TEDx Senado Square | Palestras para inspirar Macau

No dia 3 de Março realiza-se o TEDx Senado Square com o tema “Ondulação”. O cartaz do evento agrega um conjunto de nove palestras divididas por temas tão variados como a arquitectura, filosofia, música electrónica e a tecnologia

 

[dropcap]A[/dropcap]ideia do TEDx é espalhar ideias pelos quatro cantos do mundo. É ao que se propõe a organização do TEDx Senado Square, que se realiza no próximo dia 3 de Março, a partir das 10h, no Teatro D. Pedro V. O tema do evento é “Ondulação”, e segundo a curadora, Venus Loi, encaixa no conceito de reverberação de ideias.

“Quando pensámos em Ondulação tentámos encontrar oradores que possam ter impacto na sociedade com pequenas acções”, conta. O objectivo é inspirar o público a dar pequenos passos, todos os dias, de forma a ter impacto.

As nove palestras agendadas para o evento são subordinadas aos mais variados temas. “Queríamos ter uma grande diversidade de tópicos, não apenas focar-nos na arte e inovação”, revela Venus Loi.

Lin Hsiangchun promete guiar a audiência numa viagem pelos bairros que compõem o habitat natural das várias comunidades de Macau, assim como por locais na natureza, sempre pela perspectiva de uma criança. Com mestrado em língua e literatura chinesa, a colunista e mãe a tempo inteiro, é uma das palestrantes do dia.

Num tom totalmente diferente, Kwong Chun Man sobe ao palco do Teatro D. Pedro V com o intuito de espicaçar o intelecto do público. A tirar doutoramento na prestigiada Universidade de Oxford, a sua palestra tem como foco a paixão que devota à filosofia. Autor de dois livros, um deles premiado com o Hong Kong Golden Book Awards 2017, Chun Man é um dos fundadores do grupo “Corrup the Youth”. Além disso, Kwong Chun Man é um comunicador nato, como atesta a sua participação em 48 episódios do programa de televisão “Philosophy Night” emitido pela RTHK.

Para a curadora do evento, esta é uma das palestras que expectativas levanta. “Ele fala da importância da filosofia nos dias de hoje com sentido de humor. Cativa os mais jovens e inspira-os para uma área essencial da educação de”, explica.

Sonhos eléctricos

Numa perspectiva completamente diferente, Tamara Solski junta-se ao grupo de palestrantes do TEDx Senado Square para debater as possibilidades trazidas por abordagens integradas da cidade à luz dos princípios da sustentabilidade.

A arquitecta oferece ao ciclo de palestras um vislumbre do futuro e a paixão pela gestão dos espaços públicos, com destaque para a interconectividade das redes urbanas e das pessoas como factor-chave para a regeneração das cidades.

A conectividade é também ponto fulcral na apresentação de Anna Choi, que tem como título “Porque a conectividade é a chave para uma transformação digital de sucesso”.

O currículo desta palestrante encaixa como uma luva em algumas das ambições políticas de Macau. Com experiência em inovação digital em cidades inteligentes e na gestão de infra-estruturas, Choi trabalha como directora do sector da digitalização da Schindler, tendo a seu cargo a supervisão das estratégias de digitalização em 16 mercados do eixo da Ásia-Pacífico.

A oradora sobe ao palco do Teatro D. Pedro V com a meta de partilhar a paixão pelas transformações tecnológicas e inspirar pessoas, das mais diversas origens, a entrar na indústria tecnológica.

Por último, e noutra acepção completamente diferente, o cartaz do TEDx Senado Square apresenta “Vamos falar de música electrónica”, a cargo do músico local Burnie. O DJ e produtor musical lançou, desde 2013, quatro EPs através das editoras britânicas Slime, Tumble Audio e Downplay.

Estas são as conversas que marcam o TEDx Senado Square. Os bilhetes para o evento custam 299 patacas.

