Taiwan | Macau repudia relatório sobre diminuição de liberdades

O Governo liderado por Ho Iat Seng acusa Taiwan de ter vários preconceitos e recusa que as liberdades legalmente estipuladas tenham sido beliscadas pelas proibições sobre o 4 de Junho e os acontecimentos dentro da TDM

 

O Governo demonstrou “repúdio e oposição” ao relatório das autoridades de Taiwan onde, entre outras situações, denunciam a diminuição das liberdades e garantias no território em 2021.

“O conselho da região de Taiwan para os assuntos do Interior da China divulgou recentemente um dito relatório de estudo e análise sobre a situação de Macau, que tece comentários irresponsáveis sobre o desenvolvimento social, político e económico de Macau, e não corresponde severamente à realidade local, estando repleto de preconceitos”, indicou o Governo, em comunicado divulgado no sábado.

“Por essa razão, o Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) manifesta o seu mais firme repúdio e oposição”, acrescentaram as autoridades.

No relatório referente ao 22.º ano da passagem de administração de Macau para a China, Taiwan indica que em 2021 o ponto de vista do Partido Comunista da China sobre a segurança nacional foi incorporado no sistema administrativo de Macau.

Taiwan recorda ainda que as “restrições do direito de reunião e da liberdade de imprensa foram frequentes”, frisando ainda que a opinião pública está preocupada que a voz pluralista da sociedade possa tornar-se ainda mais fraca. “Há preocupações de que o sistema de Macau esteja a tornar-se mais chinês”, denunciaram.

De acordo com a lei

No ano passado, o campo pró-democrata foi impedido de concorrer às eleições legislativas por terem sido considerados infiéis ao território, houve uma directiva para Teledifusão de Macau (TDM) que proibiu os jornalistas dos canais portugueses e ingleses de divulgarem informações e opiniões contrárias às políticas da China e o Tribunal de Última Instância (TUI) de Macau chumbou o recurso para uma vigília no Largo do Senado em memória das vítimas de Tiananmen por considerar que a liberdade de reunião não pode admitir “abusos e ofensas sem limites”.

O Governo de Macau, no comunicado, nega esta narrativa e contrapõe: “As eleições para a VII Assembleia Legislativa e o Chefe do Executivo do V Governo da RAEM, cujos processos decorreram de forma justa, imparcial, pública e íntegra. Os direitos políticos dos residentes, incluindo de manifestação e reunião, têm sido respeitados e garantidos de forma plena, os órgãos de comunicação social têm autonomia e possuem linhas editoriais independentes, e as diferentes vozes podem conviver e serem respeitadas na sociedade de Macau”.

O discurso sobre o reforço patriótico em Macau, assim como o aumento da defesa da segurança nacional tem estado patente em praticamente todos os sectores do poder no território nos últimos anos.

10 Jan 2022

Wong Sio Chak | Liberdade de expressão respeitada, mas secundária face à ordem pública

[dropcap]E[/dropcap]ntrou ontem em vigor a lei da protecção civil, diploma que deu muito que falar durante o processo legislativo devido à criminalização de rumores e disseminação de informação falsa.

O gabinete do secretário para a Segurança emitiu ontem um comunicado a garantir que a aplicação do diploma não afecta “o máximo respeito pela liberdade de expressão das pessoas, embora num contexto de não preterição de salvaguarda da segurança e ordem públicas, bem como da tranquilidade da sociedade”.

Trocado por miúdos, se for entendido que a liberdade de expressão coloca em perigo a segurança e ordem pública o direito fundamental pode passar para segundo plano, “enquanto se mantiver o estado de prevenção imediata, socorro ou calamidade”.

O comunicado argumenta que as autoridades melhoraram sistematicamente o diploma, com o objectivo de melhor reflectir a opinião do público.

Recorde-se que durante o processo legislativo, a Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau e a Associação dos Jornalistas de Macau opuseram-se à criminalização de rumores e notícias falsas e a Associação Novo Macau recolheu 1500 assinaturas numa petição que exigia a retirada do artigo em questão.

A petição foi entregue à comissão da Assembleia Legislativa que analisou o diploma na especialidade, que a arquivou. A comissão do órgão legislativo, à altura presidido por Ho Iat Seng, sublinhou que a “lei pretende criminalizar apenas a publicação de notícias com um conteúdo falso, de modo propositado enquanto vigorar o estado de prevenção. Não se pretende punir o erro na apuração da notícia”.

