Carlos Morais José EditorialAs folhas do Outono acumular-se-ão nas mesmas portas [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s astronómicos lucros do Jogo criaram em Macau uma espiral estranha. Não se pode dizer que tenha existido um sentido, uma direcção efectiva e racional para o crescimento. Ao invés assistimos ao desenrolar de algo que anda às voltas, num estranho e lento movimento ascendente, satisfazendo aqui, melhorando acolá, descuidando muito, piorando amiúde. Esta espiral, impulsionada pela avalanche de patacas, levou-nos de onde estávamos em 2003 até este ponto onde estamos em 2015. De algum modo, trata-se de uma espiral algo suicidária, no seu aparente distanciamento da mais óbvia racionalidade — o que deixa para trás, o que deixa cair, o que não acontece, mais do que qualquer outra coisa, revelam-se, ano após ano, fardos mais difíceis de carregar, de explicar, por quem detém o poder. Poder-se-ia julgar que a formal espiralada derivaria da “falta de experiência”, da “complexidade da região”, do “carácter único de Macau”, do “crescimento desenfreado”, etc.. Contudo, provavelmente, o percurso escolhido foi o único encontrado, num constante tactear da melhor solução, para uma divisão pacífica da riqueza. Deste ponto de vista, Macau parece ser um sucesso. Ao contrário de Hong Kong, a população permanece pacífica e sem agenda. A grande maioria das pessoas tem-se contentado com o cheque anual e outros benefícios efémeros que o Governo tem concebido. Isto enquanto se assistiu à degradação da Saúde, dos Transportes, da Habitação, entre outros sérios problemas que afectam o quotidiano dos residentes, independentemente da sua etnia. Macau tornou-se uma cidade repleta de gente, que se desloca em torvelinhos, remoinhos de turistas. A falta de intervenção estatal, o laissez faire, transformou o centro da cidade, património da UNESCO, num mercado de segunda linha, ao invés de espelhar a identidade e a cultura da cidade. Também do ponto de vista ambiental, tudo se transformou sem obedecer a um plano racional, numa espiral galopante de construção/especulação. O que Macau é hoje, ninguém previu, há 10 anos ninguém o sabia, como não sabemos o que daqui a 10 anos irá ser. É estranha esta espiral. Impossível de prever, impenetrável à adivinhação. As coisas giram e voltam a girar. À volta de um centro, é certo, mas imperscrutáveis. O vento poderá soprar por ora mais fraco. Por enquanto, as folhas do Outono acumular-se-ão nas mesmas portas.
Carlos Morais José EditorialÉdito | Carta Aberta [dropcap syle=’circle]E[/dropcap]xcelentíssimo Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, Escrevo-lhe não para o maçar com obras públicas, terrenos, metro ligeiro mas sobre um assunto bem mais corriqueiro e, aparentemente, de fácil resolução. Estou certo de que se Vossa Excelência não dispusesse de transporte privado, certamente que nem seria necessário chamar-lhe a atenção para este problema que aflige residentes e turistas nesta bela Cidade do Nome de Deus. Trata-se (não abra a boca de espanto) da questão dos táxis. Pois é: o problema que encontrou quando tomou posse e parecia bem encaminhado nos meses que seguiram. Parecia mas não estava: a verdade é que voltámos à anarquia do costume. De novo os taxistas recusam clientes, aliciam outros (turistas) com preços exorbitantes e desvarios vários que, normalmente, aconteciam nas cidades mais deprimidas dos países muito pouco emergentes. Aconteciam porque acontecem cada vez menos. A não ser, é claro, em Macau. Já não lhe vou pregar sobre os efeitos perniciosos para a imagem, para o desconforto que causa ao cidadão, para a vergonha que é apresentar uma cidade assim. Queria, pelo contrário, enaltecer o trabalho de quem fez quintuplicar o número de multas passadas a taxistas prevaricadores. Pois bem: não chega. Ao que parece, é para o lado em que eles conduzem melhor. E o desbragamento continua. Senhor Secretário, já lá vai mais de meio ano desde aquele saudoso dia 19 de Dezembro em que ainda não tinha que aturar os dossiês que se acumulam na sua mesa. São projectos complexos, complicados, intrincados como quase nenhuns. Mas se não consegue pôr os carroceiros da cidade na ordem, como podemos esperar que se desenvencilhe das suas outras hercúleas tarefas, em que tem de confrontar interesses, à partida, bem mais poderosos? O poder dos taxistas não há-de ser assim tanto… Ou será que quem de facto manda menos… é o Governo? Não esqueça pois: está na altura de lhes mostrar um cartão vermelho. O que isso significa não sei, pois não passo deste seu humilde escriba e admirador, com os melhores cumprimentos, etc., etc… PS: Só para chatear (que isto não pode ser só delicadezas): aqui entre nós, no tempo dos portugueses os táxis funcionavam melhor… ai quem diria… que vergonha…