19 Fev 2019

Exposições e conferências com fim do ano em alta

[dropcap style≠‘circle’]N[/dropcap]o quarto trimestre, o número de reuniões e conferências aumentou em termos anuais, tendo atingido 86.000 participantes (+23,8 por cento), em virtude do acréscimo de 34 por cento nos participantes dos eventos com 200 ou mais indivíduos (72.000). De acordo com os dados divulgados ontem pelo Serviços de Estatísticas e Censos (DSEC), realizaram-se 244 reuniões e conferências (-8, em termos homólogos). A duração média geral de reuniões e conferências foi de 1,6 dias, permanecendo no nível do trimestre homólogo de 2016. No trimestre de referência foram realizadas 18 exposições (+2, em termos anuais), em que participaram 591.000 visitantes (+45,8 por cento). Destaca-se que 16 exposições foram organizadas por entidades não governamentais, tendo atraído 459.000 visitantes (+31,0 por cento), enquanto duas exposições foram organizadas por entidades governamentais, tendo atraído 132.000 visitantes, com um crescimento acentuado de 140,7 por cento.

De acordo com informações recolhidas junto das entidades organizadoras das 18 exposições, no quarto trimestre as receitas e despesas das exposições cifraram-se em 76,73 milhões e 114 milhões de patacas, respectivamente. Refira-se que as receitas eram provenientes, principalmente, dos “subsídios concedidos pelo Governo e por outras instituições” (75,3 por cento do total), enquanto as despesas eram efectuadas essencialmente em “serviços de produção, construção e decoração” (27,1 por cento).

Em 2017, realizaram-se um total de 1.381 reuniões, conferências, exposições e eventos de incentivo (+105, em termos anuais), que tiveram 1.901.000 participantes e visitantes (+10,4 por cento, em termos homólogos).

De acordo com as informações recolhidas junto das entidades organizadoras das 51 exposições realizadas em 2017, as receitas cifraram-se em 184 milhões de patacas,

28 Fev 2018

Ana Sofia Barros, especialista em Direito: “Não se percebe o que é que está a acontecer aos resíduos sólidos”

Ana Sofia Barros está em Macau para uma palestra, hoje, na Fundação Rui Cunha. Para a especialista em direito internacional público, atentar contra o ambiente pode constituir uma violação de direitos humanos. Cabe ao Direito gerir esta matéria

[dropcap]V[/dropcap]Vai estar hoje na Fundação Rui Cunha para falar sobre questões ligadas ao ambiente e aos direitos humanos. Em que é que que estas temáticas se ligam?
A conferência de hoje trata uma questão que considero muito importante. Trata-se do dano ambiental. Vamos abordar o modo como podemos tratar este tipo de problemática à luz do direito internacional público. Vou explicar a ideia de que há intercepção entre o direito internacional e o regime internacional de direitos humanos, e que podemos encontrar soluções que asseguram uma protecção eficaz de indivíduos de comunidades perante o dano ambiental. Outro aspecto importante é tentar associar esta matéria a casos com que as pessoas se identifiquem. Por exemplo, quando há exposição de indivíduos a gases tóxicos emitidos por fábricas ou expostos às consequências das alterações climáticas.

É a esse tipo de indústrias que chama “indústrias perigosas”?
Sim. É um conceito que define aquelas indústrias que podem ter efeitos nefastos ao nível ambiental. Normalmente, o conceito é utilizado no sector da exploração mineira e relacionado com a utilização de produtos tóxicos. Estão um pouco por todo o lado. Se falarmos de Macau, se calhar, não se aplica tanto porque não há indústrias. Mas há casos deste tipo em todo o lado e a situação é tanto mais grave quando falamos de países que estão em níveis de desenvolvimento mais conscienciosos ambientalmente. Estamos também a falar de consequências graves e que se reflectem, por exemplo, nas descargas que levam à intoxicação de rios e das pessoas que depois utilizam estas águas para viver. Coloca-se uma questão de perigosidade a todos os tipos de indústria cujos impactos não são salvaguardados e se tornam perigosos, tanto para o ambiente, como para as pessoas.

