Criminalidade | “Jogo ilícito” com aumento superior a 900 por cento

As alterações à “Lei de combate aos crimes de jogo ilícito”, que aditaram o crime de câmbio ilegal, levaram a mais ocorrências. Só num ano houve um aumento de 906,3 por cento de crimes associados ao “jogo ilícito”. Os dados são relativos ao primeiro trimestre deste ano e foram ontem divulgados pelo secretário Wong Sio Chak

 

A lei mudou e o crime aumentou. Foi assim com o câmbio ilegal em casinos, uma vez que a actividade passou a ser criminalizada com a alteração à “Lei de combate aos crimes de jogo ilícito” no ano passado.

Segundo o balanço da criminalidade feito ontem, os crimes associados ao jogo ilícito subiram 906,3 por cento, tendo-se registado 161 casos no primeiro trimestre deste ano face aos 16 do ano passado, crescimento potenciado pelos casos de câmbio ilegal. A mudança legislativa em causa “levou a um grande aumento deste tipo de criminalidade, sobretudo no que diz respeito aos câmbios ilegais”, foi referido.

Ao aditar-se o crime de “Exploração de câmbio ilícito para jogo”, foi assim, ajustado “o âmbito de cobertura de alguns crimes relacionados, o que teve como consequência o aumento dos crimes relacionados com o jogo ilícito”, foi acrescentado.

Na conferência de imprensa de ontem, o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, referiu que as autoridades policiais vão continuar “a reforçar os trabalhos de prevenção e de execução da lei”, além de acompanharem “e analisarem o desenvolvimento da criminalidade”.

Trocas e baldrocas

Em termos gerais, os crimes associados ao jogo também aumentaram, com a instauração de 567 inquéritos, mais 216 face ao primeiro trimestre de 2024, representando um aumento de 61,5 por cento.

Segundo uma nota de imprensa do gabinete de Wong Sio Chak, “acredita-se que a causa principal deste aumento está relacionada com a criminalização da ‘troca ilegal de dinheiro'”, “o desmantelamento de várias redes criminosas pertinentes, nas operações conjuntas, assim como factores incertos da sociedade resultantes do aumento de turistas”.

No panorama geral da criminalidade, a polícia instaurou, no total, 3.289 inquéritos criminais, o que representa um decréscimo de 260 casos e traduz uma decida de 7,3 por cento relativamente ao mesmo período do ano de 2024.

Táxis | Mais de 700 infracções em três meses

Os dados divulgados ontem pelo Executivo mostram como as infracções cometidas por taxistas não pararam de aumentar. Só no primeiro trimestre deste ano foram registadas 773 infracções, sendo que 660 foram detectadas pelos agentes do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP).

Segundo as autoridades, “mais de metade foram situações em que os condutores de táxis não aguardaram por ordem de chegada pelos clientes nas praças de táxis”. A polícia diz ter “tratado os casos em conformidade com a lei e apelado aos infractores para não voltarem a infringir a lei”.

28 Mai 2025

Jogo ilícito | Advogados consideram revisão “necessária”, mas deixam alertas

Uma das novidades legislativas do relatório das Linhas de Acção Governativa para o próximo ano é a revisão do regime do jogo ilícito, em vigor desde 1996. Pouco se sabe o que sairá dessa reforma, que dois advogados entendem ser necessária. Carlos Lobo defende que deve haver uma coordenação com outras leis, nomeadamente com o diploma que regula os junkets, ainda em discussão no hemiciclo

 

Data de 1996 o regime do jogo ilícito em vigor, ainda o sector não tinha sido liberalizado e Macau era governado pela administração portuguesa. Mais de duas décadas depois, as autoridades pretendem rever o diploma, tendo sido esta uma das medidas anunciadas no relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para o próximo ano.

O HM contactou dois advogados para perceber o que poderemos esperar desta proposta de lei, numa altura em que o Governo pouco ou nada adiantou sobre o assunto.

“Concordo que seja necessária a revisão desta legislação juntamente com a restante. Seria importante que todo o regime jurídico do jogo pudesse estar mais próximo da realidade, porque na verdade a maior parte da legislação já tem mais de duas décadas”, começou por dizer Óscar Madureira.