Dar uma mãozinha

Outro dos destaques da mensagem de Wong Sio Chak foi o estatuto do “voluntário interveniente na protecção civil”. Reafirmando a ideia de que o Hato foi um momento de aprendizagem, a lei que entrou ontem em vigor pretende captar e organizar a força social que se mobilizou para ajudar na limpeza da cidade depois da passagem do tufão.

Assim sendo, os voluntários serão acreditados e registados pelos Serviços de Polícia Unitários (SPU), e equiparados a “auxiliares externos do sistema de protecção civil”, sob coordenação das autoridades. Wong Sio Chak revelou ainda que as autoridades estão a planear a forma como vão gerir o voluntariado e preparar a sua actuação. Os voluntários vão ter seguro obrigatório e serão dotados de “protecção penal quando intervêm em trabalhos específicos”.

16 Set 2020

ONU | Governo vai enviar relatório sobre liberdade de expressão

[dropcap]O[/dropcap] Executivo vai enviar um relatório para responder às críticas e defender-se no âmbito das restrições à liberdade de expressão, de reunião e manifestação e ainda da limitação da entrada de jornalistas do exterior.

Estas foram as críticas enviadas à Organização das Nações Unidas pelas associações Macau Research Group e Novo Macau e contaram com a contestação do jurista Gabriel Tong e da Federação de Juventude de Macau. Na sexta-feira, André Cheong afirmou que será compilado um relatório para responder às situações relatadas.

1 Jun 2020

Correspondentes estrangeiros denunciam crescente intimidação do Governo

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]epois de uns anos mais soft, o poder chinês volta a cerrar fileiras e tornar difícil a vida aos jornalistas.

O Clube dos Correspondentes Estrangeiros na China denunciou ontem “uma crescente perseguição e intimidação” por parte do Governo chinês, que intensificou as tentativas de negar ou limitar o acesso de jornalistas estrangeiros a muitos locais do país.

A organização publicou ontem o relatório “Acesso negado: vigilância, perseguição e intimidação enquanto as condições para informar na China se agravam”, elaborado a partir de inquéritos feitos a correspondentes e órgãos de comunicação social sobre as suas experiências o ano passado neste país asiático.

O documento dá conta de um aumento do número de correspondentes estrangeiros que dizem que o jornalismo na China se tornou mais difícil devido às crescentes pressões das autoridades, que tentam impedir o acesso a locais sensíveis, como Xinjiang, região no noroeste e casa da minoria muçulmana uigur, a fronteira com a Coreia do Norte e zonas industriais. “Os resultados da nossa pesquisa dão evidências sólidas que sugerem que, a partir de um ponto e referência muito baixo, as condições para informar estão a piorar”, alerta o Clube dos Correspondentes Estrangeiros na China em comunicado.

Cerca de metade dos correspondentes entrevistados confessaram ter experimentado a interferência, perseguição e violência física no exercício do seu trabalho e 26% garantiu que as suas fontes também foram perseguidas, detidas e interrogadas, uma situação que se repete há anos.

O ano passado também não diminuíram os ataques violentos contra jornalistas estrangeiros e a intimidação aos órgãos de comunicação, que continuaram, assim, como as crescentes preocupações sobre a vigilância governamental e a invasão da privacidade que sofrem os seus correspondentes.

O relatório nota ainda que as autoridades chinesas estão a utilizar o processo de renovação de vistos para pressionar os jornalistas e os meios de comunicação cujo trabalho não é do seu agrado. O Comité para a Protecção de Jornalistas, no seu último relatório, publicado em Dezembro último, deu conta que a China era o segundo país no mundo com mais jornalistas detidos, 41 no total.

31 Jan 2018

Liberdade de expressão

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 4 o Tribunal de Apelação de Hong Kong (COFA) rejeitou por unanimidade o caso apresentado por Christine Fong Kwok Shan.

A história conta-se em poucas palavras. Christine combatia o projecto de expansão dos aterros de resíduos tóxicos da South-East New Territories. Integrou um grupo que se manifestou durante as duas sessões do Conselho Legislativo abertas ao público, nas quais o sub-comité das Obras Públicas apresentou o projecto à discussão.

Durante os protestos, Christine despiu o casaco revelando uma t-shirt que tinha escrito “Defendam Tseung Kwan O”. A seguir entregou um cartaz a um companheiro, que tinha desenhada uma suástica e onde se podia ler “Aterro – Campo de Concentração de Gases Venenosos”. O homem, na galeria pública que encima o recinto, exibiu o cartaz. A manifestação foi interrompida pela intervenção dos seguranças que de imediato lhe tentaram arrancar o cartaz, acabando um deles ferido num pulso. O incidente provocou a suspensão antecipada da sessão.