Onde entra o direito internacional?
É importante perceber que a questão ambiental teve início nos anos 90. É relativamente recente. Quando foram ratificados os primeiros tratados de direitos humanos, com muitas excepções, não era salvaguardado um direito a um ambiente ecologicamente são. Está salvaguardado na Carta Africana de Direitos do Homem, mas é uma excepção. Na Declaração Universal de Direitos do Homem e no Pacto Internacional de Direitos Civis, Políticos e Sociais não vemos nada. A verdade é que, quando pensamos na protecção de indivíduos e de comunidades, temos de pensar ao nível de direitos. Nos anos 70 e nos anos 90 assiste-se à assinatura de convenções entre Estados que determinam a horizontalidade de obrigações. Não conferem propriamente direitos às pessoas. Quando passamos ao regime de direitos humanos começamos a questionar como é que vamos conseguir adaptá-lo aos novos problemas que não tinham sido antecipados na altura em que as convenções tinham sido celebradas. O que começa a acontecer é um processo interessante de interpretação extensiva de direitos humanos, no sentido de afirmar que direitos ambientais e associados à qualidade do ambiente são implícitos, e podem ser derivados dos direitos reconhecidos nesses tratados. Como exemplo temos o direito à vida, ao acesso a comida, a água, à saúde, à protecção da vida privada e à autodeterminação dos povos. Há uma vasta jurisprudência que se regista muito ao nível europeu, mas também africano, e mesmo quando se fala no regime interno americano de direitos do Homem. Na Ásia, o Pacto de Direitos Económicos, Sociais e Culturais tem um protocolo associado que dá acesso ao indivíduo a fazer uma reclamação contra o Estado. Neste sentido, todos os países asiáticos que tiverem ratificado o pacto e o protocolo adicional poderão ser sujeitos a acções que, no entanto, não têm um sentido vinculativo.

Num dos seus artigos menciona a protecção das vítimas de abusos industriais. Como é que é feita?
A protecção das pessoas começa sempre ao nível nacional. O conceito que tem sido desenvolvido defende que o Estado tem obrigações positivas para proteger os indivíduos em relação à actividade privada. Tem também de regulamentar a actividade privada numa óptica de prevenção, de monitorização dessa actividade e de resposta, quando as coisas correm mal. Dentro desta óptica de deveres, existe a ideia de deveres procedimentais no que toca à imposição de estudos de impacto ambiental e de consultas aos cidadãos, sempre que for necessário tomar decisões de âmbito económico que têm impacto no ambiente e na vida das pessoas. As pessoas têm de ser informadas sobre os riscos que correm. Há uma série de procedimentos que, hoje em dia, se tornaram obrigatórios quando interpretamos o direito à vida ou à saúde. Muitos Estado já têm sido condenados por não satisfazerem este tipo de requisitos.

Está a dizer que são políticas e procedimentos que estão a ter efeitos efectivos?
O Tribunal Europeu de Direitos do Homem tem um número elevado de casos e a sensação que tenho é de que estão a restringir um pouco mais o acesso. O número de casos que são declarados inadmissíveis para consideração está a crescer. Os critérios também se estão a tornar mais restritos. Por exemplo, quando queremos combater questões como as alterações climáticas, é difícil provar a causalidade entre o facto e o dano, e temos de arguir em tribunal que somos vítimas directas e que temos um dano concreto. Mas há muitos casos que são mais de dano colectivo do que propriamente de um dano que possa ser individualizado. O tribunal tem dificuldade em lidar com este tipo de questão e acaba por não considerar certas pessoas como vítimas por não se conseguir provar que há um dano concreto que foi infligido devido, por exemplo, às operações de uma fábrica que emite gazes poluentes para a atmosfera. É esta ligação que existe entre o problema ambiental e o direito humano.

O que podia ser feito?
Tem tudo que ver com interpretações que se fazem destes conceitos. Há tribunais que têm mais abertura para estes casos do que outros. Mas estamos com o primeiro caso em que se faz uma associação entre as alterações climáticas e direitos humanos, decidido em 2015 pelo Tribunal de Primeira Instância holandês. O caso está agora em fase de recurso e é o primeiro em que se juntam o regime de direitos humanos e o direito civil para se alegar que o facto de um Estado não compactuar com os limites máximos de emissão de gases poluentes também se traduz numa violação dos direitos humanos. A partir deste caso já estão a ser estudadas as hipóteses de repetir este tipo de alegações na Bélgica e tenho a certeza que vai ter efeitos mais alargados.

Num sentido oposto, temos o recente caso de afastamento do Acordo de Paris por parte dos Estados Unidos. 
Temo um Trump a fechar portas mas também temos, nos Estados Unidos, tribunais e governadores que se estão a opor à medida. Penso que a arrogância e a falta de senso desta decisão podem facilmente ser traduzidas num estímulo junto da comunidade internacional para reforçar a sua luta. Gostei muito de ver as reacções ao nível interno. As próprias indústrias, governadores e os presidentes de várias câmaras já afirmaram que vão respeitar o limite máximo de emissões de gases.

