Vasco Becker-Weinberg, sobre Mar do Sul da China | “Não é possível satisfazer todas as reivindicações”

[dropcap style=’circle’] M [/dropcap] acau tem uma oportunidade única para se destacar na área de gestão marítima. A opinião é do especialista em Direito do Mar, Vasco Becker-Weinberg, que está no território para um seminário promovido pela Direcção de Serviços para os Assuntos de Justiça. Ao HM, o académico falou ainda do Mar do Sul da China e da cooperação entre estados e deixou o alerta para o combate à pesca ilegal, muitas vezes associada à exploração e tráfico de seres humanos.

A área marítima de Macau é agora de 85 quilómetros quadrados. Este aumento de jurisdição sobre o mar traz que tipos de desafios ao território?

Antes de avançar é preciso perceber o que de facto se está a tratar. Há um processo muito interessante relativamente a Macau em particular: a área marítima que está sob a gestão da RAEM é uma área que integra – se quisermos fazer o paralelismo com a situação portuguesa em termos de território – aquilo que poderá ser o domínio público marítimo que para já ainda não existe aqui. O domínio público marítimo – entendido conforme o caso de Portugal, por exemplo – é da República Popular da China e o Governo da RAEM exerce, mediante delegação de poderes concedidos, o direito de gestão de uma parte com apenas 85 quilómetros quadrados. O que é interessante é nós colocarmos as coisas na sua verdadeira perspectiva e na sua escala. Macau tendo um território com a dimensão que tem, passa a ter uma área onde ponde intervir , onde pode exercer determinados direitos de gestão, superior à do seu território terrestres. Nesta medida, é desde logo uma vantagem muito competitiva no que respeita à diversificação da economia da RAEM. Os desafios que se colocam são tantos quanto as oportunidades. Julgo que sempre que um estado costeiro tem a capacidade de desenvolver actividades económicas no mar, acaba não só por diversificar estas actividades, mas também vê abrirem-se perante si um conjunto de outras oportunidades.

O que é que é esperado que Macau faça nesse sentido?

Se pensarmos em termos de desafios de sustentabilidade do próprio território, a densidade populacional a e consequente e crescente urbanização de Macau, a possibilidade de termos aqui uma área de expansão onde podemos desenvolver actividades na área das energias renováveis offshore, é uma ideia muito interessante. Associado a isto ainda há um conjunto de iniciativas que podem ser incrementadas como é, por exemplo, a náutica de recreio. É uma actividade económica muito importante para a economia do mar de qualquer território e que aqui também tem uma boa hipótese de desenvolvimento nestes 85 quilómetros quadrados. Também podemos ter em conta a responsabilidade na conservação e protecção do meio ambiente marinho.

Falou da questão da exploração das energias renováveis no mar. Como é que isto poderia ser feito em Macau?

O que estou a verificar com as sessões que estamos a desenvolver no âmbito do seminário, tem sido um grande interesse para discutir estas matérias, não só em tentar perceber o que existe como também no que é possível ser feito. Se olharmos para as energias renováveis em determinados países, sobretudo no norte da Europa mas também com uma crescente presença no sul, verificamos que estamos a falar de energia eólica e energia das ondas e não estamos a falar de matérias que ocupem muito espaço para serem eficientes. Em Macau há uma possibilidade única. Aqui há a realidade da China já com tecnologia na área de construção deste tipo de infra-estruturas que pode ser aproveitada. É fundamental que se saiba que quando se pensa em energias renováveis estamos a falar de estruturas que têm que ser colocadas no mar. A locação de plataformas obriga a que a proposta de lei trate das matéria ligadas ao ordenamento e à gestão do espaço marítimo. Aqui tem que haver uma análise muito cuidada e um debate sério e rigoroso. Se olharmos para o processo legislativo em Macau, desde que começou para a fase em que está agora, podemos dizer que é muito promissor. Estamos numa fase pós consulta pública em que há uma proposta de lei que como sempre é susceptível de melhoramento e aperfeiçoamento mas o que é fundamental é que sejam feitas opções legislativas que permitam um correcto desenvolvimento sustentável desta área marítima.

E o que é que é necessário para o efeito?

