Conímbriga | Enterramentos infantis e muralha pré-romana descobertos

Sondagens que seriam só de suporte a um projecto de conservação da muralha de Conímbriga acabaram por revelar algumas surpresas, como parte de um muro que se supunha existir antes da ocupação romana e enterramentos infantis, uma raridade.

As quatro escavações junto à muralha romana que delimita Conímbriga, no concelho de Condeixa-a-Nova, avançaram no início de Março, cumprindo um desígnio muito específico – diagnóstico de locais onde se pretendia executar poços de drenagem numa empreitada de estabilização daquele património.

Num dos locais, os arqueólogos encontraram uma parte de uma muralha da Idade do Ferro, prévia à ocupação romana de Conímbriga, confirmando aquilo que já se supunha existir, mas que nunca tinha sido encontrado, notou Virgílio Correia, arqueólogo do Museu de Conímbriga que dirigiu as escavações, juntamente com o director do espaço, Vítor Dias.

O director do Museu de Conímbriga olha para as escavações e comenta: “Isto está melhor do que a encomenda”. Mas para o arqueólogo a “grande surpresa” centra-se nos seis enterramentos infantis encontrados, da altura da ocupação romana, “muito raros em todo o Império”. “Haverá duas ou três dezenas” de enterramentos infantis identificados em toda a zona de influência do Império Romano, sublinhou.

Em Conímbriga, foram encontrados restos mortais de quatro bebés num dos locais de sondagens e outros dois noutro local de escavação.

“Os enterramentos infantis são sempre uma surpresa, porque a prática de enterramentos infantis, para os romanos, é uma coisa muito complexa. Do ponto de vista jurídico, uma criança não era uma pessoa e, então, há todo o tipo de práticas estranhas. Havia muitas que eram deitadas para um monte de entulho. Não estava nada à espera”, contextualizou Virgílio Correia.

As crianças deverão ter entre semanas a menos de um ano de idade e, face ao local onde foram encontradas, acredita-se que poderão ter sido enterradas quando aquela zona era uma espécie de estaleiro de obra, quando se avançava para a construção da muralha romana junto ao anfiteatro, que seria demolido.

“Relativamente aos poucos enterramentos infantis que se conhecem no mundo romano, conhecem-se em situações estranhas, como crianças enterradas nos jardins de casas de Pompeia, ou entre entulhos de material que se estragava de um centro de produção de cerâmicas no sul de França”, avançou Virgílio Correia.

No caso de Conímbriga, as crianças não estavam misturadas com entulho, mas terão sido enterradas com “poucos cuidados”.

Para exposição

Outra descoberta que entusiasmou a equipa é um pequeno tinteiro do tempo da ocupação romana que serviria para molhar a pena com que se escrevia.

“É uma coisa excepcional, que aqui parece que se perde algures e vai dar ao entulho do anfiteatro”, constatou Virgílio Correia, antevendo que a peça possa acabar exposta no museu.

As sondagens foram feitas junto à muralha romana, na zona que faria fronteira com o anfiteatro, que foi demolido para dar lugar àquela estrutura defensiva.

Nas quatro escavações, encontram-se vestígios do século III ou IV antes de Cristo até à época medieval (séculos IX ou X depois de Cristo). Até o carvão e sementes carbonizadas encontradas serão posteriormente estudados.

2 Mai 2023