Relativamente a Macau, como vê a evolução do direito ambiental no território? 
No meu dia-a-dia não acompanho de perto a realidade de Macau. Dentro daquilo a que tenho acesso está a legislação e a Lei Básica de Macau, que prescreve que o Governo tem o dever de proteger o ambiente. Não consagra o direito ao ambiente mas consagra o dever de o proteger. Temos também a Lei de Bases do Ambiente que é muito completa e interessante. Confere os tais direitos de participação do público a que já me referi, o dever de consulta e os direitos de acesso à justiça quando se trata de causas ambientais. No entanto, o que também se regista é que esta lei de bases padece de regulamentação: os conceitos estão lá, mas não estão a ser operacionalizados na prática. Falo com pessoas à minha volta com pouca informação acerca desta matéria e nós, enquanto cidadãos, temos o direito de o ser. Não se percebe, até agora, o que é que está a acontecer aos resíduos sólidos do território e que não são tratados na central de incineração. Portanto, os resíduos sólidos podem ser tóxicos e estão a ser colocados algures, num lugar que ninguém sabe onde é. Podemos neste momento estar a ser contaminados com isso. São estes casos que dão direitos à população e estes direitos não estão a ser operacionalizados. A qualidade do ar também é uma questão importante e que é necessário fiscalizar. É preciso saber se os veículos obedecem à emissão de determinados poluentes e, ao que parece, Macau importa veículos sem este tipo de cuidados. Quando se fala em construções, apenas os edifícios com uma determinada superfície são sujeitos a estudos de impacto ambiental. Não faz sentido porque um edifício com uma área reduzida de ocupação pode ter muito impacto nas vidas das pessoas. Em suma, Macau tem uma boa lei de bases, mas falta regulamentar.

Terminou recentemente o doutoramento em que aborda a responsabilização dos Estados membros de instituições financeiras internacionais quando são violados os direitos humanos. Porquê esta temática?
Há um problema grave no direito internacional público: gerir a ideia de que há novos actores na cena internacional além dos Estados. O direito é sempre concebido como sendo entre Estados, mas a verdade é que há novos actores extremamente influentes, tais como as organizações internacionais onde estão incluídas as multinacionais. O problema das organizações internacionais, e o que é mais debatido, tem muito que ver com operações militares em que há violação de direitos humanos. O apuramento das responsabilidades neste tipo de operações é da NATO ou dos Estados que contribuem com as suas tropas. O que não é discutido é a responsabilidade associada às operações de instituições financeiras internacionais, tal como o FMI ou o Banco Mundial. Quando o FMI ou quando os Estados membros do FMI decidem os cortes à Grécia ou a Portugal, por exemplo, e as coisas correm mal, não são salvaguardados os direitos ao emprego, à educação e à saúde porque implicam sempre cortes nas despesas. A minha tese explica qual é a responsabilidade da organização em si e qual é a quota-parte de responsabilidade que cabe a cada Estado membro. Os Estados têm o dever de assegurar que as organizações não violam os direitos humanos. Os Estados não podem exercer influência ao ponto de tornarem as organizações inoperacionais mas, dentro das suas competências na organização, podem assegurar medidas que respeitem estes direitos.

6 Jun 2017

Eventos MICE agradam a gregos e troianos

[dropcap]O[/dropcap] recente investimento na realização de eventos que contribuem para o desenvolvimento da indústria das convenções e exposições (MICE, na sigla inglesa) tem-se revelado do agrado não só das organizações de grande envergadura, como das pequenas e médias empresas que confirmam um aumento de receitas aquando das iniciativas. É o que diz um comunicado de imprensa do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento (IPIM), onde é possível verificar que Macau já pode ser considerada a “primeira escolha pelos responsáveis que escolhem o território para o seu evento”.

Robin Lee, Director da Jeunesse Greater China, explica que a cidade goza de uma localização privilegiada, complementada por excelentes infra-estruturas e instalações especializadas para a realização de convenções e exposições. A empresa planeia organizar encontros internos quatro vezes por ano, cada um com cerca de 12 mil participantes e Macau surge como a primeira escolha para a realização deste tipo de eventos.

As pequenas e médias empresas também dão aval a estes eventos, visto que o aumento de visitantes contribui para o desenvolvimento da economia comunitária local, indica o IPIM, que assegura que vários proprietários de estabelecimentos comerciais situados na Rua do Cunha consideram que a realização de eventos de grande dimensão no Cotai impulsiona o número de visitantes na zona, o que contribui para um aumento de mais de 10% nas receitas diárias.

