “Uma carta para o futuro”, da autoria do escritor islandês Andri Snaer Magnason, cujo conteúdo é o seguinte: “Ok foi o primeiro glaciar islandês a perder o seu estatuto de glaciar. Estima-se que, nos próximos 200 anos, todos os nossos glaciares sigam o mesmo caminho. Este monumento é para dar a conhecer que sabemos o que está a acontecer e o que é necessário ser feito. Só você sabe se nós o fizemos”.

Outra atitude interessante para defesa dos glaciares Gangotri e Yamunotri, no Estado indiano de Uttarakhand, onde nascem respetivamente os rios Ganges e Yamuna, nos Himalaias, foi a decisão do Tribunal Supremo desse Estado de lhes conceder personalidade jurídica, o que significa que qualquer dano que lhes seja infligido será considerado como um dano causado a seres humanos.

Os gestos simbólicos são importantes para chamar a atenção do grande público para as agressões ao planeta Terra. No entanto, apesar de se saber que o aquecimento global é uma realidade, e de haver esforços reais de alguns países para cumprir com o estabelecido em acordos internacionais, nomeadamente o Protocolo de Quioto e o Acordo de Paris, algumas das maiores potências mundiais continuam a permitir e fomentar a destruição de florestas e a aumentar o consumo de combustíveis fósseis, preferindo proveitos económicos imediatos a uma gestão racional dos recursos do nosso planeta. A ganância pelo lucro, além de pôr em risco a qualidade de vida das gerações vindouras, não entra em consideração com os danos causados ao sistema climático, o que tem contribuído para o desaparecimento de inúmeras espécies de animais, contribuindo para a deterioração ou destruição dos seus habitats.

3 Set 2020

O Tempo e o Clima no cinema

[dropcap]O[/dropcap] tempo e o clima são temas que permitem aos realizadores cinematográficos obter efeitos estéticos que enriquecem as histórias que pretendem narrar. Deixando de parte os documentários didáticos e científicos, é interessante relembrar alguns filmes que envolvem estes temas.

É o caso de “O Feiticeiro de Oz” (de Victor Fleming-1939), em que a personagem principal, desempenhada por Judy Garland, é arrastada por um tornado, juntamente com a sua casa, para o país de Oz. O filme “Twister” (Jan de Bont, 1996) narra as dificuldades que cientistas enfrentam para colocar equipamentos no interior de tornados a fim de quantificar as variáveis meteorológicas, entre elas o vento. Na realidade, os anemómetros têm conseguido resistir aos ventos de furacões e tufões, no entanto, ainda não foi possível medir o vento associado aos tornados, pelo simples facto de que nenhum instrumento consegue resistir a ventos tão intensos. Apenas se consegue estimar que os ventos podem atingir valores superiores a 500 km/h. Na escala de intensidade dos tornados, adotada internacionalmente, a intensidade F-5 corresponde a ventos entre 117 e 142 m/s, ou seja, entre 421 e 511 km/h, o suficiente para arrancar uma casa das suas fundações, ou arrastar camiões pelos ares. Os realizadores do “Feiticeiro de Oz” e do “Twister” bem sabiam disso.

Ficou na história do cinema, pela espetacularidade dos efeitos especiais, o filme “Hurricane” (John Ford – 1937), premiado com três óscares, em que uma ilha da Polinésia Francesa é devastada pela maré de tempestade e ventos associados a um ciclone tropical.

Os tornados são considerados os fenómenos meteorológicos mais violentos. Tal como os ciclones tropicais (tufões, furacões ou ciclones), são caracterizados pelo deslocamento do ar em espiral. A grande diferença consiste principalmente nas suas dimensões. Enquanto que os tornados têm um diâmetro de algumas dezenas ou centenas de metros, o diâmetro dos ciclones tropicais pode atingir milhares de quilómetros.

As tempestades de areia são também fenómenos meteorológicos que, pela sua espetacularidade, são frequentemente aproveitados no cinema. Assim, em filmes como a “A Múmia” (Stephen Sommers, 1999), “Missão Impossível: Operação Fantasma” (Brad Bird-2011) e “Mad Max-Estrada da Fúria” (George Miller, 2015), estas tempestades contribuem para dar maior dramaticidade às cenas. As tempestades de areia ocorrem em zonas desérticas e, em determinadas condições meteorológicas, podem transportar areia a grandes distâncias como, por exemplo, do deserto do Saara até às lhas Canárias, Cabo Verde, Mar das Caraíbas e sueste dos EUA.

Em “Um dia de Chuva em Nova Iorque” (Woody Allen, 2019) a forte precipitação que se abate sobre a cidade ajuda a criar um clima propício ao desenrolar do enredo.