Este desenvolvimento sustentável tem que ter três componentes: a ambiental, a social e a económica. Temos que ser capazes de desenvolver actividades no mar que são ambientalmente sustentáveis, mas estas actividades têm que ter em conta a sua integração face ao contexto social e, um aproveitamento económico em que exista o equilíbrio entre diferentes actividades no mar. A grande diferença da economia do mar é precisamente a capacidade de termos no mesmo volume ou área actividades complementares ou concorrentes, coisa que em terra não pode acontecer devido às características do próprio território. No caso das energias renováveis penso que é um dos aspectos a ser considerado. Quando estava a  pensar no que é que a RAEM pode fazer em 85 quilómetros quadrados que, face ao território terrestres é muito, mas que em termos de dimensão é o que é, temos ainda de perceber que esta área marítima se insere numa maior, a da RPC. É muito importante que as opções legislativas e administrativas nesta matéria tenham em conta esta interligação e o que já existe na legislação chinesa há muitos anos. Esta complementaridade e esta percepção de que o espaço marítimo é tridimensional e que há inter-cooperatividade, ou seja o que acontecer do lado chinês, afectará sempre este e vice versa, é um assunto regional e global. Hoje sabemos que tudo o que acontece no ecossistema marinho está interligado. Por outro lado, no caso da RAEM, estamos perante uma oportunidade única. A RAEM está numa situação fantástica para desenvolver um modelo que possa ser um bom estudo de caso. A RAEM com estes 85 quilómetros pode mostrar que na sua escala pode fazer um trabalho fantástico, por um lado na articulação entre mar e terra e, por outro, entre o próprio mar.

Dá formação nesta matéria na China continental. Como é que vê a gestão marítima por parte da RPC e que prioridades tem o país?

Para a China é muito importante a cooperação marítima não só na sua sub-região do Mar do Sul da China, mas na grande região Ásia-Pacífico e ainda numa perspectiva global. Podemos falar da conhecida política que está a avançar “Uma faixa, Uma Rota” e no aspecto menos conhecido da mesma, que é a rota marítima que lhe está associada, e que é uma política que tem uma ambição global. Nessa perspectiva, o que a China apresenta como modelo de desenvolvimento é o modelo da cooperação, o que é bom porque convoca todos os estados e todos o interessados numa iniciativa que está muito vocacionada para as questões ambientais. Outro aspecto em que a China tem vindo a ter um cada vez maior interesse prende-se com o desenvolvimento sustentável dos recursos naturais marinhos. A pesca neste caso é muito importante. É bom não esquecer que o acesso à proteína de peixe é fundamental para a própria segurança alimentar, não só da China mas de toda esta região. Outro aspecto em que a China está a investir tem a ver com a protecção dos direitos humanos no mar, nomeadamente no combate à pirataria mas também a outros fenómenos que preocupam todos os estados.

Estamos a falar de tráfico humano?

Estamos a falar da associação do trabalho forçado e do tráfico de seres humanos com a pesca ilegal. Isto acontece muito no sudeste asiático. Temos provas disso. Não há nenhuma região no mundo que não se veja perante esta catástrofe associada ao trabalho forçado e nesta região é mais evidente. Tem também sido feito um grande esforço em que a China participa. Temos a tendência em pensar que a RPC tem uma visão tímida face às questões ligadas ao mar. Esta visão é totalmente errada. Neste momento há um esforço regional em pôr esta questão em cima da mesa. É uma questão incómoda porque não podemos tratar deste tema ignorando a responsabilidade do consumidor. Hoje em dia esta matéria divide-se em dois temas muito difíceis: o da pesca ilegal, e o do trabalho forçado e tráfico de seres humanos. A pesca ilegal, enquanto fenómeno por si só, é de uma enorme complexidade que se prende com a forma como os estados exercem a sua jurisdição no mar. Há Estados de bandeira que criam um ambiente permissivo para que as suas embarcações não respeitem as regras internacionais aplicadas à pesca. Os Estados costeiros têm uma capacidade muito limitada de intervenção, por exemplo no alto mar onde muita pesca ilegal acontece. Os Estados costeiros que não intervém com medidas de fiscalização da pesca na sua Zona Económica Exclusiva (ZEE) também criam um ambiente permissivo para que aí se desenvolva a pesca ilegal. A par desta realidade há depois a dificuldade que os Estados bandeira têm de controlar todos os navios que levam a sua bandeira e também não é possível exigir aos estados costeiros que consigam ter uma intervenção quando um navio está na sua ZEE a pescar ilegalmente. Isto acontece, ou por falta de recursos, ou porque para atacarmos este flagelo dependemos necessariamente de cooperação e da partilha de informação entre estados. É aí que está a ser feito um grande trabalho com a participação da China. O fenómeno do tráfico de seres humanos ou do trabalho forçado a bordo dos navios que praticam a pesca ilegal é terrível quando pensamos no impacto humano em que há pessoas que estão nestes navios que muitas vezes não têm uma bandeira e portanto está numa situação que lhe permite fugir a muitos dos controlos. Estas pessoas não vão a terra durante semanas, meses e à vezes anos a fio. São exploradas no contexto dramático e de desespero absoluto em que as famílias não sabem o que lhes acontece. No sudeste asiático, muitas destas pessoas são migrantes que foram levados ou recrutados num país a pensar que iam para uma determinada actividade noutro país e onde iriam melhorar a sua vida, o que não acontece e, quando chegam ao barco são colocados numa situação impossível. Na mesma indústria mas em terra há os casos que se dirigem mais às mulheres, que são vítimas e sujeitas, nas comunidades piscatórias, a fenómenos de abuso sexual. É necessário ter medidas de cooperação regional e internacional, seja a lidar com a pesca ilegal, seja a lidar com o trabalho forçado e com este fenómeno que convoca estas duas realidades. Não sou ingénuo ao ponto de pensar que um dia se vai acabar com a pesca ilegal, por uma razão simples: é altamente proveitosa a nível económico. Quando temos um aumento da população muito superior à capacidade de renovação dos stocks estamos numa situação de grande desequilíbrio em que a população cada vez mais precisa de peixe.