14 Jul 2016

Miguel Poiares Maduro: “Europa pode ter resposta mais forte contra terrorismo”

Em Macau para falar da União Europeia e dos Direitos Fundamentais, Miguel Poiares Maduro defende que a Europa e o mundo cometeram falhas no processo de acolhimento de refugiados. Quanto ao terrorismo, o ex-Ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional em Portugal acredita que o fecho das fronteiras não é uma solução viável

[dropcap style=’circle’]D[/dropcap]eixou a política para regressar à carreira académica. Como Ministro, o que ficou por fazer?
Fica sempre algo para fazer, mas acho que fizemos muito nas minhas áreas. Fizemos uma reforma profunda na comunicação social, mas gostava de ter feito mais com a agência Lusa. Não pudemos avançar tanto e não podemos concluir o contrato de concessão que era suposto só ser concluído no final deste ano. Tive pena de não ter tido tempo para concluir o que me parecia importante para uma reforma da Lusa. No domínio dos fundos europeus deixamos totalmente preparado o Portugal 2020. Tenho pena de não ver a aplicação em concreto desse novo quadro e de não garantir que todas as reformas que empreendemos e que estão no papel sejam realmente implementadas. Gostava de ter tido a oportunidade de ter uma maior margem financeira e que a capacidade orçamental do Estado permitisse fazer outras coisas. Os constrangimentos financeiros são muito grandes, há certo tipo de coisas que gostaríamos de fazer e que não pudemos. Direi que tive uma ou duas frustrações de coisas que tive muito próximo de conseguir fazer e não consegui.

Quais são?
Uma delas foi o regime de registo e transparência do lobbying. Parecia-me importante esse registo de interesses para Portugal. Tive também uma segunda frustração que é o regime do Televisão Digital Terrestre (TDT), que infelizmente a forma como foi criada em Portugal faz com que seja difícil formar. Tenho muito cepticismo face à realização de uma reforma que permita tornar viável a TDT com uma oferta alargada de canais como eu achava que devia acontecer. Mas devido às circunstâncias, de existir um operador com direitos contratuais e de existir um sistema jurídico também controverso, relativamente aos direitos dos operadores, vai ser muito difícil formar a TDT como ela deveria ser formada. Temos uma expressão que é “o que nasce torto tarde ou nunca se endireita”. E o regime da TDT nasceu muito torto. Mas ao atribuir direitos a certos operadores, torna muito difícil reformar, porque, para a TDT ser viável, implicava um alargamento muito grande da oferta. Quando íamos testar se era possível uma reforma séria da TDT, a PT (Portugal Telecom, o operador) mudou a sua estrutura accionista.

Falando da Agência Lusa. É importante reformar e reforçar as delegações no estrangeiro, até para a própria expansão do Português?
Há três aspectos fundamentais para o futuro da Lusa. Um tem a ver com a sua internacionalização. Aí não é simplesmente uma questão de promoção das delegações no estrangeiro, é de reorganizar o posicionamento da Lusa nesse contexto. Talvez assumir algumas prioridades em vez de outras do passado. Fazer mais parcerias estratégicas. Mas era muito importante reforçar o papel da Lusa ao nível da digitalização, com a oferta de conteúdos digitais e também como escola de Jornalismo. Claro que esta visão estratégica tem uma dificuldade: há um problema que é aquilo que pode ser importante para o futuro da Lusa está, em alguns pontos, em conflito com os interesses de alguns dos accionistas privados da [agência]. Seria importante reformar a própria estrutura accionista da agência e ter o Estado português em maioria para permitir esse desenvolvimento. Numa altura em que os meios de comunicação social dependem tanto de uma agência de notícias, esta torna-se, de facto, num bem público. E é fundamental garantir os interesses estratégicos da Lusa. Era muito importante para mim a participação do Estado, para permitir um modelo de maior independência e desgovernamentalização.

Em relação à RTP, a RTP Internacional é hoje um canal que satisfaz as necessidades da comunidade migrante em todo o mundo?
O papel de um Ministro nesta área, e foi isso que procurei fazer, é criar uma estrutura institucional na RTP que possa promover uma maior independência e o foco naquilo que devem ser as prioridades do serviço público. A minha expectativa é que possamos melhorar a qualidade da RTP e a sua cultura de funcionamento e institucional, com mais independência e conteúdos diferenciadores. E isso também tem de acontecer no serviço internacional. Deve ser uma prioridade e, no novo contrato de serviço público que celebramos com a RTP, definimos que no seu serviço internacional deve servir a comunidade portuguesa mas também promover a cultura e economia portuguesas. Estou convencido que progressivamente isso vai acontecer.

