Sofia Margarida Mota PerfilPerfil | Ana Cristina Vilas, funcionária pública e responsável pelo “Dress a Girl Around the World Macau” [dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]eio para Macau com os pais, ainda adolescente. “Estou em Macau há uma eternidade. Vim em 1981 com os meus pais na altura em que começaram a chegar muitas pessoas, e fui ficando”, recorda Ana Cristina Vilas. Apesar de ter feito vida no território, esta não é a casa de Ana Cristina Vilas. Não é que tenha um lugar dela ou aquilo a que se possa chamar de lar. Para a funcionária pública, “hoje em dia quase todos somos cidadãos do mundo”. Nasceu em Moçambique, foi para Viseu onde frequentou um colégio interno e depois mudou para o local onde até hoje passa as suas férias, em Cascais. Se a vinda para o território era para ser temporária, um acidente alterou-lhe os planos. “Acabei por ficar cá, casei com uma pessoa da terra e tive um filho. Macau não é a minha terra, adoptei-a”, diz. “Gosto de Macau mas não me sinto macaense, sou uma estrangeira que fala a língua. Tenho amigos de todas as culturas e não me sinto de lado nenhum”, aponta. Trabalha na Função Pública, mas o que vai movendo Ana Cristina Vilas é outra coisa: a ajuda a quem mais precisa ocupa um lugar central neste momento da sua vida. É a responsável pelo projecto “Dress a Girl Around the World” em Macau desde Abril. “Vi uma notícia de uma senhora já idosa que fazia um vestido por dia para crianças necessitadas em África e achei aquilo fantástico”, conta. O entusiasmo com que via esta pessoa a fazer este tipo de trabalho foi contagioso e, pouco tempo depois, encontrou o projecto internacional “Dress Girl Around the world”, que se dedica a confeccionar vestidos para crianças de países subdesenvolvidos e que vivem numa situação de pobreza. A curiosidade aliou-se ao gosto que já tinha por fazer artesanato. “O bichinho começou a funcionar e sempre gostei de fazer coisas com as mãos. Costumo participar na Lusofonia com as minhas coisas, com o apoio da Casa de Portugal. Frequentei também formação em joalharia”, refere. Da tomada de conhecimento do projecto a envolver-se na produção de vestidos para as crianças que mais precisam foi um trajecto rápido. “Numas férias em Portugal, fui a uma loja de Cascais onde nasceu o projecto e comecei a acompanhar o que faziam.” Com a ajuda de amigas trouxe a ideia para o território. O primeiro evento, em Macau, foi a 4 de Abril deste ano. “Já temos cerca de 150 vestidos prontos, 24 calções e umas dezenas de cuecas, porque cada vestido é acompanhado com elas.” De Portugal chegam as etiquetas e os tecidos são ofertas de pessoas que querem dar uma ajuda. As peças de roupa são produzidas, na sua maioria, durante os eventos. “As pessoas vão, temos tudo: as linhas e os tecidos cortados. É só lá chegar e coser, não é preciso ter grandes conhecimentos de costura”, explica Ana Cristina Vilas. O trabalho conta com a ajuda de voluntárias que são normalmente entre dez a 15, e os eventos são marcados pela descontracção. “Há muito boa disposição e fazemos companhia umas às outras. É divertido e contam-se umas anedotas e experiências pessoais.” A próxima iniciativa, ainda sem data marcada, promete mostrar um pouco do que tem sido feito. Entretanto, o destino da roupa já confeccionada ainda não é certo, mas já existe uma área definida. “Temos de os distribuir e quero fazê-lo na Ásia, porque está toda a gente a trabalhar para África”, adianta Ana Cristina Vilas. “Temos muita pobreza nas Filipinas, no Camboja e no Vietname”, exemplifica. Chegar a estas comunidades parece não ser tarefa fácil pelo que está, neste momento, a procurar ajuda junto das missões religiosas. “Disseram-me que através da igreja era mais fácil chegar a estas zonas do globo. A primeira entrega quero ser eu própria a fazê-la. É um orgulho e cada vestido que corto enche-me a alma”, conta emocionada. O trabalho na costura não se limita aos eventos do projecto “Dress a Girl Around the World”. Ana Cristina Vilas sai das Finanças e volta para casa onde tem um atelier preparado e põe as mãos na costura.
Sofia Margarida Mota SociedadeMacau junta-se a projecto destinado a crianças carenciadas [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] “Dress a Girl Around the World” é a campanha que pretende vestir e proteger crianças carenciadas e mais vulneráveis a abusos. A iniciativa integra o programa da organização não-governamental Hope 4 Women e começa a dar os primeiros passos em Macau, pelas mãos de Ana Cristina Vilas. “Passa pelo território porque sou uma curiosa e tento fazer coisas à mão, como é o caso da costura. Como conheço este projecto que, no ano passado, também teve início em Portugal, resolvi avançar em Macau”, explicou a responsável ao HM. A ideia é a realização de peças de vestuário para meninas a partir do ano de idade e até aos 14. Desta vez o objectivo não é, “como o habitual”, levar as peças feitas para África, mas sim fazer com que cheguem às populações mais carenciadas do continente asiático. A questão da entrega na Ásia está ligada à própria situação geográfica do território e, “se calhar, África é o alvo de grande parte das organizações ao nível mundial por ser um continente com mais problemas conhecidos”. No entanto, a Ásia também precisa de ajuda: “Tanto o Camboja, como as Filipinas são identificados como países carenciados, de risco para os menores, e são locais onde já foram feitas campanhas da ‘Dress a Girl Around the World’”. Meninas salvaguardadas Cada vestido é acompanhado de uma peça de roupa interior etiquetada com a marca da organização. A ideia é “marcar estas crianças como estando protegidas e prevenir crimes praticados contra menores, que vão desde a violação ao tráfico humano”. A equipa de Macau ainda está no início, mas já se começa a organizar. O espaço para a confecção das peças será cedido pela Casa de Portugal, onde Ana Cristina Vilas costuma fazer workshops. A responsável está neste momento a angariar tecidos para fazer kits e Abril é o mês pensado para o primeiro evento de costura solidária. “Numa primeira fase, vou contar com as pessoas que já conheço, que têm as suas máquinas de costura, e o meu papel será o de acompanhamento”, diz Ana Cristina Vilas. Os kits permitem facilitar a tarefa dos interessados e são compostos por tecidos já cortados em moldes e distribuídos segundo idades. “Os interessados só têm de aparecer na iniciativa. É uma questão de lá chegarem, coserem e porem a fita que identifica a origem da peça.” O destino dos vestidos ainda está longe no tempo e muito possivelmente só “lá para o final do ano é que as peças chegarão às crianças”.