 Falou da exploração abusiva de recursos do mar nomeadamente do peixe. Há a possibilidade de se esgotarem efectivamente?

Espero que não. Hoje em dia temos muitos stocks ameaçados em condições muito precárias de sustentabilidade mas estou convencido de que ainda vamos a tempo de, não diria reverter totalmente a situação, mas de promover medidas que salvaguardam a sustentabilidade destes stocks. Mais uma vez a solução passa pelos hábitos dos consumidores e na promoção a educação alimentar.

Como vê as disputas do Mar do Sul da China?

No que diz respeito ao Mar do sul da China as disputas acontecem quando dois Estados não estão de acordo acerca da delimitação de fronteiras. Isso pode acontecer porque o espaço marítimo não permite satisfazer as delimitações de dois estados porque há regras especificas para a extensão dos diferentes espaços. Outro aspecto fundamental, e que aqui tem interesse, é a titularidade sobre território terrestre, ou seja a discussão sobre a soberania terrestre a partir da qual se projectam os espaços marítimos. O conflito tem uma dimensão marítima, mas na sua génese está uma dimensão de disputa territorial, nomeadamente relativa a ilhas. No caso do Mar do Sul da China não é possível satisfazer todas as reivindicações. Há disputa em torno de formações como as ilhas e quanto à classificação dessas ilhas porque implicam a atribuição de diferentes áreas de mar. Mas há aqui um fenómeno muito importante e que é de sublinhar. No sudeste asiático a via seguida pelos Estados é a da cooperação, e temos que ser capazes de também respeitar esta realidade que é diferente da Europa. No caso da arbitragem do Mar do Sul da China que foi interposta pelas Filipinas e na qual a China não quis participar, a verdade é que hoje estamos numa fase de cooperação entre a China e as Filipinas relativamente às suas questões marítimas. Não quer dizer que não existam outras formas de resolver disputas, mas parece-me que, neste caso em concreto, estes dois estados entendem que o processo será resolvido através de negociações e que estas negociações não impedem a cooperação. É muito importante conhecer a história. No que respeita a esta disputa, já o presidente Deng Xiaoping disse que a abordagem deveria ser a de colocar os conflitos na prateleira e procurar ter uma maneira de conviver através da cooperação. Julgo que esta abordagem, que é amplamente partilhada por muitos Estados, pode ter sucesso.

15 Jun 2018

Jovens | DSEJ promove acção para estimular o exemplo

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]brem hoje as candidaturas para o “Plano de Incentivos aos Jovens – Estimular a Energia Positiva”. A iniciativa pretende atrair os jovens locais a partilharem as suas histórias de vida com os mais novos, de forma a encorajar a uma atitude positiva e à ajuda social

Promover bons cidadãos desde a juventude é a ideia de mais uma edição do “Plano de Incentivos aos Jovens – Estimular a Energia Positiva”. A acção levada a cabo pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude pretende, através da partilha de histórias pessoais de jovens entre os 19 e os 29 anos, incentivar os adolescentes às boas práticas de cidadania e encorajar na superação de obstáculos.

De acordo com o presidente da Federação da Juventude de Macau, Mok Chi Wai, entidade encarregada da execução do plano, a acção tem como objectivo “transmitir energias positivas aos jovens e encontrar histórias daqueles que enfrentam os desafios com coragem, superando os obstáculos do crescimento”. A concretização é feita com a partilha de histórias de “jovens exemplares que participam activamente nos serviços sociais e contribuem para o bem-estar da sociedade”.