Após a retoma da reunião Christine e os companheiros entoaram vários slogans. Na altura foram avisados pelo presidente do sub-comité das Obras Públicas que seriam expulsos da sala se não se calassem. Como ignoraram o aviso e deram os braços para resistir à expulsão, a sessão voltou a ser suspensa. Os trabalhos prosseguiram passado uma hora, noutra sala de conferências, mas desta vez sem a presença do público.

Christine foi mais tarde condenada por infracção da secção 12(1) das Directrizes Administrativas do Regulamento de Admissão e Conduta Pessoal, que estipula o seguinte,

“Não é permitido a exibição de cartazes e faixas com símbolos ou mensagens, em galerias reservadas ao público ou à imprensa”.

Foi também condenada por infracção da secção 11 que determina que, quem der entrada no recinto do Conselho Legislativo, terá de o fazer de forma ordeira.

Christine foi sentenciada, após julgamento do Tribunal de Magistrados, ao pagamento de uma multa de 1.000 Hong Kong Dólares por cada acusação. Mas Christine apresentou recurso da sentença, na convicção de que o princípio da liberdade de expressão, consignado no artigo 27 da Lei Básica de Hong e no artigo 16 da lei que regula a “Declaração dos Direitos Humanos”, tornam as secções 11 e 12 anticonstitucionais, na medida em que estas disposições violam a liberdade de expressão, ao proibirem a exibição pública de símbolos e mensagens.

O COFA reiterou as decisões dos dois tribunais de instância inferior. Para tal recorreu ao artigo 39 da Lei Básica de Hong Kong e ao artigo 16 da Declaração dos Direitos Humanos, concluindo que se pode proibir manifestações de protesto nas galerias do Conselho Legislativo, desde que exista o risco de criarem desordem e interferência com os direitos dos outros observadores. As restrições impostas pela lei são necessárias para proteger a ordem pública e fazer respeitar os direitos dos outros cidadãos.

O COFA adiantou ainda que os limites da liberdade de expressão nas galerias do Conselho Legislativo são “claramente proporcionados e justificados” permitindo que a legislatura prossiga com o cumprimento das suas funções legais.

Esta argumentação demonstra o equilíbrio que é necessário entre liberdade de expressão e respeito pelos demais. Pelos motivos apontados o recurso de Christine foi rejeitado. Não poderá haver mais recursos na medida em que a decisão foi tomada pelo Tribunal da mais alta instância.

Com a implementação do Direito Comum em Hong Kong, o precedente jurídico desempenhará um papel muito importante no sistema legal. O precedente jurídico aberto pelo COFA fará parte das leis de Hong Kong. Todos os tribunais da cidade estarão obrigados a seguir a decisão. Nesta deliberação o COFA decidiu uma vez mais que a Lei Básica de Hong Kong garante vários tipos de liberdade aos seus residentes. Estes direitos serão garantidos de futuro. No entanto, deveremos ser razoáveis no exercício destes direitos. Foi declarado que “comportamentos desordeiros e exibição de cartazes de protesto” são comportamentos não aceitáveis nas galerias do Conselho Legislativo. Portanto, futuramente, se alguém tiver uma atitude semelhante, será certamente condenado em tribunal.

Os limites da liberdade de expressão foram outro dos argumentos apresentados pelo Tribunal. Estes limites têm de ser estipulados pela lei, de forma a proteger a segurança dos cidadãos, mas também a liberdade de expressão. Será sempre uma tentativa de ajuste entre estes dois direitos básicos. No Conselho Legislativo o público tem de se comportar de forma ordeira e não é permitida a exibição de cartazes de protesto, logo não é permitida qualquer manifestação. O Conselho Legislativo é um local destinado à criação de legislação, abrigo da Lei Básica da cidade. As manifestações podem originar desordem pública, e podem interferir com os deveres dos deputados. Os protestos podem ainda afectar os outros observadores da sessão. No entanto, será necessário que a lei defina o que representa exactamente transgressão a estes regulamentos. O Conselho Legislativo destina-se aos legisladores, não é local para manifestações e protestos.

Ninguém gosta de viver perto de lixeiras, sobretudo se se tratar de um aterro de resíduos tóxicos. Os sentimentos dos manifestantes são compreensíveis. Mas do ponto de vista social, expressar opiniões de forma leviana não é aceitável. Seremos todos afectados. Esperamos sinceramente que não existam mais manifestações de protestos insensatas.