Vem a Macau falar da União Europeia , dos Direitos Fundamentais e da sua “relação complicada”. Nos últimos anos tem-se tornado uma relação assim?
A principal tensão do papel dos Direitos Fundamentais no quadro da UE é que, inicialmente, os Direitos Fundamentais surgiram na UE como forma de garantir que a própria UE não os violaria. Mas à medida que houve um alargamento, quer da área de intervenção da UE, quer na própria composição, com mais Estados Membros, surgiu a necessidade de garantir que o poder que a UE exerce seja compatível com esses Direitos Fundamentais. Daí a criação da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, que hoje em dia é vinculativa. Depois surgiu a questão de que a UE deve ter o papel de protecção dos direitos ao nível dos Estados Membros. Não podemos ter um espaço europeu social, económica e politicamente integrado sem que haja alguma coesão e um nível de protecção dos Direitos Fundamentais nos diferentes Estados. Isso já existe no processo de adesão à UE. Mas uma vez aderindo os mecanismos de protecção dos Direitos Fundamentais são frágeis. Esse é o novo grande debate e a UE tem dois grandes desafios.

Miguel Poiares Maduro_GLP_12Quais são?
À medida que os seus poderes se alargam, na política de emigração, em poderes em matéria criminal e de combate ao terrorismo, surgem questões sobre se a UE garante ou não esses direitos. Por outro lado, à medida que a diversidade dos Estados Membros aumenta, surgem questões como a que surgiu recentemente com a Polónia e com matérias que dizem respeito à liberdade de expressão e pluralismo dos média. Surgem questões relativas à necessidade da UE ter um papel na garantia de salvaguarda dos Direitos Fundamentais dos diferentes Estados Membros. Se não tivermos pluralismo de informação em todos os Estados Membros, não poderemos ter eleições para o Parlamento Europeu que sejam genuinamente democráticas. Por isso é fundamental que a UE tenha um papel mais forte na garantia dos Direitos Fundamentais. Mas ao assumir esse papel, também significa que a União assume mais poder de intrusão na soberania desses Estados, gerando tensão entre a necessidade de integrar a Europa, em termos económicos e políticos, e salvaguardar a soberania e espaço de autonomia.

Portugal tem hoje pluralismo de informação, dado o encerramento de vários jornais?

Não acho que estejamos numa situação em que possamos dizer que não temos pluralismos de informação. Temos hoje um serviço público com maiores garantias de independência e isso é muito importante. Sem dúvida que a crise que os média atravessam hoje apresenta problemas não apenas em Portugal mas na Europa. A crise financeira apresenta um duplo risco para a comunicação social e o pluralismo: a diminuição do número de títulos e o risco de que possa existir algum controlo desses meios de comunicação social por razões que não têm a ver apenas com a sustentabilidade do órgão de comunicação social mas por interesses de outro tipo. É por haver esse risco de outros interesses no controlo económico dos meios de comunicação social que promovemos um novo regime de transparência e conflitos de interesse relativos aos meios de propriedade.

Enquanto Ministro coordenou o processo de acolhimento de refugiados em Portugal. A Europa cometeu aqui muitas falhas?
Cometeram-se e continuam a cometer-se falhas importantes no âmbito da UE. A resposta da UE à crise dos refugiados é insatisfatória. Mas demonstra também a dificuldade de funcionamento das próprias democracias hoje. O discurso populista transformou aquilo que era uma atitude humanitária na Europa, no início, para uma atitude de receio e mesmo rejeição. Isso deve-nos suscitar uma grande preocupação quanto ao funcionamento das nossas democracias hoje em dia. A democracia, para funcionar, precisa de uma dimensão de paixão e de racionalização. E estamos a perder os instrumentos de racionalização. Esse falhanço das democracias nacionais que depois leva ao fracasso da resposta europeia à crise de refugiados. Mas a obrigação de acolher refugiados é a nível internacional, não só na Europa, e a Europa até tem feito mais do que muitos outros países. É importante olhar para os dois lados da resposta europeia: é insatisfatória mas é uma resposta que é mais positiva que outros membros da comunidade internacional.

