Hoje Macau China / ÁsiaGuiné | Expectativa de financiamento na véspera da cimeira China-África [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, viajou ontem para Pequim para participar na cimeira África-China, que vai decorrer a 3 e 4 de Setembro, com a expectativa de financiamento chinês ao país no horizonte. “Vamos assistir à cimeira china-África onde vamos ter oportunidade de passar em revista a relação entre o nosso continente e a China e vamos eventualmente ver a disponibilidade da China em acompanhar o continente relativamente ao financiamento de uma série de projectos que nós temos em carteira”, afirmou José Mário Vaz. O chefe de Estado guineense falava aos jornalistas momentos antes de viajar para Pequim. Sobre a Guiné-Bissau, o Presidente disse que há “expectativa” de financiamento de projectos, que vão ser “motores de crescimento” da economia do país. Os projectos estão relacionados com os sectores agrícola, do turismo, pescas, infra-estruturas e minérios. “Mas está tudo em aberto”, disse. Durante a sua estada na China, José Mário Vaz vai reunir-se com o seu homólogo, Xi Jinping.
Victor Ng Manchete SociedadeDiplomacia | Chan Meng Kam designado cônsul honorário da Guiné-Bissau A Guiné-Bissau tem um novo cônsul honorário em Macau. Ex-deputado, empresário e actual membro do Conselho Executivo, Chan Meng Kam passa agora dar cartas na diplomacia [dropcap style=’circle’]C[/dropcap]han Meng Kam é o novo cônsul honorário da Guiné-Bissau em Macau. A nomeação foi oficializada na segunda-feira com a entrega do certificado de funções pelo comissário do Ministério dos Negócios Estrageiros da China em Macau, Ye Dabo. Segundo o jornal Ou Mun, no encontro, Chan Meng Kam afirmou que a Guiné-Bissau é um importante país de língua portuguesa, dotado de valiosos recursos naturais, destacando ainda a relação de amizade entre Macau e o país africano. Dado que a China apoia a diversificação adequada da economia de Macau e a RAEM valoriza a cooperação com os países lusófonos, Chan Meng Kam prometeu desempenhar activamente o papel de ponte durante o exercício das novas funções. Um pé em Pequim O comissário do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China na RAEM realçou, por seu turno, o desenvolvimento das relações entre Pequim e Bissau nos últimos anos, apontando que a cooperação em domínios como saúde ou agricultura tem gerado bons resultados. Neste âmbito, Ye Dabo afirmou esperar que Chan Meng Kam se empenhe em impulsionar a cooperação entre Macau e a Guiné-Bissau nas áreas económica, comercial ou cultural, aproveitando as vantagens da RAEM como plataforma para potenciar as relações entre a China e os países de língua portuguesa. Do universo dos países de língua oficial portuguesa existem apenas três com consulados-gerais estabelecidos na RAEM: Portugal, Angola e Moçambique. Segundo dados oficiais, no final de 2016, outros dois países lusófonos tinham nomeado cônsules honorários na RAEM: Cabo Verde e Guiné-Bissau. A função de cônsul honorário da Guiné-Bissau em Macau era, até agora, desempenhada pelo empresário local John Lo Seng Chung.
Rui Flores VozesDa impunidade política na Guiné-Bissau [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] nova crise política na Guiné-Bissau faz levantar dúvidas, uma vez mais, sobre a adequação do quadro jurídico-constitucional em vigor no país com a realidade sócio-política guineense. Esta é uma questão que tem sido levantada em tempos de confrontação política ou na sequência de mais um golpe de Estado. Desta vez, a crise colocou o Presidente da República eleito pelo PAIGC, José Mário Vaz, contra o líder do PAIGC e primeiro-ministro demitido, Domingos Simões Pereira, e a nomeação de um governo de iniciativa presidencial, chefiado por Baciro Djá, ex-ministro da Presidência do Conselho de Ministros que se incompatibilizou com o antigo secretário-executivo da CPLP. Tudo por alegada corrupção e incompetência do executivo. As crises político-securitárias têm-se repetido na Guiné-Bissau como em poucos outros países da África Ocidental. A história regista o facto de que, desde as primeiras eleições multipartidárias em 1994, não houve nenhuma legislatura que chegasse ao fim nem um Presidente da República que completasse o seu mandato. As razões para que isso tenha acontecido e continue a acontecer, 31 anos depois do primeiro acto eleitoral e 42 anos após a independência, são várias e têm sido apontadas nos últimos anos pelos mais diversos comentadores. As consequências directas são os golpes de Estado e os assassínios, mas o analfabetismo, o tribalismo, a incapacidade de diálogo entre os vários protagonistas políticos são alguns dos problemas que os diversos analistas têm identificado como causas estruturantes da instabilidade permanente que tem marcado a Guiné-Bissau pós-colonial. Uma das principais questões que enquadram o