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
24 Out 2017

Liberdade de expressão em xeque

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] que é demais em termos de liberdade de expressão? Quais são as barreiras que devemos aceitar como socialmente aceitáveis à liberdade de expressão? Quando é que alguém foi longe de mais na sua liberdade de expressão?

É desprestigiante, ofensivo para um regime político (seja ele qual for) mostrar que o rei, pouco antes de o ser, se passeava num centro comercial, acompanhado por uma amiga, envergando uma camisola de alças, mínima, que deixava ver as várias tatuagens que tem no dorso? Até que ponto devem ser proibidas as imagens de um herdeiro da coroa (seja ela qual for), nu, provavelmente alcoolizado, numa festa privada, a dançar com uma garrafa de cerveja na mão, rodeado por várias mulheres que há muito deixaram cair os seus soutiens?

É aceitável, é socialmente aceitável, que se deixe diminuir o direito à liberdade de expressão para proteger um valor como o respeito por uma casa real? Ou por um governo?

E que tipo de linguagem, ou imagens, podem ser suprimidas? Devemos apenas suprimir as mensagens que apelam ao ódio e à violência, ou devemos também apagar das redes sociais as imagens que os mais variados pais partilham dos seus filhos pequenos a fazer as coisas mais extraordinárias, a tomarem banho ou mascarados com os fatos mais extraordinários? Quem protege o direito à privacidade das crianças que os próprios progenitores deixaram de defender devido a um sentido absolutamente ilusório de fama momentânea? Se retiramos imagens da internet porque atentam contra o pudor, não deveríamos da mesma maneira retirar as imagens das crianças – quem protege as crianças quando os pais não são responsáveis por elas? Quem espoleta esses mecanismos de substituição?

Se consideramos que a lei pode e deve proteger a sociedade de quem escreve “vamos matar os brancos todos”, “morte aos azuis”, “todos os vermelhos para Madagáscar!”, não deveríamos proteger também as crianças de hoje que, quando forem homens e mulheres, terão todos os momentos da sua vida disponíveis na internet, devido à sede de protagonismo dos seus próprios pais? E os complexos que poderemos estar a desenvolver nas crianças que se irão fazer adultos ao terem toda a sua vida exposta na internet? Há casos de bullying nas escolas que passam pela partilha, em grupos de alunos, de imagens disponibilizadas pelos pais nas redes sociais…

O governo alemão quer restringir a liberdade de expressão quando ela atente contra a democracia. E quer que as redes sociais retirem quase instantaneamente as imagens e expressões que possam ser considerada abusivas. A questão não é de todo consensual. E levanta várias questões, como algumas das percorridas neste texto. Uma das críticas que se escutam é que, quando se admite a retirada do discurso que apela à violência, estamos a abrir demasiado a porta a uma prática que dá pelo nome de censura. Há quem prefira que os discursos de conteúdo racial ou de ódio se mantenham na internet a serem retirados. É preferível que lá estejam para que possam ser combatidos na mesma arena. Com argumentação racional. Com factos. Outras das questões que merece reflexão é quem decide o que é aceitável. Será a rede social a definir o que é tolerado ou um tribunal? Se se for pela via judicial, será possível dar resposta nas 24 horas estabelecidas como o tempo máximo para retirar o conteúdo?

A guerra contra as notícias inventadas não é nova. Há anos, a campanha era contra os mitos urbanos. Por outro lado, governos a mentir às populações e a puxar por factos (alternativos, parcialmente verdadeiros – porque não postos em perspectiva) sempre existiram. Chama-se propaganda. Se se combate agora o discurso que incita à violência, está aberta a porta para depois se apagar todos os factos alternativos, todas as notícias inventadas, todo o discurso não-convencional. Uma das formas mais eficazes de combater a propaganda é garantir que o direito à expressão livre seja universal. Como as redes sociais geram milhões de lucros, acabam por aceitar a imposição que lhes é feita pelos governos. Só nos Estados Unidos, o Facebook tem neste momento mais censores online do que o Washington Post e o New York Times, juntos, têm funcionários.

Agora que é a Alemanha a pôr restrições à liberdade de expressão, os seus arautos, sempre disponíveis para atacar uma meia dúzia de suspeitos habituais, têm muito por onde fazer barulho nos próximos tempos. Irão fazê-lo?

22 Mai 2017