Está a referir-se aos Estados Unidos…
Sim, aos Estados Unidos e outros membros.

A China, por exemplo, poderia ter sido mais activa neste processo?
A China também poderia ter. Hoje em dia, com a capacidade económica e com a posição política que tem, poderia ter tido um papel relevante.

O terrorismo tem sido outra das grandes questões na Europa. A resposta, no combate ao Estado Islâmico, tem sido eficaz?
Ao contrário do que aquilo que alguns populistas defendem, que é o restabelecimento das fronteiras e colocar em causa o Acordo de Schengen, é o contrário. O terrorismo é, na maior parte dos casos, um terrorismo dos próprios Estados, como se viu em França ou Bélgica. O que a Europa pode é oferecer uma capacidade de resposta mais adequada ao fenómeno do terrorismo e este é um terrorismo diferente do que vimos num passado recente, por exemplo da Al-Qaeda. A Europa pode ter uma capacidade de resposta mais forte e o fundamental é reforçar laços e Schengen é o instrumento mais poderoso para promover a troca de informações. A resposta adequada ao terrorismo deve ser o reforço das políticas de integração europeia, um reforço de Schengen. As fronteiras não são eficazes.

Aqui mantemos o Direito de Macau. Acredita na sua manutenção além de 2049?

A sua identidade fundamental tem que ser mantida porque é esse o factor distintivo de Macau. Assimilar Macau, incluindo a sua cultura jurídica, na China seria errado, porque então que valor diferenciador é que Macau teria para a China? Não creio que isso seja sequer uma vontade das autoridades da China. Mas o facto de manter a entidade do ordenamento jurídico da [RAEM] não significa que ele não possa obter e ser influenciado por outros regimes jurídicos. Com o envolvimento de tantas empresas internacionais aqui, americanas, pouco a pouco alguns elementos da cultura da Common Law possam ter alguma influência, ou até da própria China. Num contexto de globalização todos os sistemas jurídicos são miscigenados.

Portugal poderia fornecer mais instrumentos para a manutenção desse Direito?
Portugal deve fazer o máximo possível e ter a maior disponibilidade para a cooperação. Deve utilizar também a sua presença na UE, porque a sua presença na UE também é um instrumento para manter a identidade do ordenamento jurídico de Macau. É importante que o território tire cada vez mais partido desse posicionamento estratégico que penso que pode ser um pólo de comunicação e encontro de diferentes culturas, sociais, económicas e políticas.

8 Abr 2016

Menores | Christophe Bernasconi, secretário-geral da Conferência de Haia, critica RAEM

Macau precisa de estar mais atento e preparado para resolver questões ligadas à protecção das crianças. Ainda não foi desta que o território ratificou a Convenção de Haia de 1996 que regula assuntos como a responsabilidade parental e medidas de protecção dos menores. Enquanto isso as falhas vão continuar a existir, ainda que possam ser corrigidas

[dropcap type=”2″]”S[/dropcap]im, existe uma falha no sistema de protecção de crianças” em Macau. Assim defende Christophe Bernasconi, secretário-geral da Conferência de Haia do Direito Internacional Privado. Com a não ratificação da Convenção de 1996, que regula a cooperação entre países e regiões sobre a responsabilidade parental e das medidas de protecção das crianças, Macau pode não conseguir resolver vários problemas relativos aos menores, como por exemplo quais as autoridades competentes para tomar decisões, qual a lei a aplicar nos diversos casos que possam surgir ou ainda como reconhecer e impor uma estratégia de protecção – particularmente as mais urgentes.

“Macau não tem este conjunto de regras que são capazes de encontrar e definir soluções”, argumenta Bernasconi, que esteve no território para participar no seminário “Rumo à felicidade infantil através das Convenções de Haia relativas ao Rapto de Crianças e à Protecção das Crianças”, que aconteceu na quinta e sexta-feira na RAEM.

Sublinhando a importância de se ratificar a Convenção de 1996, o secretário-geral explicou ao HM que situações como a possibilidade das crianças passarem as fronteiras sem autorização dos pais podem continuar a acontecer devido a esta falha, tal como o HM já tinha noticiado anteriormente.

“Apesar de Macau ter ferramentas, como a Convenção de 1980, que permitem a protecção de crianças, há de facto uma falha que se pode sentir, por exemplo, na possibilidade de as crianças passaram as fronteiras sem autorização dos pais. Esta falha, pode ser rematada pela ratificação da Convenção de 1996, que disponibiliza uma estrutura sólida de regras que poderiam ser aplicadas em situações transfronteiriças”, disse.