problema da recorrente instabilidade da Guiné-Bissau foi salientada pelo ex-representante especial do Secretário-Geral das Nações Unidas no país, José Ramos-Horta, quando há dias, nas páginas do Público, apontou o dedo a um dos mais recentes legados lusos, a influência jurídico-constitucional: “A crise resulta de uma Constituição que foi cozinhada em Portugal, sem qualquer consideração à realidade social da Guiné-Bissau, mas encomendada e absorvida na Guiné-Bissau, logo a seguir ao derrube do Presidente Amílcar Cabral. A partir desse primeiro golpe nunca mais conheceu paz.” Antevendo as dificuldades que poderiam existir entre o poder presidencial e o executivo, Ramos-Horta, diz o próprio, procurou deixar um conselho ao Presidente Vaz, quando deixou a chefia da missão da ONU na Guiné-Bissau: “Esse modelo Constitucional não desculpa tudo. A crise tem a sua génese no Palácio Presidencial, num Presidente que, mau grado as prerrogativas ou limitações dos seus poderes, devia acima de tudo ser o mediador, homem de diálogo, fazedor de consensos. Foi o que aconselhei o Sr. Presidente José Mário Vaz a ser: o homem do diálogo, o apaziguador. Obviamente ele não ouviu. Ou ouviu mas sucumbiu a tentação e resvalou pelo mesmo trilho muito perigoso por onde passou outros Presidentes de triste memória.”[quote_box_right]O reconhecimento da diferença e das especificidades sócio-culturais de países como a Guiné-Bissau deve ser o primeiro passo para se encontrar uma estrutura jurídico-política que permita a estabilidade, elemento essencial do desenvolvimento.[/quote_box_right] Político experiente, Ramos-Horta sabe do que fala quando refere que o modelo jurídico-constitucional guineense não se adapta à cultura sócio-política do país. Afinal, a Guiné-Bissau, como Timor-Leste mais de duas décadas depois, adoptou um sistema político inspirado no modelo semipresidencialista português. Tanto num caso como no outro, assessores portugueses estiveram por detrás das propostas que haveriam de ser consagradas em lei. A lógica do Presidente-mediador, apagador de fogos, proponente de compromissos é uma marca do sistema presidencialista. Uma marca que tem estado ausente da Guiné-Bissau de Vaz, como esteve ausente em Timor-Leste, em 2006, quatro anos depois da independência, quando Xanana Gusmão era o Presidente e o país, dividido entre dois grupos étnicos, esteve à beira de uma guerra civil. A questão constitucional está há muito identificada. Foi um dos problemas elencados, por exemplo, durante as duas dezenas de conferências organizadas pela Assembleia Nacional Popular, com o apoio do então Presidente da República, Malam Bacai Sanhá, “Caminho para a Consolidação da Paz e Desenvolvimento”, que procurou fazer o diagnóstico das principais causas de conflitos na Guiné-Bissau e avançou propostas para a sua resolução. Nesse documento, os que sugeriam a introdução do presidencialismo – o modelo em vigor nos vizinhos continentais da Guiné-Bissau, quer anglófilos quer francófonos – faziam-no “como forma de evitar conflitos de competências entre os titulares dos órgãos de soberania”. A principal fonte de problemas identificada, no entanto, foi outra: uma certa cultura de impunidade, que propiciou assassínios políticos, a descredibilização do Estado, o tráfico de droga. O reconhecimento da diferença e das especificidades sócio-culturais de países como a Guiné-Bissau deve ser o primeiro passo para se encontrar uma estrutura jurídico-política que permita a estabilidade, elemento essencial do desenvolvimento. No que ao impasse constitucional diz respeito, muitos não querem ver o problema. Parte da elite guineense foi formada em Portugal e não quer sequer abrir a porta à discussão, aparentando ser imune às lições da história, que nos mostram que, também no processo de consolidação democrática de Portugal, a tensão entre o poder presidencial e o poder executivo foi motivo de instabilidade. Outros aproveitam o actual quadro para dar razão aos que proclamam que existe uma espécie de poder à africana que tem alergia ao Estado de Direito e aos direitos das minorias, em que o Presidente usa o seu poder absolutamente numa lógica de total sobreposição da pessoa do Presidente ao Estado, na qual a concepção republicana do Estado está ausente. Ao optar por isolar Simões Pereira, um político reputado – que congregou o apoio da chamada “comunidade internacional”, de quem recebeu a promessa, há apenas cinco meses, da doação de mil milhões de euros de ajuda ao desenvolvimento – vai no caminho de perpetuar a instabilidade. As pequenas conquistas do último ano, tão celebradas pelos guineenses quer na sua terra quer na diáspora, vão ser todas postas em causa. Afinal, foi só agora, nos últimos meses, que Bissau, pela primeira vez em muitos, muitos anos, passou a ter electricidade 24 horas por dia. Vaz está no lado errado da história.