Ainda que Macau “não tenha propriamente operações de jogo ilegais, o que seria uma actividade muito fácil de detectar, muitas vezes o que acontece é que existem actividades de jogo paralelas, e apostas ilegais decorrentes disso, praticadas em casinos legalizados”.

Nesse sentido, “essa é uma realidade para a qual a legislação não estava actualizada”, aponta o causídico, que dá alguns exemplos de novidades em matéria de apostas que devem estar contempladas no novo diploma.

“Seria importante que ficasse determinada qual a moldura penal para as apostas paralelas e o tratamento que é dado ao regime do chamado ‘proxy betting’ [apostas feitas por alguém designado]. Se a proposta de lei tiver esses elementos penso que será muito útil”, adiantou Óscar Madureira.

Lei anacrónica

Para Carlos Lobo, também advogado e especialista nesta área, o regime de jogo ilícito de 1996 está “desfasado do tempo” mesmo com todas as alterações legislativas que já tiveram lugar, nomeadamente em 2001 e as mais recentes.

“É aceitável e será necessária a sua actualização. Resta saber em que termos vai acontecer e o que se quer, se engloba aquelas que devem ser consideradas como actividades ilícitas.”

Carlos Lobo pede também uma discussão mais ampla e abrangente, nomeadamente através de uma consulta pública, pois “falamos de limitações graves às vidas das pessoas, em muitos casos em penas de prisão”. “A revisão deve ser feita de forma ponderada e cuidada”, defendeu.

Na visão do advogado, os casos da Suncity e Tak Chun, que colocaram atrás das grades os outrora grandes empresários do sector das apostas VIP, agora acusados de branqueamento de capitais e outros crimes, serviram de “chamada de atenção”.

“A lei já deveria ter sido revista há mais tempo, e o Governo e as autoridades judiciais provavelmente perceberam, pelas investigações que fizeram ao caso da Suncity e da Tak Chun, que pode ter havido actividades que são sujeitas a moldura penal. Perceberam que há muitas actividades que não estão penalizadas e que deveriam estar. Penso que estes casos foram um ‘wake-up call’ para as autoridades e esta acção só peca por tardia.”

Carlos Lobo não deixa de frisar ainda outro ponto, que é o facto de estar ainda a ser discutida na especialidade, na Assembleia Legislativa, o regime da actividade de exploração de jogos de fortuna ou azar em casino, que regula a actividade junket.

Trata-se de um diploma “que aparentemente também tem normais penais”, sendo “crucial coordenar uma revisão do jogo ilícito com esta lei, para que não seja legislada de forma autónoma, mas de uma maneira integrada, juntamente com a nova lei do jogo”.

Olhar as dificuldades

Aquando da apresentação do relatório das LAG, Ho Iat Seng era um homem optimista em relação à recuperação do sector do jogo em relação à actual crise económica, lembrando que a possível falência das operadoras é uma carta fora do baralho. O governante não deixou de lembrar que, durante vários anos, as concessionárias ganharam milhões.

Para Carlos Lobo, a equação não é assim tão simples. “Não duvido da capacidade financeira das operadoras, mas julgo que tem de haver da parte do Governo [uma compreensão] das enormes dificuldades que as operadoras têm passado nos últimos três anos, incluindo as que ainda estão por vir, porque não vão recuperar desta crise em seis meses.”

Isto porque “os montantes a serem investidos são feitos com base em perspectivas concretas e hoje ainda não sabemos como vai ser a política de covid zero no futuro ou como se podem diversificar as fontes de jogadores. Ainda há imensas incertezas, e exigir enormes investimentos com base em pouca informação é algo complicado.

Compreendo que o Chefe do Executivo queira mostrar uma posição mais positiva, mas há que reconhecer as dificuldades e não dizer apenas que as operadoras ganharam muito dinheiro”, acrescentou.

O advogado deixa ainda uma crítica à forma sigilosa como o concurso público de atribuição de novas licenças está a ser conduzido. “Uma das minhas críticas a este concurso é o facto de o Governo estar a determinar que é quase tudo sigiloso e ninguém sabe o que se passa. Não conhecemos nenhuma proposta em concreto. Deveria haver uma maior comunicação por parte das autoridades e, em especial, da comissão de concurso para sabermos o que vem aí, sobretudo sabendo que cinco concessões serão renovadas”, rematou.

23 Nov 2022