João Luz VozesO desuso [dropcap]U[/dropcap]ma das minhas preocupações recorrentes é a morte do significado, a forma como os conceitos são personalizados ao ponto de abarcarem as mais bizarras e subjectivas realidades. Tal como temos órgãos vitais no corpo, também há significados vitais para a civilização. Por exemplo, creio que é transversal à inteira espécie uma noção ética do que deverão ser direitos humanos. Ainda assim, para prevenir desvios, existem as leis para fixar normas e conceitos. Também não gosto de ver o significado de amor deturpado, é um dos mais belos e indefiníveis mistérios do significado, não o usem para politiquices e outras coisas que nada dizem ao espírito. Respeito, direito, dever, crime, família, guerra, lei, paz, todas estas palavras dizem algo imprescindível à saúde de uma sociedade. As metáforas, puzzles de palavras e mascaradas de significado pertencem os domínios líricos, nunca ao exercício do poder. “De acordo com a lei” nunca poderá significar “apesar da lei, mas conforme o interesse”, sob pena de perder razão de ser e se transformar num mero amontoado de vocábulos. Não usarmos bem estes termos pode levar à atrofia de significado, como uma lei que cai em desuso e resvala para o suicídio da auto-revogação. Há conceitos que não se podem tornar fósseis linguísticos, órgãos vestigiais apenas detectados na leitura detalhada do genoma de uma civilização. Estes significados precisam ser exercidos plena e frequentemente, ou morrem. O melhor exemplo que me ocorre é o conceito de Liberdade. Bom fim-de-semana.