No filme “O Nevoeiro” (John Carpenter – 1980), o fenómeno meteorológico assim designado serve de pretexto para que fantasmas de marinheiros invadam uma pequena cidade americana do litoral. Considerado inicialmente com uma obra menor, hoje é um filme de culto e está incluído em 77º lugar na lista dos 100 melhores filmes de terror, elaborada pela revista cosmopolita Time Out.

O enredo do filme “The Day After Tomorrow” (Roland Emmerich, 2004) anda à volta de perturbações da corrente do Golfo. Sem esta corrente marítima, que transporta água relativamente quente das regiões subtropicais para latitudes mais altas, o clima dos EUA e do Canadá, assim como o da Europa ocidental, seria caracterizado por invernos muito mais rigorosos. Perante esta realidade o realizador especula sobre as consequências da interrupção desta corrente marítima, sucedendo-se, no filme, fenómenos meteorológicos de grande intensidade, mergulhando o planeta numa nova era do gelo.

Em “Tempestade Perfeita” (Wolfgang Petersen – 2000), a narrativa é baseada num acontecimento real que ocorreu em outubro de 1991, que consistiu na junção de uma depressão extratropical associada a uma frente fria que se deslocava de oeste para leste, sobre a América do Norte, com o furacão Grace, já em fase de dissipação, vindo do Mar das Caraíbas. Do choque de massas de ar com características termodinâmicas completamente diferentes resultou uma situação meteorológica devastadora, com ventos muito fortes que provocaram ondas com cerca de 30 metros. O filme é baseado no naufrágio do navio pesqueiro Andrea Gail, causado por esta tempestade.

Um outro filme tendo a meteorologia como motivo principal, considerado um clássico, é “O Feitiço do Tempo” (Groundhog Day, de Harold Ramis – 1993), com o conhecido ator Bill Murray, celebrizado pelos filmes “Ghostbusters” (1984) e “Lost in translation” (2003). Inicialmente não granjeou grande sucesso, no entanto, em 2016, foi classificado pelo United States National Film Registry como “cultural, histórica e esteticamente significativo”. O título, se fosse traduzido literalmente para português, seria “O Dia da Marmota”. O filme tem como motivo principal a previsão do tempo feita por uma marmota, roedor da família dos esquilos, característico das regiões montanhosas do hemisfério norte. Apesar da fraca qualidade do animal como meteorologista, a realidade é que se reúnem anualmente milhares de pessoas para participarem no Festival da Marmota. O filme relata as desventuras de um meteorologista, Phil Connors, apresentador da informação meteorológica numa estação televisiva regional dos Estados unidos da América, que fora incumbido de fazer a reportagem sobre a cerimónia em que o roedor procede à previsão do tempo.

De acordo com a tradição (que teve início na pequena cidade norte-americana Punxsutawney, na Pensilvânia, em 2 de fevereiro de1887), se a marmota, ao ser retirada da sua casota, vir a sua sombra e voltar a entrar, é prenúncio de que o tempo vai continuar invernoso nas próximas seis semanas. Caso contrário, será sinal que o tempo primaveril se fará sentir precocemente. Para não haver dúvidas, o presidente do Clube da Marmota simula interrogar o roedor, e anuncia ao público a previsão. O filme não informa se as previsões são acertadas ou não, mas uma breve pesquisa leva-nos a saber que a fama do roedor como meteorologista não é muito lisonjeira, pois o número de previsões certas não atinge 40%, inferior à probabilidade de acerto, no lançamento de uma moeda ao ar, se é cara ou coroa. O meteorologista Phil Connors, indivíduo arrogante, uma vez feita a reportagem do acontecimento, prepara-se para regressar ao estúdio de TV, mas é impedido por a uma forte tempestade de neve. Tendo voltado ao hotel, parece ser vítima de um feitiço. O tempo parou, para ele, no dia 2 de fevereiro. As cenas repetem-se todos os dias, o que faz com que o arrogante Connors entre em desespero, incompreensivelmente preso numa longa pausa do tempo. O feitiço apenas desaparece quando o meteorologista passa a adotar um comportamento humilde.

Muitos outros filmes com o tempo e o clima como temas principais se poderiam mencionar. No entanto, ficamos por aqui…

2 Jul 2020

A meteorologia e a pandemia covid-19

[dropcap]M[/dropcap]uitos artigos têm sido escritos sobre as implicações da pandemia COVID-19 na vida social, cultural, científica, económica, financeira, etc. Também têm sido publicados textos relacionados com a pandemia e o clima, alguns especulativos, e até a própria Organização Meteorológica Mundial – OMM (World Meteorological Organization – WMO) se debruçou sobre as implicações na área da meteorologia, tendo manifestado preocupação sobre a fiabilidade das previsões meteorológicas durante o período em que a pandemia tem vindo a grassar (no Website da OMM pode-se ler: WMO is concerned about the impact of the COVID-19 pandemic on the quantity and quality of weather observations and forecasts, as well as atmospheric and climate monitoring).