Questionado sobre o facto da fronteira ser com a China, país fora da conferência, Christophe Bernasconi clarificou que a Convenção pode apenas servir de guia. “[As regras] não se aplicariam necessariamente entre a fronteira da China e Macau, mas poderiam ser tomadas como fonte de inspiração para um tipo de acordo entre a China continental e o território. Sabemos que as convenções têm servido como modelo para acordos entre regiões. A possibilidade existe”, rematou.

Pequenos passos

É de lembrar que Macau e Hong Kong assinaram a Convenção de 1980 que regula os aspectos civis de rapto internacional de crianças e apesar de ainda não pertencer ao grupo de países e regiões que ratificaram a Convenção de 1996, foi o território que acolheu o seminário. Num resumo, o secretário-geral afirma que o “que aconteceu foi extremamente significante”, pois “mais de 130 participantes, representando 23 países e regiões partilharam as diferenças e experiências entre si”.

“Este seminário foi muito importante para que os países que assinaram estas convenções possam dar o seu testemunho e exemplo aos países e regiões que ainda não assinaram mas mostram vontade de o fazer”, argumentou, caracterizando o saldo final como “muito positivo”. “Os participantes gostaram e querem mais, Macau foi um óptimo anfitrião”, rematou.

Recorde-se que na cerimónia de inauguração do seminário, a Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, argumentou que o momento representava uma oportunidade “valiosa para que os peritos na área jurídica do Governo da RAEM possam aprender com as boas práticas e experiências de outros países e regiões”.

A China continua a ser uma peça mistério, mantendo-se afastada mas assumindo-se atenta. “O país está atento ao problema das crianças e famílias que cruzam fronteiras”, defendeu Lu Zhenhua, representante do ministério dos Negócios Estrangeiros da China em Macau, citado pelo jornal Ponto Final. “Queremos aprender como proteger melhor os direitos das crianças e esta é uma excelente oportunidade”, rematou.

Para Christophe Bernasconi os pontos são claros: a Ásia deve estar mais atenta e activa. “Os casos das crianças refugiadas, fugitivas, vítimas de exploração económica e sexual e as sequestradas exigem que os países enfrentem as suas responsabilidades e implementem medidas práticas para o seu combate”, defendeu.

A Conferência de Haia de Direito Internacional Privado surgiu em 1893 e dedica-se à protecção internacional das crianças e das famílias, às leis de comércio e finança internacional e à cooperação internacional em litígios. Dela fazem parte 79 membros de 67 países que já assinaram ou ratificaram as suas convenções.

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Direitos Humanos | Macau com capacidade limitada face ao Governo, diz relatório

O Departamento de Estado norte-americano refere a “limitada capacidade” dos cidadãos de Macau para mudarem os respectivos governos como um dos problemas dos direitos humanos nas regiões chinesas, no relatório anual divulgado na quinta-feira.

O Departamento de Estado dos EUA refere que em 2014 “foram reportados limites à capacidade da população de mudar o seu governo”. Chui Sai On, recorde-se, foi eleito a 31 de Agosto para um segundo e último mandato como Chefe do Executivo, por um colégio eleitoral composto pela primeira vez por 400 membros, mais cem do que em 2009.

O relatório norte-americano observa igualmente “constrangimentos à liberdade de imprensa e liberdade académica e falhas na implementação total da legislação no que diz respeito aos direitos dos trabalhadores” em Macau. Em 2014, “o tráfico humano continuou a ser um problema, apesar das autoridades estarem a aumentar a capacidade” para combater estes casos, acrescenta o documento.

Os EUA mantêm ainda preocupações relativamente à Lei de Defesa da Segurança do Estado aprovada em 2009, de acordo com o artigo 23.º da Lei Básica, de que esta possa limitar ou comprometer várias liberdades civis, apesar de ao longo dos anos a mesma legislação nunca ter sido utilizada para acusar ninguém.

Por outro lado, o Departamento de Estado norte-americano destaca que “o Governo de Macau deu passos para processar e punir dirigentes que cometeram abusos”.

O Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau já respondeu ao relatório, dizendo que não lhe compete interferir nos assuntos do território e até que “os EUA distorceram factos”.

29 Jun 2015