A ideia é dar o exemplo às gerações mais novas de como se consegue ultrapassar os muitos obstáculos que aparecem durante o crescimento e ter um papel de relevo na construção social. “Os valores são aqui transmitidos de boca em boca para que, desta forma, seja divulgada a força de influenciar novas gerações”, rematou o responsável na conferência de imprensa de ontem, destinada à apresentação do programa.

Candidaturas abertas

Os jovens locais que pretendam integrar o “Plano de Incentivos” podem fazer a sua candidatura a partir de hoje e até ao dia 25. No processo contam a sua história e têm de ser recomendados por uma associação local sem fins lucrativos ou por um residente com mais de 21 anos. Para garantir a veracidade, a selecção dos dez eleitos é feita através de entrevistas, a que se segue uma avaliação feita por um júri. Uma vez passada esta fase, são submetidos à votação da população.

Os premiados recebem um montante de três mil patacas e comprometem-se a cooperar com a DSEJ para a divulgação, através de vários meios, da sua história.

As últimas edições da iniciativa aconteceram em 2012 e 2015. Os 20 contemplados, resultado das acções realizadas, têm estado envolvidos em actividades com as escolas locais em que transmitem as “suas histórias inspiradoras”.

O chefe de divisão de formação e apoio ao associativismo juvenil da DSEJ, Chan Iok Wai, explicou que os parâmetros decisores são “o carácter emocionante do conteúdo, a influência social, a inspiração em relação aos valores da juventude e, este ano, foi acrescentado o entusiasmo na preocupação com a sociedade”.

A DSEJ promove, com cada edição, um conjunto de exposições itinerantes que passam pelos vários estabelecimentos de ensino do território em que são expostas as histórias vencedoras. “Já foi também feita uma reportagem para a televisão”, afirmou o responsável.

Em 2012, foram recebidas 90 candidaturas, sendo que o número total de participantes qualificados para entrar na fase de entrevista foi de 80. Na avaliação do júri foram escolhidas 21 histórias para passar à fase da votação dos cidadãos.

Em 2014, o número total dos jovens inscritos foi de 41, tendo sido eleitas 20 histórias dos candidatos para passarem à fase da votação pública.

O número de candidaturas é ilimitado e todos os que considerem que têm uma história a contar são convidados a participar.

Estudos | Programa sobre Direito do Mar em Macau

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Universidade de São José (USJ) e o Instituto de Estudos Europeus de Macau (IEEM) organizam, no início do próximo mês, um programa de formação de curta duração sobre Direito do Mar. A acção decorre ao longo de 18 horas, a 1 e 3 de Setembro, e custa aos participantes 2800 patacas.

O programa do curso foi concebido por Francisco Leandro, da Faculdade de Humanidades da USJ. Quando aos responsáveis pela formação, destaque para Vasco Becker-Weinberg, que presta assessoria jurídica à secretaria de Estado do Mar, em Portugal. Também Paulo Canelas de Castro, da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, será um dos professores do curso. O docente tem vários livros e artigos publicados sobre questões relacionados com direito marítimo.

Em nota de imprensa, a organização explica que o programa cobre vários tópicos diferentes, a começar pela contextualização histórica sobre a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Vão ainda ser focados assuntos como a preservação do ambiente marítimo, a economia ligada ao mar no contexto jurídico regional e internacional, a liberdade de navegação, a criminalidade e os direitos humanos no mar.

Os participantes que concluírem o programa poderão ainda participar num seminário sobre o planeamento e gestão do mar, em que vão ser abordadas as oportunidades para Macau. José Luís Sales Marques, presidente do IEEM, e Jens-Erik Olsen, fundador da empresa de consultadoria Eight Ships, são os oradores da palestra que encerra a formação.

Estacionamento | Mais lugares na Avenida do Cais de Pac on

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá pronta a obra de nivelamento no troço junto à Avenida do Cais de Pac On, tendo sido acrescentados 157 lugares de estacionamento. Os 63 espaços para veículos ligeiros estão equipados com parquímetros de duas horas; já os 94 lugares reservados a veículos pesados podem estacionar durante cinco horas. A Direcção dos Serviço para os Assuntos de Tráfego acredita que as novas áreas vão aliviar a necessidade de estacionamento do sector dos veículos pesados e promete “continuar a procurar, juntamente com os serviços competentes, espaço para disponibilizar equipamentos de apoio ao trânsito”.

8 Ago 2017