O grande público não se terá apercebido, mas é natural que a fiabilidade das previsões meteorológicas tenha sido afetado pelo facto de milhares de aeronaves terem permanecido em terra durante um largo período. Mas, perguntará o leitor, “que têm a ver os aviões com o grau de acerto das previsões meteorológicas”? De maneira sucinta tentaremos esclarecer.

As previsões são baseadas em medições dos vários parâmetros meteorológicos (temperatura do ar, pressão atmosférica, direção e velocidade do vento, nebulosidade, humidade, visibilidade, etc.), no mar e em terra, à superfície e em altitude. Até há alguns anos as observações de superfície eram feitas exclusivamente por profissionais (observadores meteorológicos), em estações meteorológicas designadas por estações sinóticas. As observações eram feitas nas chamadas horas sinóticas principais (00:00, 06:00, 12:00, 18:00 UTC) e nas horas sinóticas intermédias (03:00, 09:00, 15:00 e 21:00 UTC). Para poderem ser comparáveis a nível global, as observações eram feitas simultaneamente nas horas expressas em Tempo Universal Coordenado (Coordinated Universal Time-UTC, sucessor do Greenwich Mean Time-GMT). À medida que a tecnologia foi avançando, as estações clássicas foram sendo substituídas por estações automáticas. A grande vantagem destas últimas reside no facto de as observações poderem ser feitas e transmitidas continuamente, na medida em que não precisam da intervenção humana. Apresentam, no entanto, algumas desvantagens, como, por exemplo, impossibilidade de classificarem as nuvens de acordo com as dezenas de géneros, espécies, variedades e particularidades suplementares. Um equipamento meteorológico, por mais avançado que seja, não consegue classificar e codificar, por exemplo, nuvens como sendo altocúmulos lenticularis perlucidus com virga associada (género – altocúmulo; espécie – lenticularis; variedade – perlucidus; particularidade – virga). Para o meteorologista que analisa a situação e elabora previsões, é muito importante saber o tipo e quantidade de nuvens que existem nos locais em que são feitas as observações, na medida em que refletem muito do que se passa na atmosfera. Diriam os poetas que “as nuvens traduzem os estados de alma da atmosfera”.

As estações automáticas, além de não poderem substituir cabalmente os observadores meteorológicos, necessitam de ser inspecionadas frequentemente por peritos que procedem à limpeza e aferição dos sensores, na medida em que, não sendo manipuladas diariamente pelos observadores, estão mais sujeitas a deterioração. A falta de manutenção dos instrumentos provocada pelo confinamento de muitos profissionais poderá estar também na origem de erros de leitura de vários parâmetros.

Nos oceanos recorre-se a estações meteorológicas instaladas em boias e navios. Os satélites meteorológicos permitem uma cobertura de todo o globo, mas a medição dos vários parâmetros meteorológicos não é feita com o mesmo rigor do que as observações in situ. Também são utilizados radares para deteção e seguimento de certos fenómenos meteorológicos, como precipitação intensa, ciclones tropicais, tornados, etc.

Além de milhares de estações sinóticas espalhadas por todo o globo, existem ainda as estações aerológicas, em que as observações são feitas às 00:00 e 12:00 UTC, por sondas contendo sensores de temperatura, de humidade relativa e de pressão. Impulsionadas por balões cheios de hélio ou hidrogénio, as sondas procedem à medição destes parâmetros, e do vento, a vários níveis de altitude.

Um complemento importante às observações regulares em altitude são as efetuadas automaticamente por instrumentos instalados a bordo de aeronaves. Cerca de três mil aviões, de 43 companhias aéreas, procedem a observações no âmbito do programa da OMM “The global Aircraft Meteorological DAta Relay – AMDAR”, fazendo diariamente mais de 800.000 medições da temperatura, da direção e da velocidade do vento, registando também as coordenadas dos locais onde são feitas as observações. Além destes parâmetros, é cada vez mais frequentemente a medição da humidade e da turbulência.

Designa-se por Sistema Global de Observação da OMM (WMO Global Observing System-GOS) o conjunto de métodos, instalações e equipamentos envolvidos na realização das observações meteorológicas à escala global. Abrange os Serviços Meteorológicos Nacionais (SMNs), boias, navios, radares meteorológicos, aviões, satélites, etc.

