João Luz Perfil PessoasMaria Ana Nascimento, estudante de tradução: “Macau é uma cidade sorridente” [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]aria Ana nasceu em Macau e por aqui viveu até fazer um ano. Como é natural, não tinha qualquer recordação da cidade. A imagem que foi construindo era baseada apenas nas estórias que os pais lhe contaram dos seus tempos asiáticos. Quis o destino que, 23 anos depois, a cidade regressasse à sua vida, e ela à cidade. Apesar de ter crescido a meio mundo de distância, assim que chegou a Macau Maria Ana não sentiu a cidade como um sítio estranho, aliás, teve “uma sensação esquisita de familiaridade”. Não vai tão longe ao ponto de assumir o regresso como o retorno a casa, mas reconhece que se sentiu diferente quando, por exemplo, chegou a Pequim. Na capital chinesa, a estudante experienciou um maior choque cultural, uma avolumada diferença. “Macau é uma terra que não me é desconhecida no seu todo”, revela. Depois foi reconhecendo os locais das estórias dos seus pais, e estes sítios sentiu-os como algo familiar. De resto, o maior impacto que teve quando aqui chegou foi apreendido na pele: a humidade. Outro aspecto que a fez sentir-se bem-vinda foi identificar “algumas réstias de Portugal” pela cidade. Assim como pedaços, obviamente, da China Continental. Neste contexto, Maria Ana considera Macau uma terra “com uma cultura e sociedade muito próprias”. Além disso, a estudante finalista de tradução de chinês acha que “é uma cidade muito amiga, sorridente, que sabe acolher”. Neste aspecto, Maria Ana alerta que é necessário saber morar aqui. Macau é um lugar que não aceita bem quem cá chega com manias de superioridade, quem desvaloriza a cultura do outro, quem não respeita. Mas com o respeito vem a amizade com que a cidade retribui, na opinião da estudante. “Quando andas na rua ouves português, chinês, inglês, cantonês, é uma cidade muito multicultural, em todos os sentidos. Apesar de ser pequena em território, essa multiculturalidade torna Macau muito grande.” Terra de oportunidades Aos 24 anos, Maria Ana gosta de pensar que o seu futuro passará por Macau, até porque é uma terra onde vê oportunidades, em especial na sua área profissional. Em Portugal existem saídas para quem tira tradução de chinês, mas além de não serem satisfatórias, não são evidentes. “Vejo pelos meus colegas de curso que estão em estágios onde não fazem aquilo que gostam”, conta. Em Macau, Maria Ana sente que “o português e o chinês estão em cooperação e a precisar muito de trabalhar juntos”. Quando se candidatou ao estágio no Instituto Politécnico de Macau, uma das suas grandes motivações foi, precisamente, regressar à terra onde nasceu, “não foi uma decisão muito difícil”. Por cá estagia num laboratório de tradução onde se está a desenvolver um tradutor automático. No seu prato tem, essencialmente, trabalho de revisão, ou seja, avalia se as frases equivalem ao correspondente chinês e se estão bem escritas em português. “Estou a gostar bastante, não só pelo tipo de projecto que é, nem por ser uma oportunidade única, mas também porque nos está a dar uma grande bagagem de vocabulário e gramática em chinês”, conta. No entanto, profissionalmente os horizontes da estudante não se limitam à tradução. Já com outro curso no currículo, Sociologia, Maria Ana tem o sonho de trabalhar nas Nações Unidas. Nesta organização gostaria de poder desenvolver pesquisa nas áreas do género, com relevo para o papel da mulher na sociedade, ou nas questões ligadas às desigualdades sociais. Outra área que a apaixona é a educação, em particular de crianças que precisam de cuidados especiais. No que toca a sentir falta de casa, de Portugal do seu cantinho nas Caldas da Rainha, Maria Ana não alimenta sentimentalismos ou saudosismo. “Ultrapasso bem as saudades. Não sou uma pessoa que esteja sempre a pensar no fuso horário, nas horas que são em Portugal para conseguir falar com alguém”, diz. Também não é fria ao ponto de dizer que não tem saudades, em especial quando estas apertam durante as datas e as celebrações que normalmente passaria em família. Mas o facto é que, no dia-a-dia, todos têm o seu trabalho, e sabe que não ficaria em casa dos pais para sempre. Quando a saudade aperta, as redes sociais ajudam na ponte com Portugal e aproximam de quem mais gosta.