Os dados obtidos através do GOS são recebidos em terra pelos vários SMNs, onde são sujeitos a controlo de qualidade, processados e transmitidos para centros meteorológicos nacionais, regionais e mundiais. Uma vez na posse dos dados, marcam-se os respetivos valores em cartas de superfície e de altitude, e procede-se à respetiva análise. Nas cartas de superfície traçam-se as frentes e os sistemas de pressão (anticiclones, depressões, vales, cristas, colos, etc.) e, nas de altitude, são identificadas faixas de ventos muito fortes, designadas por correntes de jato, e zonas de perigosidade para a aviação, como turbulência severa, formação de gelo, cinzas vulcânicas, etc. Os valores dos parâmetros meteorológicos servem também de input para modelos físico-matemáticos que elaboram prognósticos que podem ser reproduzidos na forma de cartas que cobrem vastas regiões, com períodos de validade em geral de 12, 24, 48, 72 ou mais horas.

Para efeitos aeronáuticos, foram estabelecidos pela OMM e pela Organização da Aviação Civil Internacional – OACI (International Civil Aviation Organization – ICAO) dois centros mundiais (Londres e Washington), que fazem parte do designado World Area Forecast System – WAFS, onde se produzem cartas de prognóstico de tempo significativo para que os operadores aeronáuticos possam elaborar os planos de voo, selecionando as rotas mais convenientes em termos meteorológicos e de poupança de combustível. Estas cartas fazem parte da documentação de voo das tripulações, de modo a que possam evitar zonas de maior perigosidade, como, por exemplo, turbulência severa, cumulonimbos, ciclones tropicais, formação de gelo, cinzas vulcânicas, etc.

As correntes de jato são sinalizadas por setas e os fenómenos meteorológicos mais significativos são representados por símbolos com a indicação da base e topo das camadas, onde será mais provável a sua ocorrência.

Graças a estes prognósticos, a duração das viagens da Europa para Macau, por exemplo, duram significativamente menos do que o percurso inverso, na medida em que há aproveitamento das correntes de jato que têm forte componente oeste-leste nessas latitudes.

Durante a fase mais aguda da pandemia os aviões deixaram praticamente de voar, o que implicou que não tivessem sido feitas milhões de observações em altitude. Não havendo esta informação, a localização e intensidade das correntes de jato não foram eventualmente determinadas com precisão, o que implica análise menos eficiente das cartas meteorológicas de altitude. Como os prognósticos são baseados nas análises, e estas baseadas em observações, depreende-se que a fiabilidade das previsões para efeitos aeronáuticos diminuiu. Mas, poderá comentar o leitor, “pouca diferença fez à aviação, na medida em que os aviões praticamente deixaram de voar!”. Isso é uma realidade, mas não nos esqueçamos dos voos de emergência e outros, como os de repatriamento, em que os operadores fizeram os cálculos da quantidade necessária de combustível sem que tivessem ao seu dispor cartas de prognóstico com a mesma fiabilidade a que estavam habituados. As previsões para outros fins, além dos aeronáuticos, também poderão ter sido afetadas na medida em que, não sendo detetadas corretamente a localização e intensidade das correntes de jato, isso também se reflete na previsão do deslocamento das frentes e dos sistemas de pressão à superfície.

Pode-se então concluir que a ausência de observações feitas pelas aeronaves e a falta de manutenção de equipamentos devido ao confinamento de muitos profissionais muito provavelmente contribuíram para uma previsão do tempo menos eficiente, durante o período de ocorrência da pandemia Covid-19.

4 Jun 2020

Meteorologia | Frio até ao final da próxima semana

[dropcap]A[/dropcap]temperatura vai descer acentuadamente a partir de hoje à noite, devido à chegada de uma monção forte de inverno à costa meridional da China, devendo o frio manter-se até ao final da próxima semana, segundo as previsões dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG). Na véspera e no dia do Ano Novo, por causa da influência de uma massa de ar frio, trazida por esta monção, os SMG antecipam que a temperatura mínima ronde os 8 graus celsius. O céu estará geralmente muito nublado, acompanhado de chuva e o vento vai soprar do quadrante norte, antecipando-se que seja relativamente forte. Os SMG aconselham a população a prestar atenção à variação do tempo e a manter-se agasalhada.

27 Dez 2018

Meteorologia | Inundações no Porto Interior no fim-de-semana

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos prevê inundações no Porto Interior, segundo explicou, ontem, Vera Varela, porta-voz destes serviços ao canal de rádio da TDM, que acrescentou que o tempo será também instável nos próximos dias. “Está a desenvolver-se, no Mar do Sul da China, uma área de baixa pressão e vai mover-se lentamente para Norte e vai trazer tempo instável para a região. Este tempo instável vai ser agravado também pela maré astronómica e pelos ventos fortes que podem trazer inundações para a zona do Porto Interior entre os dias 10 e 13 de Agosto”, indicou Vera Varela. Os Serviços Meteorológicos e Geofísicos recomendam que as pessoas estejam atentas à informação divulgada e que tomem as devidas precauções.

9 Ago 2018